Mães de Maio comemoram vitória contra ‘crimes que lesaram a humanidade’

Líder do grupo de parentes de vítimas de violência policial em São Paulo acredita que exumação do filho pode reabrir investigações sobre crimes ocorridos em 2006

Débora protesta com a foto do filho (Foto:CC/Caio Castor/Facebook)

São Paulo – A exumação hoje, a partir das 14h, em Santos (SP), do corpo de Edson  Rogério Silva dos Santos, morto aos 29 anos, é considerada mais uma vitória da luta das Mães de Maio, grupo de mães, pais e parentes de vítimas dos crimes articulados para exigir justiça. Edson era gari e foi assassinado em 2006, numa onda de violência (que resultou em 493 vítimas), ao que tudo indica deflagrada por policiais, em revide às mortes de agentes de segurança pública durante os ataques da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) naquele ano.

Edson estava com um amigo em um posto de gasolina tentando abastecer sua moto quando policiais o abordaram. Eles discutiram e o policial o agrediu. Segundo relatos do amigo que o acompanhava, Edson disse aos policiais que era um trabalhador e um deles respondeu: “Morreu, você é ladrão”. Minutos depois, Edson foi assassinado com três tiros. Um em cada um dos pulmões e outro no coração. Imediatamente, policiais apareceram na cena do crime e, supostamente, o levaram para o hospital ainda com vida. 

Débora Silva Maria, mãe do rapaz e fundadora das Mães de Maio, conseguiu provar que os policiais que “prestaram socorro” ao gari mentiram em relação ao motivo de terem ido até o local do crime. O que garantiu a ela o reconhecimento de que o estado de São Paulo é culpado pela morte do rapaz, além de uma indenização.

Mas a superficialidade da investigação feita pela Polícia Civil não conseguiu responder se os policiais que discutiram com ele, o “resgataram” e se as pessoas que o mataram são as mesmas. Até hoje ninguém foi sequer indiciado pelo crime. O inquérito dela, assim como dos outros crimes ocorridos no período, foram arquivados.

O objetivo da exumação desta tarde é averiguar se o projétil que permanece cravado em sua coluna cervical é compatível com a de uma arma achada recentemente em Cubatão (SP).

Leia entrevista com Débora.

Como você encara o dia de hoje?

É uma vitória. Eu espero que essa dor que eu vou passar, e que venho passando ao longo de seis anos, seja um caminho para a  justiça. A gente luta pela verdade. A gente espera que isso seja a ponta do iceberg, para que seja provado que policiais mataram nossos filhos.

Você irá acompanhar a exumação?  

Não quero perder nenhum segundo, apesar de ser uma coisa muito doída pra mim. Até hoje eu não acredito que meu filho morreu. Eu ainda tenho a lembrança dele chegando em casa e agora eu vou  vê-lo, mas ele não está mais lá. São só os restos mortais dele. Mas, depois de seis anos lutando, sem ninguém dar ouvido para o nosso grito, eles vão ver a o que aconteceu com ele e tentar concluir o que a gente vem lutando para provar há muito tempo. A polícia não investiga a própria polícia. Isso deveria ter tido  um olhar diferente desde o começo. Agora o próprio MP pediu a exumação do corpo. Eles acham que essa arma achada em Cubatão tem a ver com essa história. Esses crimes lesaram a humanidade.

A exumação pode levar a reabertura dos inquéritos? 

É o que a gente espera. A gente viu que tudo isso, tudo que aconteceu no inquérito, as fragilidades, os arquivamentos, seja desmascarado. Meu filho foi enterrado com um projetil na espinho. Ou seja, a investigação paliativa começou desde o IML, que alegou que a bala não foi retirada porque os instrumentos estavam quebrados. Ele ser enterrado com a bala é gravíssimo. Foi por isso que pedimos a federalização da investigação. No começo, olhamos com desconfiança a iniciativa do MP. Achamos que poderia ser uma manobra para impedir a federalização, que eles não querem que aconteça. Mas não houve investigação por parte da justiça de São Paulo. Mas estamos otimistas agora. Nossa esperança é que o que vai acontecer hoje abra um proceder para uma verdadeira investigação.