punitivismo acelerado

Projeto quer que presos paguem ao Estado por gastos com prisão

Para especialistas, PLS 580/2015 cria um Estado mais autoritário e fortalece ainda mais as facções criminosas

Wilson Dias/EBC
Wilson Dias/EBC
Advogado criminalista e conselheiro do Humans Rights Watch, afirmou, nas redes sociais, que as facções criminosas vão ter uma forma 'legal' de coagir novos membros

São Paulo – O projeto de lei que prevê a obrigação de o preso ressarcir o Estado pelos gastos com sua manutenção foi aprovado, no último dia 12, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), do Senado. Para especialistas, a medida é problemática, cria um Estado mais autoritário e fortalece ainda mais as facções criminosas.

O PLS 580/2015, do ex-senador Waldemir Moka (MDB), retorna agora para análise em Plenário. Enquanto isso, a grande dúvida é sobre como o detento vai pagar pela sua estadia na cadeia.

“Como você vai tirar dinheiro de uma pessoa que não trabalha? Se não tem no trabalho, como você tem dinheiro?  Segundo, a pessoa presa trabalha para mandar seu dinheiro aos familiares fora da prisão”, questiona uma egressa do sistema prisional, que não quis se identificar, ao repórter André Gianocari, da TVT.

Augusto de Barros Botelho, advogado criminalista e conselheiro do Human Rights Watch, afirmou, nas redes sociais, que as facções criminosas vão ter uma forma “legal” de coagir e arregimentar novos membros. “É impressionante como grande parte das pessoas que lidam com leis para o sistema penitenciário não têm a menor noção do que estão fazendo”, publicou.

A lei atual permite que o preso trabalhe enquanto cumpre pena, desde que o pagamento seja de pelo menos três quartos do salário mínimo, o que daria pouco mais de R$ 770. Além disso, outros preceitos devem ser cumpridos.

A remuneração deve servir para indenizações, a assistência à família, pequenas despesas pessoais e pela estadia na prisão. No entanto, a população prisional que consegue trabalhar é de apenas 15%.

Atualmente, o Brasil tem cerca de 800 mil cidadãos vivendo em cárcere e 45% estão lá sem condenação. A maioria é composta de jovens, negros e sem escolaridade. Os presos provisórios também deverão arcar com os custos do sistema prisional. Os valores serão depositados em conta judicial e serão devolvidos em caso de absolvição.

Para a Rede Justiça Criminal, a iniciativa é contraditória. “O sistema carcerário brasileiro tem um déficit de vagas crônico, em mais de 200%, que faz o Estado tratar muito mal o preso. Enquanto o Estado deveria indenizar o preso por viver em condições precárias, quer cobrar a manutenção da prisão”, disse Clarissa Borges, representante da entidade.

Forçar essas pessoas ao trabalho praticamente escravo aproxima o país de regimes ditatoriais, afirma ela. “Existem relatos de que ditaduras, que aplicam a pena de morte, cobram dos familiares da pessoa executada às despesas com a munição que foi empregada na execução. Isso aproximaria o Brasil evidentemente de regimes bastante totalitários”, conclui.

Assista à reportagem: