Itamaraty: pessoas traficadas podem ser ajudadas, onde quer que estejam

Ministra Luiza Lopes da Silva garante que se uma vítima chega ou telefona para o consulado, ela recebe toda a orientação que precisa, como onde ir e a quem procurar

Questões financeiras e ameaças dos traficantes prendem as vítimas à sua condição (Foto: Kay Chernush/Departamento de Estado EUA)

São Paulo – O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, comprometeu-se perante a CPI do Tráfico de Pessoas na Câmara dos Deputados no início de junho a pedir o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU) para o combate a esse crime no Brasil. Patriota também é defensor da mudança da legislação brasileira no tocante aos estrangeiros e à imigração, assim como no Código Penal. O Itamaraty acompanha o tema desde 2006, mas, atua efetivamente há dois anos, com a diretriz de que as vítimas podem ser ajudadas onde quer que estejam. A média de tempo dos brasileiros em situação de tráfico é de dois a três anos. Um exemplo são as mulheres aliciadas por redes de prostituição. A atividade não é considerada crime no Brasil, mas a exploração dela, sim.

Depois de mapear o problema numa ação coordenada com o Ministério da Justiça (MJ), a Secretaria de Proteção às Mulheres (SPM) e a Polícia Federal (PF), o Itamaraty participou da implementação de vários projetos, entre eles a instalação de uma rede de apoio em cada consulado. Qualquer pessoa que entre em contato com a vítima tem as mesmas informações constantes do banco de dados, quais sejam a indicação de casas-abrigo, onde encontrar assistência jurídica, médica e psicológica, como conseguir a repatriação, como denunciar o traficante ou com quem discutir a possibilidade de tomar essa decisão.

“O resultado é que, hoje em dia, se uma moça chega ou telefona para o consulado, ela recebe toda a orientação que precisa, como onde ir e a quem procurar”, diz a ministra Luiza Lopes da Silva, do Departamento Consular e de Brasileiros no Exterior do Itamaraty.

Luiza relata que o mapeamento revelou a hesitação das vítimas em voltarem ao Brasil. “Mesmo em situação difícil elas demoram muito para pedir ajuda para serem repatriadas. Muitos preferem esperar mais um, dois ou três anos naquela situação de exploração, de indignidade, porque saíram do país para juntar dinheiro, ajudar a família, e não querem voltar antes de atingir o objetivo.”

O Itamaraty garante: qualquer pessoa pode largar tudo e voltar para o Brasil. Porém, dois motivos os prendem à situação: primeiro, o financeiro, e depois, a ameaça dos traficantes. “A combinação desses fatores dificulta o retorno. Com o passar do tempo, elas acabam voltando, mas isso pode demorar”, relata Luiza.

A ministra afirma que o mercado do tráfico exige novidades, daí a durar no máximo três anos a permanência da vítima. “Os traficantes querem ficar o tempo de a menina pagar as dívidas, pagar as novas dívidas, aí eles a soltam. Só que aí, ela não tem pra onde ir.”

Muitas pessoas ficam nos locais onde estão sendo exploradas por falta de perspectivas no retorno. “Apesar de explorada, apesar de pagar dívida, a vítima pensa: ‘no final do mês ainda consigo alguma coisa, vou ficar mais um tempo’. Aquilo é tráfico, mas a pessoa vai aguentando”, conta a ministra.
E por que a vítima do tráfico não volta para sua casa? Segundo Luiza, é pela desesperança, por achar que não vai conseguir um emprego, não vai poder comprar uma casa. A verdade é que não é fácil mesmo. “Vimos que apesar de o Brasil estar numa situação econômica boa, poucas pessoas conseguem chegar aqui e encontrar um nicho no mercado para se recolocar.”

Retorno

Para tentar amenizar essa dificuldade, o Itamaraty recomendou a colocação de anúncios classificados nos aeroportos. Além disso, em parceria com a SPM, o MJ e a PF, foi feito o “Guia de Retorno ao Brasil”, que busca fazer com que a volta seja o recomeço da vida das pessoas. “É duro aceitar e carregar a sensação do fracasso”, destaca Luiza.  

Mas o trabalho do governo é fazer chegar às vítimas do tráfico a informação de que elas podem voltar ao Brasil, que terão acesso a assistência, a programas sociais, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, e sobre a oferta de emprego nas suas regiões. “É difícil a pessoa se abalar do exterior e voltar para o Brasil por uma simples possibilidade de vaga. É importante ter segurança. Aí elas voltam porque não podem representar um peso para a família”, diz Luiza.

O Itamaraty também lançou uma cartilha com orientações para modelos, churrasqueiros, jogadores de futebol, dançarinos, entre outos, sobre as armadilhas existentes por trás de uma “grande proposta” de emprego fora do país.