Desenvolvimento em foco

A rotulagem nutricional, o consumidor e a indústria alimentícia

O que se espera é a adequação dos rótulos à legislação e que o fabricante vença o desafio de restringir os elementos nocivos na composição dos alimentos

Tania Rêgo/ABR
Tania Rêgo/ABR

A questão da regulamentação da rotulagem nutricional dos alimentos e a transparência da informação para o consumidor ainda são desafios para a indústria de alimentos. Uma Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa RDC 429/2020 regulamenta a Rotulagem Nutricional dos Alimentos Embalados. Além dela, Instrução Normativa nº 75/2020, da mesma Agência Nacional de Vigilância Sanitária, estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados. Ambas deverão ser atendidas a partir de outubro. Este artigo traz uma síntese de nota técnica publicada na 21ª Carta do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (Conjuscs) sobre esse tema.

A taxa de obesidade no país passou de 11,8% para 19,8%, entre 2006 e 2018, é o que revelam os resultados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) do ano de 2019.

O ambiente exerce influência sobre as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). Tais doenças são passíveis de prevenção, a partir de um estilo de vida que leve em consideração a atividade física e uma alimentação saudável. A rotulagem nutricional dos alimentos faz parte das ações voltadas para prevenção e controle dessas doenças.

A Portaria 41, de 13/01/1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, traz pela primeira vez o conceito de Rotulagem Nutricional: “Rotulagem nutricional é toda descrição destinada a informar ao consumidor sobre as propriedades nutricionais de um alimento”. Naquele momento a declaração de nutrientes somente seria obrigatória para alimentos que fizessem declarações de propriedades nutricionais.

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Constando propriedades nutricionais no rótulo era obrigatório o fabricante indicar: valor energético (quilocaloria), quantidade de proteínas, glicídios, lipídios e fibra alimentar, proporcionalmente à quantidade de cem (100) gramas ou mililitros, podendo também se optar pela porção do alimento. Optando pela porção deveria indicar o número de porções contidas na embalagem. Para os demais alimentos, a rotulagem nutricional seria opcional.

A Anvisa foi criada por meio da Lei 9.782, de 26/1/ 1999, e tem por finalidade institucional a promoção da proteção da saúde da população pelo controle sanitário da produção e comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, incluindo ambientes, processos, insumos e tecnologias a ele relacionados, além da missão de promover a saúde da população, fundamentada nos valores do conhecimento como fonte de ação, transparência, cooperação e responsabilização.

Em 01/11/2000 foi publicada a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC 94, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa/MS), que manteve da Portaria 41 o rol de itens que deviam constar da declaração de nutrientes (valor calórico, proteínas, gorduras, carboidratos e fibra alimentar) e acrescentou gorduras saturadas, colesterol, cálcio, ferro e sódio.

A Portaria SVS/MS 41/98 e a RDC 94/00, daAnvisa/MS, foram revogadas pela RDC 40, de 21/03/2001, daAnvisa/MS, que tornou obrigatória a declaração de nutrientes por porção e a inclusão da porcentagem do valor diário, tomando como base uma dieta de 2.500 Kcal.

Visando estabelecer as porções dos alimentos e bebidas embalados para fins de rotulagem nutricional, na mesma data, foi publicada a RDC 39. As porções foram baseadas na pirâmide alimentar adaptada para a população brasileira.

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Todavia, em dezembro de 2003, aAnvisa surpreendeu as empresas ao publicar as Resoluções da Diretoria Colegiada 359 e 360 (Regulamento Técnico de Porções de Alimentos Embalados para Fins de Rotulagem Nutricional e Regulamento Técnico sobre Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados, respectivamente), visando equiparar a legislação brasileira quanto à rotulagem nutricional com a dos países que compõem o Mercosul, revogando as RDCs nº 39 e 40/2001.

Com a RDC 360, a informação nutricional sobre os nutrientes, ferro, cálcio e colesterol deixou de ser obrigatória, ao mesmo tempo, que a informação quanto à quantidade de gordura trans presente no alimento passou a ser exigida.

