Especial: 30 anos da Lei de Anistia
Ao completar três décadas a Rede Brasil Atual perguntou a personalidades que viveram o período como explicar ou traduzir para a juventude a importância desses 30 anos
Publicado 31/08/2009 - 15h12
Em agosto de 2008, familiares pediam declaração por parte do Estado brasileiro da responsabilidade do coronel Brilhante Ustra pela tortura e morte de Luiz Eduardo Merlino (Foto: Direitos Humanos/Centro de Mídia Independente)
Após 30 anos da promulgação da Lei da Anistia, o debate permanece na agenda política brasileira como um processo aberto. Em 28 de agosto de 1979, o Congresso Nacional rejeitou as emendas da oposição e aprovou o projeto enviado pelo Executivo para a legislação que anistiaria cidadãos acusados de cometer crimes políticos durante o regime militar.
A lei 6.683 de 1979 foi sancionada por João Batista Figueiredo, o último dos presidentes do período da ditadura militar (1964-1985).
Foram enquadrados na lei 4.650 pessoas e lideranças políticas exiladas puderam retornar ao país. Não foram anistiados participantes da resistência armada -“condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal” – nem contemplou dispositivo que permitisse o conhecimento dos casos de oposicionistas mortos ou desaparecidos.
>> De personalidades que viveram o período a Rede Brasil Atual trouxe a questão: como explicar ou traduzir para a juventude a importância desses 30 anos? Carlos Eugênio Paz, Cecília Coimbra, Juca Kfouri, Renato Pompeu, Mouzar Benedito, Glenda Mezarobba, Cláudio Lembo, Lucas Figueiredo, Duarte Pacheco Pereira, Paulo Abrão, Fábio Konder Comparato, Ferreira Gullar, Frei Betto e Plínio de Arruda Sampaio contribuíram com seus depoimentos, leia aqui.
O saldo do período aponta que 50 mil pessoas teriam sido detidas nos primeiros meses da ditadura e cerca de 10 mil teriam vivido no exílio em algum momento.
Entre 1964 e 1979, foram 7.367 acusados judicialmente e 10.034 sofreram inquérito. Houve quatro condenações formais à pena de morte, que não foram executadas, e 130 pessoas foram banidas do país; 4.862 tiveram cassados os seus mandatos e direitos políticos; 6.592 militares foram punidos e pelo menos 245 estudantes foram expulsos da universidade. Ao mesmo tempo em que permitiu a volta dos exilados, a lei garantiu a impunidade a torturadores.
Uma sequência de eventos tem contribuído para manter aceso o debate, como o fato de o país ser réu na Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), no caso da Guerrilha do Araguaia, acusado de não investigar os desaparecimentos e de não fornecer informações sobre o episódio a familiares das vítimas.
Em 1995, foi promulgada a Lei 9.140, conhecida como “Lei dos Desaparecidos”, que reconheceu como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação política e criou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Pela primeira vez, o Estado brasileiro assumia que havia cidadãos mortos pelo aparato de repressão e que tais mortes não haviam sido comunicadas à sociedade. Reconhecia, portanto, responsabilidade pelas graves violações dos direitos humanos ocorridas durante o regime militar.
Além disso, países vizinhos adotaram medidas mais duras. A Argentina, por exemplo, derrubou as leis Obediência Devida e Ponto Final – de teor semelhante à lei de anistia brasileira. Ainda barrou indultos concedidos aos militares pelo ex-presidente argentino Carlos Menem, o que permitiu reabrir processos contra ex-militares e ex-policiais.
Outro caso conhecido é de 1998, quando o juiz espanhol Baltazar Garzón ordenou a prisão do ditador chileno Augusto Pinochet, em Londres, por crimes contra a humanidade. Em linhas gerais baseou-se na prerrogativa de que a lei de anistia de qualquer país não pode impedir a investigação de crimes de lesa-humanidade.