Controle e segurança

Para mapear armas liberadas por Bolsonaro, governo Lula obriga atiradores a registro

Proprietários têm até abril para cadastrar seus equipamentos no Sistema Nacional da PF. Objetivo é saber se as armas estão com seus compradores ou se foram desviadas

Tânia Rêgo/ABr
Tânia Rêgo/ABr

São Paulo – Portaria publicada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública na última quarta-feira (1º) determina que proprietários de armas de fogo devem cadastrar os equipamentos no Sistema Nacional de Armas (Sinarm), da Polícia Federal, até 2 de abril. Com a medida, o governo visa entender a atual situação do armamento no país.

O cadastramento é obrigatório para os armamentos de uso permitido ou restrito que tenham sido adquiridos após decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de maio de 2019. Na ocasião, o então mandatário flexibilizou as regras para registro, posse, porte e comercialização de armas e munições para os colecionadores, atiradores esportivos e caçadores, os chamados CACs. 

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No caso de armas de uso permitido, o cadastro poderá ser feito pelo sistema virtual da Polícia Federal. Já as armas de uso restrito deverão ser primeiro cadastradas no mesmo sistema, mas terão também de ser apresentadas à PF – que deverá agendar data e horário para a conferência, também na página da PF. Os armamentos também deverão ser acompanhados de comprovação do registro no sistema de gerenciamento militar de armas.

CACs que forem pegos em situação de irregularidade terão o equipamento apreendido. Infratores também poderão responder pelos crimes de porte e posse ilegal de arma de fogo, previstos no Estatuto do Desarmamento. 

Segundo o conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) Roberto Uchoa, o que o governo deseja a partir da medida é fazer um raio-x do armamento de civis promovido durante o último mandato presidencial, que defendia e estimulava abertamente a aquisição de armas de fogo pela população. “O governo busca saber com quem estão essas armas, onde estão essas armas e se, de alguma forma, elas não foram desviadas ou adquiridas ilegalmente para um posterior repasse. E, principalmente, aquelas armas que são consideradas de calibre restrito. O governo inclusive previu a necessidade da presença física da pessoa com essa arma no posto da Polícia Federal para que fosse feito o recadastramento. Então o que se quer é compreender como está esse mercado”, justifica o especialista, em entrevista na manhã desta segunda-feira (6) à Rádio Brasil Atual

Campanha de desarmamento

A portaria, publicada na semana passada, indica ainda que durante o período de 60 dias, os proprietários que não desejarem manter as armas poderão entregá-las em um dos postos de coleta listados no sistema da PF. O conselheiro do Fórum explica que essa prática já era prevista antes, a partir do Estatuto do Desarmamento. Agora, contudo, ela está sendo reiterada pelo governo Lula que, já durante a campanha eleitoral, deixou claro sua postura contrária ao armamento da população. 

“Essa campanha do desarmamento, da entrega de armas de fogo, ela não é nova. Ela vem desde o Estatuto do Desarmamento e se torna uma política permanente. Então ao longo dos últimos anos, mesmo durante o governo Bolsonaro, qualquer pessoa que tivesse uma arma de fogo poderia devolvê-la nos postos de entrega, batalhão da Polícia Militar, Polícia Civil ou Federal e recebia uma indenização. O que o governo faz nessa portaria é reiterar essa possibilidade. (…) É a continuação de uma política que já vem a longo prazo”, observa Uchoa. 

Corrigir deformações

A portaria também já era prevista desde o primeiro dia do governo Lula, quando o presidente assinou um decreto que revogou uma série de normas de Bolsonaro que facilitavam o acesso às armas e munições. Entre as mudanças, o decreto suspendeu novos registros de armamentos por CACs. Números do Exército obtidos pelo portal g1 via Lei de Acesso à Informação (LAI) revelam que de 2019 a 2022 foram concedidos 904 mil novos registros de armas de fogo para os CACs. Média de 691 registros de novas armas por dia, ou 26 armas por hora. 

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Em entrevista coletiva realizada na quinta (2), dia seguinte à publicação da portaria, o ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou que o decreto permite corrigir o que classificou como “deformações” da Lei do Desarmamento. “Esse decreto abre a estrada de revisões das deformações da Lei 10.826 de 2003. Essa deformação foi empreendida muito vivamente a partir de 2019 com a edição de sucessivos decretos e portarias que acabaram por frustrar as condições de aplicação da lei”, advertiu o ministro. 

O Sistema Nacional de Armas da Polícia Federal é considerado mais rigoroso e com maior controle. No governo Bolsonaro, os CACs não precisavam cadastrar suas armas no Sinarm e podiam ainda ter até 60 revólveres. O arsenal era registrado no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) do Exército, de menor rigidez.

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