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Conversas sobre a África: migração e refúgio no Brasil em debate

Seminário no Sindicato dos Bancários discutiu os novos fluxos migratórios e os desafios do Brasil para acolher imigrantes e refugiados

Mauro Calove/Instituto Lula

86% dos refugiados do mundo foram acolhidos por países em desenvolvimento; 25% estão nos países mais pobres

São Paulo – Um encontro entre o Brasil e seus imigrantes e refugiados. Foi o que ocorreu na quarta-feira (26), na sede do Sindicato dos Bancários de São Paulo, durante o seminário “O Brasil diante dos desafios de um novo ciclo de imigração”, parte da série de debates “Conversas Sobre África”, promovida pelo Instituto Lula com a mediação do seu diretor Celso Marcondes. A plateia lotada acomodava pessoas de várias nacionalidades: síria, haitiana, angolana, congolesa, peruana, burquinabês, nigeriana, cabo-verdenses, argentina, entre outras.

Também estavam presentes brasileiros interessados na questão da imigração e refúgio com olhar voltado aos direitos humanos, como representantes de entidades civis e uma turma de alunos de uma escola estadual de Taboão da Serra, que compareceu por iniciativa pessoal de sua professora.

Representante da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) no Brasil, Andrés Ramirez traçou um panorama da situação no mundo, enfatizando que dos dez países de onde mais saíram refugiados, seis estão na África. Destacou ainda que nos últimos anos aconteceram duas novidades que afetaram o fluxo migratório mundial: a tragédia humanitária na Síria e a primeira guerra na Europa desde os anos 1990, no leste da Ucrânia, que fez com que a Rússia se tornasse o país que mais recebeu solicitações de refúgio em 2014.

Além disso, ele desfez alguns mitos, entre os quais a percepção de que refugiados buscam nações mais desenvolvidas para se fixar. “No caso da África, a imensa maioria dos refugiados fica no continente. No geral, em 2014, 86% dos refugiados do mundo foram acolhidos por países em desenvolvimento e, dentro disso, 25% estão nos países mais pobres”, afirmou o representante da Acnur.

O secretário nacional de Justiça e presidente do Conselho Nacional para Refugiados (Conare), Beto Vasconcelos, abordou a questão da legislação brasileira para imigração e refúgio, ainda uma herança da ditadura, que está defasada, e encara a questão pela perspectiva da ameaça à segurança nacional.

“Nosso desafio é criar uma legislação que preveja direitos e garantias aos imigrantes. Uma lei aberta e transparente que permita mecanismos de regularização e documentação, e aborde princípios de políticas públicas para acolhimento, assistência e inserção social e econômica. Flexível ao ponto de que a migração de estudantes e pesquisadores seja feita de forma mais fácil. Que estabeleça uma política de vistos e residências mais ampla e, principalmente, que determine mecanismos de acolhimento humanitário”, enfatizou.

Porta fechada

Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas (organização não governamental internacional de direitos humanos), narrou sua experiência pessoal como imigrante e a demora de 11 anos para regularizar sua residência permanente. “O Brasil é um país de coração aberto e uma portaria muito fechada”, resumiu a argentina. E surpreendeu ao comentar que o Brasil possui um número relativamente pequeno de imigrantes. “Existem muito descendentes. Porém, os imigrantes de fato correspondem a apenas 1% da população. Na Argentina, o percentual é de 5%.” Atualmente, a diretora da Conectas trabalha na defesa de um projeto de lei que descriminaliza a imigração e no combate à xenofobia. “Não quero ter de discutir estes assuntos após acontecer uma morte.”

O coordenador de Políticas para Migrantes da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania da prefeitura de São Paulo, Paulo Illes, falou das políticas públicas que a capital paulista mantém para os imigrantes e cobrou que outras cidades façam o mesmo. “São Paulo, pela sensibilidade do prefeito (Fernando) Haddad, foi o primeiro município a criar uma política de imigração, isso no âmbito da Secretaria de Direitos Humanos, o que rompe com a lógica de ver o imigrante como ameaça, uma questão de segurança.”

Com reportagem de Felipe Roussele, do Sindicato dos Bancários de São Paulo