Com a RDC 359, a base da alimentação diária passa de 2.500 Kcal para 2000 Kcal ou 8400 kJ (quilojoules) e a declaração da porção em medida caseira passa a ser obrigatória.

Em se tratando de rotulagem nutricional, grande importância se dá à Informação Nutricional Complementar, que é definida pela Portaria 27, de 13/1/1998 da Secretaria de Vigilância Sanitária, do Ministério da Saúde como: “Qualquer representação que afirme, sugira ou implique que um alimento possui uma ou mais propriedades nutricionais particulares, relativas ao seu valor energético e o seu conteúdo de proteínas, gorduras, carboidratos, fibras alimentares, vitaminas e ou minerais”.

A Informação Nutricional Complementar quando for utilizada de forma comparativa deverá avaliar diferentes versões do mesmo alimento ou alimento similar. A comparação deve atender: uma diferença relativa mínima de 25%, para mais ou para menos, no valor energético ou conteúdo de nutrientes dos alimentos comparados, e uma diferença absoluta mínima no valor energético, ou no conteúdo de nutrientes, igual aos valores constantes nas tabelas anexas, da referida portaria, para os atributos “fonte” ou “baixo”. A referida Portaria foi revogada pela RDC 54, de 12/11/2012.

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Visando melhorar e facilitar o entendimento do consumidor, em 8/10/2020 foram aprovadas a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 429/2020, que dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados e a Instrução Normativa (IN) 75/2020 que estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados.

As novas regras alteram a tabela de informações nutricionais. Permanece obrigatória a declaração do valor energético e dos nutrientes carboidratos, proteínas, gorduras totais, gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar, e sódio, e passam a fazer parte da tabela os valores de açúcares totais e adicionais.  Uma nova coluna será inserida, para que os valores energético e nutricionais, possam ser conhecidos não só na porção, mas também em 100 g ou 100 ml do produto, o que possibilitará a comparação entre produtos similares. Além disso, passará a ser grafada somente em letras pretas em fundo branco.

A embalagem contará com uma rotulagem nutricional frontal, destacada por uma lupa, que ficará posicionada na lateral esquerda do bloco informativo, que dará destaque as quantidades de açúcares adicionados, gorduras saturadas ou sódio que forem iguais ou superiores aos limites definidos pela Instrução Normativa (IN) 75/2020.

De acordo com um relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), as advertências frontais nos rótulos ajudam consumidores a escolher alimentos mais saudáveis.

O rótulo do produto que apresentar a rotulagem nutricional frontal, com um ou mais dos nutrientes citados anteriormente,  não poderá apresentar atributos nutricionais como, “Não contém…”, “Baixo…”, “Reduzido…”, “Sem adição de…”, desses mesmos nutrientes.

Com as alterações na rotulagem nutricional dos alimentos, teremos consumidor mais bem informado. Espera-se redução do consumo de nutrientes que possam levar a doenças como diabetes, dislipidemias e hipertensão arterial.

A indústria de alimentos obteve um prazo de 24 meses para início da vigência da (RDC) 429/2020 e a da Instrução Normativa (IN) 75/2020, mais um prazo de 12 meses para adaptações. O que se espera é a adequação dos rótulos à nova legislação e que o setor de fabricação de alimentos vença o desafio de colocar no mercado produtos alimenticios com uma  quantidade mínima de elementos nocivos  na sua composição.


Esta coluna foi escrita por Sidnéia Sassi, professora nos Cursos Técnicos em Nutrição e Gastronomia na Escola Técnica Estadual Júlio de Mesquita. Pós-graduada em Gastronomia e Cozinha Autoral pela PUC-RS, pós- graduada em Obesidade e Emagrecimento pela AVM – Faculdade Integrada, pós-Graduada em Gestão Escolar e Educação Digital pela Faculdade Venda Nova do Imigrante (Faveni). Bacharelou-se em Nutrição pelas Faculdades Integradas Coração de Jesus. Tecnólogo em Gastronomia pela Universidade Anhanguera. Colaboradora voluntária do Observatório Conjuscs, da USCS.