No Xingu e na Cúpula dos Povos, cresce a resistência a Belo Monte

Construção da hidrelétrica no Rio Xingu é o principal embate socioambiental em curso no Brasil (Foto: Lucas Duarte/RBA) Rio de Janeiro – A agenda internacional de mobilizações que será aprovada […]

Construção da hidrelétrica no Rio Xingu é o principal embate socioambiental em curso no Brasil (Foto: Lucas Duarte/RBA)

Rio de Janeiro – A agenda internacional de mobilizações que será aprovada hoje (22), último dia de discussões da Cúpula dos Povos, terá a luta contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte como um de seus maiores símbolos. Diversas atividades promovidas pelo Movimento Xingu Vivo Para Sempre durante a Cúpula estreitaram os contatos dos ativistas brasileiros com organizações de outros países e levaram ao conhecimento da mídia internacional novas informações sobre o maior conflito socioambiental em curso no Brasil.

Paralelamente ao esforço de conscientização sobre Belo Monte realizado na Cúpula dos Povos, a luta no terreno da usina continua. No mesmo momento em que, na tarde de ontem, jornalistas conversavam com ativistas do Xingu no Aterro do Flamengo, dezenas de índios da etnia Xicrin ocupavam no Pará o canteiro de obras de Belo Monte: “Os Xicrins vão permanecer acampados na região da Volta Grande, parte do Xingu que será alagada, e convidamos a todos a se juntarem a eles lá, contra Belo Monte e em defesa do que é nosso”, disse Antônia Melo, coordenadora do Movimento Xingu Vivo Para Sempre.

A ativista Mayumi Rodolfo, recém-chegada do Xingu, afirmou que o movimento de ocupação da Volta Grande deve se acentuar nos próximos dias: “Os índios Xicrins estão agora no movimento de conversar com outros parentes do Médio Xingu e outros povos indígenas de Altamira, Paracanã, Juruna, Arara, que estão se organizando para fazer uma grande ocupação do canteiro de obras de Belo Monte por conta de todas as leis e condicionantes que não estão sendo cumpridas nesse processo. O descompasso entre o que estava combinado e o que está acontecendo de fato nas obras é muito grande”, disse.

Realizado entre 13 e 17 de junho no Pará, o encontro Xingu+23 fez recrudescer a mobilização contra Belo Monte, com uma importância política que se refletiu na Cúpula dos Povos. O evento reuniu cerca de 700 militantes na localidade de Santo Antônio, uma das mais impactadas pela obras da barragem, e contou com a presença de indígenas, ribeirinhos, pescadores e pequenos agricultores de todo o Xingu. No sábado (16), um grupo de indígenas invadiu um dos escritórios da empresa Norte Energia (Nesa), consórcio que constrói Belo Monte, e quebrou mesas e computadores.

O ato acirrou ainda mais a tensão entre a empresa e os setores sociais contrários à Belo Monte e, segundo Sérgio Martins, advogado da Sociedade Paraense de Defesa dos Diretos Humanos, deu nova força a um processo de criminalização dos ativistas: “O movimento sofre agora a continuidade da política que o Estado brasileiro impõe naquela região, que é uma política de terror jurídico e de calar a boca dos movimentos sociais e imobilizá-los para a luta. Todas as medidas judiciais têm buscado sistematicamente retirar ativistas do front de luta contra Belo Monte. O Judiciário é extremamente conivente com os anseios do consórcio construtor de Belo Monte”.

Junto ao Movimento Xingu Vivo Para Sempre, a Sociedade Paraense de Defesa dos Diretos Humanos é responsável por uma ação judicial apresentada na Comissão Interamericana de Direitos Humanos para interromper a construção da usina hidrelétrica: “Trata-se de uma medida cautelar que visou o não início das obras de Belo Monte por conta das mais diversas violações aos direitos humanos e aos procedimentos de licenciamento ambiental e, sobretudo, devido à falta de oitiva dos povos indígenas sobre o projeto”, disse o advogado.

‘Caos socioambiental’

A “propaganda enganosa” que a Nesa faz sobre Belo Monte nos principais veículos de comunicação do país também foi denunciada pelos ativistas. Segundo Antônia Melo, a realidade in loco é bem diferente das peças publicitárias que falam em apoio da população local ao projeto: “A obra já está causando um caos socioambiental na região de Altamira, do Xingu e da Transamazônica. A cidade já está superlotada por pessoas que chegam em busca de emprego na obra. Tem gente dormindo na rodoviária e muitas pessoas passando fome. Hoje em Altamira há muita insegurança, criminalidade e violência”, disse.

No local das obras, a situação piora a cada dia: “A construção de Belo Monte avança dia e noite. Centenas de famílias que moram na Volta Grande do Xingu já não conseguem mais dormir devido ao barulho das explosões por dinamites. Eles não respeitam ninguém. Pessoas estão sofrendo depressão e outros problemas psicológicos e alguns já estão deixando suas terras mesmo sem receber qualquer tipo de indenização”, relata Antônia, lembrando que “muitas terras já foram tomadas à força e a Justiça não faz nada”.

Militante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e uma das principais ativistas contra Belo Monte, Ana Alaíde Barbosa resumiu a posição do movimento: “Barrar o rio significa matar a flora e a fauna, matar todas as espécies que existem lá. Significa matar a nossa própria vida. Dinheiro nenhum paga o que o rio vale para a gente. Na Amazônia, o desenvolvimento sempre acontece em benefício das grandes corporações e do grande capital financeiro, um modelo de desenvolvimento que acaba deixando o povo sempre na miséria e sem sua riqueza maior, que é a natureza. Lutar contra Belo Monte é lutar pela nossa vida que está sendo roubada e privatizada”.