Abolição

Eu sou negro, preta é cor da minha pele, e quero a minha parte no Brasil. Por Ariovaldo Ramos

Como disse o negro Jesus de Nazaré, a minha vida ninguém tira. Exijo que parem de apontar as suas armas para a cor da minha pele. E tirem seu preconceito do caminho que eu vou passar com o meu valor!

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Sou negra, sou negro, fui trazido, contra a minha vontade, para as terras brasileiras, desde a imensidão da África vim nos navios negreiros, em condições piores às que se oferecem aos animais. À força, fui escravizado por 380 anos. No dia 13 de Maio de 1888, me disseram que a escravidão foi abolida, mas, na verdade, ela foi disfarçada.

Fui mandado embora para tentar a vida nas ruas, da senzala para as ruas, sem ser indenizado por mais de 3 séculos de trabalho, sem ser indenizado por ter enriquecido esse país, sem ter acesso à terra, e sem ter a mínima possibilidade de sobreviver.

Criei quilombos, comunidades no meio do nada, me esgueirei pelos becos das cidades, construi barracos, aceitei o emprego que tinha, o salário que se oferecia… Sobrevivi!

Sem acesso à escola, sem acesso à terra, sem acesso aos cuidados necessários a qualquer ser humano, sem esperança! Mas, contra tudo e contra todos, sobrevivi!

Eu sou negro, eu sou o primeiro homem, nascido da arte de Deus que me esculpiu e soprou nas minhas narinas, repartindo a sua vida em mim, eu sou negra, nascida da engenharia genética de Deus, sou a mãe de todos os seres humanos! Eu vivi no jardim das delícias, eu estou por detrás do mistério da humanidade!


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Eu sou o negro Abrão que Deus chamou para abençoar a humanidade; eu sou o negro Moisés, Deus se revelou a mim, me contou quem era e o que fez!

Eu sou o negro Jacó, Deus fez de mim um príncipe e com os meus filhos atravessei o mar vermelho em busca da terra prometida!

Eu sou a negra, a rainha de Sabá, minha beleza está cantada no Livro Sagrado, em verso e em prosa!

Eu sou o negro Jesus, filho de José, da aldeia de Nazaré, parido pela negra Maria, a serva de Deus, no estábulo, fui anunciado pelos profetas e encontrado pelos pobres na manjedoura, em Belém da Judéia, eu sou o Cristo, eu vim salvar o mundo, porque eu sou o filho de Deus!

Eu sou o negro Agostinho, Bispo de Hipona; eu negro Atanásio, Bispo de Alexandria, mestres da graça e da Trindade de Deus.

Eu sou o negro Atanásio, organizei a doutrina da Trindade aumentando a compreensão sobre Deus.


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Eu sou negro, eu sou negra, estou na formação da cultura desse país: eu sou o samba, que eu criei com o soar dos meus tambores, com o choro da minha cuíca, com a insistência do meu tamborim. Eu sou Pixinguinha, do chorinho, a arte popular mais erudita. Eu ajudei a construir a arte e a língua desse país: eu sou o Aleijadinho, das esculturas em pedra sabão, eu sou Machado de Assis, eu sou Lima Barreto!

Eu ajudei a construir o sonho desse país, eu sou Joaquim Nabuco, eu sou André Rebouças, eu sou Teodoro Sampaio… Eu estou em todos os ritmos, eu estou em todas as danças, eu estou em todos os movimentos, nos esportes, na superação, eu sou Macunaíma, eu sou o Brasil negro, eu sou a negritude do Brasil!

Eu não sou mulato nem moreno, eu sou negro, preta é cor da minha pele, e eu quero a minha parte no Brasil: eu quero a minha parte na democracia partidária, no governo,  na universidade, na cátedra, nos negócios, nos esportes, nas igrejas, no dia a dia…

Como disse o negro Jesus de Nazaré, a minha vida ninguém tira, e eu a retomo, arrancando-a das mãos da morte pela ressurreição… Eu não sou bandido, eu não sou ladra, eu exijo que parem de apontar as suas armas para a cor da minha pele, que parem de matar os meus filhos e filhas. E tire o seu preconceito do caminho que eu vou passar com o meu valor!

RBA

Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito


Este artigo não reflete reflete necessariamente a opinião da Rede Brasil Atual