Jornada de lutas

Mulheres sem-terra protestam contra o Pacote do Veneno

Em ato diante de fábrica de agrotóxicos no interior de São Paulo, mulheres chamam atenção para os perigos do pacote aprovado na Câmara. Se o Senado aprovar, o uso desses produtos ficará ainda mais descontrolado e o país mais contaminado e doente

MST
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Com faixas, grafites e palavras de ordem, as mulheres lembraram que o lucro de uns custa o envenenamento das águas e a intoxicação de trabalhadores rurais e pessoas expostas

São Paulo – Mulheres integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) protestaram hoje (7) contra o Pacote do Veneno, a liberação recorde de agrotóxicos e o lucro dos fabricantes desses produtos em frente a uma fábrica da Syngenta em Paulínia, na região de Campinas (SP). Adquira pelos chineses, a empresa de origem suíça é uma das líderes de mercado do setor em todo o mundo.

Aprovado na Câmara no início de fevereiro, o chamado Pacote do Veneno tem origem em um projeto do então senador Blairo Maggi, o PL 6.299/2002, que aglutinou outros projetos no sentido de afrouxar as regras para o registro, liberação, fabricação, comercialização e uso. Ou seja, a ideia do pacote é aumentar as vendas desses produtos e o lucro dos fabricantes.

O PL estava pronto para votação desde 2018, após aprovação em comissão especial presidida pela ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina. Na ocasião, ela ganhou o apelido de “Musa do Veneno” pelos esforços empreendidos. Mas não havia clima favorável à aprovação no plenário devido à grande pressão nacional e internacional contra o pacote. Até a ONU se manifestou contrária. Mas a possibilidade da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva mobilizou a bancada ruralista a apertar o cerco pela aprovação.

Pacote do veneno e seus males

Com faixas, grafites e palavras de ordem, as mulheres lembraram que o lucro de uns custa o envenenamento das águas e a intoxicação de trabalhadores rurais e pessoas expostas, que muitas vezes evoluem silenciosamente para doenças incapacitantes e mortais. E também para o papel dos agrotóxicos no surgimento de diversos tipos de câncer, ou malformações congênitas e outras anomalias graves devido à exposição aos produtos. Mesmo que seja pela ingestão de alimentos que os receberam durante o cultivo.

A Syngenta é uma das fabricantes do paraquat, um dos agrotóxicos mais perigosos do mundo. Proibido em mais de 50 países desde 1989, está entre os agrotóxicos liberados pelo governo de Jair Bolsonaro com as bênçãos da bancada ruralista.

Segundo denunciaram as mulheres sem-terra, a pesquisa internacional Paraquat Papers, feita pela organização suíça Public Eye, desde 1990 a Syngenta tem conhecimento do efeito letal do paraquat, mas ainda assim continua a produzi-lo.

Os efeitos nocivos do glifosato, agrotóxico mais vendido no mundo, inclusive no Brasil, também foram destacados. Com larga aplicação na produção de soja transgênica, está associado ao aumento da mortalidade infantil em municípios das regiões Centro-Oeste e Sul, da ordem de 5%, o que corresponde a 503 crianças no período analisado. O dado é de uma recente pesquisa, feita em parceria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Insper e Universidade de Princeton, dos Estados Unidos, que fizeram o estudo nessas regiões de grande produção da soja geneticamente modificada.

Agrotóxicos até no leite materno

Outras pesquisas feitas no país denunciam a presença de glifosato no leite materno de regiões de monocultura de soja transgênica. Em 2018, em pesquisa da Universidade Federal do Piauí (UFPI), foi constatada a contaminação por glifosato ou ácido aminometilfosfônico (Ampa) – ou ambas as substâncias – em 83,4% das amostras obtidas na maternidade do Hospital Regional Dirceu Arcoverde (HRDA), em Uruçuí, próximo da maior região sojicultora do estado.

As mulheres sem-terra também denunciam a compra de parlamentares por parte da empresa para que mais agrotóxico fosse liberado legalmente. Lembraram que o relator da Pacote do veneno, o deputado Luiz Nishimori (PL-PR), dono da empresa Mariagro Agrícola Ltda., fez um acordo para quitar dívida de R$ 1,5 milhão com a Syngenta. A negociação da dívida foi feita no final de 2020, quando já tramitava na Câmara o PL do Veneno.

A ação de hoje dá largada às mobilizações da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra 2022 em São Paulo, entre outras ações de denúncia e protesto que ocuparão todas as grandes regiões urbanas e rurais do país. O lema é “Terra, Trabalho, Direito de Existir. Mulheres em luta não vão sucumbir!”.

“Neste momento as mulheres sem terra estão se mobilizando contra o agronegócio, nós estamos com ações em todos os estados, em especial contra o PL do Pacote de Veneno que foi aprovado na Câmara dos Deputados, e que vai colocar muito mais veneno no prato da classe trabalhadora”, alertou Cássia Bechara, dirigente do Coletivo de Relações Internacionais do MST.

Redação: Cida de Oliveira – Edição: Helder Lima