Material interno do Banco do Brasil vê risco em ‘orientação esquerdista’ contra ditadura

Banco informa que documento que reproduz cartilha de oficial de Artilharia do Exército foi colocado por funcionário em plataforma colaborativa

São Paulo – Um material publicado em um sistema interno do Banco do Brasil recomenda cuidados especiais com “terroristas de orientação esquerdista” por causa do aumento do assalto a instituições financeiras a partir da década de 1960. O manual, atualizado em fevereiro deste ano, é baseado em cartilha de um oficial de Artilharia do Exército formado pela Academia Militar das Agulhas Negras.

Logo na abertura, o documento, que provocou protesto do Sindicato dos Bancários de São Paulo, cita “a multiplicação de ações terroristas” e o “financiamento do terrorismo” como questões que provocaram “grandes alterações” na maneira como governo e empresas privadas atuam sobre o tema da segurança. 

No capítulo seguinte, “Fundamentos teóricos da segurança”, o texto vai adiante: “No Brasil, em razão do aumento de assaltos a instituições financeiras, a partir de meados da década de 1960, realizados por terroristas de orientação esquerdista, opositores do regime militar, entre eles o desertor do Exército ex-capitão Carlos Lamarca, e o ex-deputado, com formação em guerrilha e terrorismo na China e em Cuba, Carlos Marighella, autor do tristemente famoso manual do guerrilheiro urbano, tem início a formalização institucional da segurança privada. Várias organizações terroristas assaltavam instituições bancárias e de crédito, agindo de forma violenta, muitas vezes matando guardas, policiais e pessoas inocentes, requerendo medidas especiais de repressão ao delito”.

Segundo o documento, a fonte é a cartilha chamada “Fundamentos teóricos da segurança”, escrita por Marco Antonio dos Santos. De acordo com o currículo apresentado em um curso ministrado ao Sindicato dos Servidores do Sistema Penitenciário do Maranhão, Santos é especialista em Construção de Cenários formado pela Escola Superior de Guerra e em contra-espionagem empresarial. Além disso, foi chefe da Seção de Análise da Conjuntura Nacional do Centro de Inteligência do Exército.

Em nota enviada à Rede Brasil Atual, o BB informou que o texto foi publicado por um funcionário em um ambiente de rede interna colaborativo, e “contraria acintosamente os valores defendidos pela Empresa e foi imediatamente excluído, após sua identificação. O Banco lamenta o ocorrido e informa que irá rever as alçadas para publicação de conteúdos nesse ambiente”.

O documento levou o Sindicato dos Bancários de São Paulo a organizar uma manifestação programada para o meio-dia de amanhã (6) na rua São Bento, no centro da cidade. Em carta enviada à presidenta Dilma Rousseff e ao ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), a presidenta do sindicato, Juvandia Moreira, lamenta o episódio e pede que o trecho em questão seja eliminado do material entregue aos funcionários. “É inadmissível que uma apostila de um banco público, distribuída em todo o país, utilize tais termos para ilustrar um período tão obscuro como o da ditadura”, afirma. “O Brasil não pode mais reproduzir depoimentos equivocados da história do país. E o Banco do Brasil, subordinado a um governo democrático, não pode cometer erros como esse.”