renovação da outorga

Sabesp propõe sistema similar ao que ela ignorou e podia ter evitado crise no Cantareira

Companhia não respeitou a Curva de Aversão a Risco, metodologia constante da outorga de 2004, que limita a quantidade de água a ser retirada de acordo com o volume do reservatório

Jorge Araújo/Folhapress

Falta de controle na retirada de água levou a Sabesp a chegar na segunda cota do volume morto do Cantareira

São Paulo – Segundo o jornal O Estado de São Paulo, a Sabesp encaminhou ofício ao Departamento de Água e Energia Elétrica (Daee) propondo um modelo de segurança hídrica que “antecipa reduções gradativas de retirada de água com base em um indicador do estado do sistema”, como parte de seu pedido para renovação da outorga – documento que define as regras de uso do reservatório – da captação de água do Sistema Cantareira, que deve ser debatida este ano.

Em resumo, o modelo define quanto de água pode ser retirado dos reservatórios de acordo com volume que entra por meio de rios e chuvas.

De acordo com a reportagem, a Sabesp argumenta que seria possível ter mantido uma vazão mais adequada no Sistema Cantareira, inclusive sem necessidade de utilização do volume morto, se o modelo de segurança hídrica proposto estivesse em uso desde 2012. Assim, as vazões seriam “significativamente maiores do que as efetivamente praticadas e apresentam valores que, se sabe hoje, podem ser administrados até com certa facilidade”, diz o documento.

No entanto, a Sabesp ignorou durante todo o tempo a Curva de Aversão a Risco, instrumento de segurança hídrica constante da outorga de 2004, que define quanto pode ser retirado de água do reservatório de acordo com a quantidade acumulada. O modelo é utilizado em vários países e também pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico, que faz a gestão das represas utilizadas na geração de energia. Quando respeitado, o instrumento pode garantir a segurança hídrica durante dois anos de seca.

Em janeiro do ano passado, quando o volume útil do Cantareira era de 27,14 %, a retirada de água deveria ser inferior a 29 m³/s. Porém, a vazão média retirada no mês foi de 32 m³/s. A situação se repetiu em fevereiro, quando o volume era de 21,99% e, conforme a tabela da Curva de Aversão a Risco, a retirada devia ser de até 28 m³/s, mas foi de 33 m³/s.

RBA
Modelo das curvas da outorga de 2004, indicando o percentual do volume útil e a vazão de retirada de água, mês a mês

Em ação civil pública movida pelos promotores do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente (Gaema) Alexandra Facciolli Martins, Ivan Carneiro Castanheiro (Piracicaba), Rodrigo Sanches Garcia e Geraldo Navarro Cabañas (Campinas), e pelo procurador Leandro Zades Fernandes, do Ministério Público Federal (MPF), em outubro do ano passado, já havia sido denunciado o desrespeito às regras de operação do Cantareira, inclusive da Curva de Aversão a Risco.

Na ação, eles pediam que a Sabesp apresentasse um plano de contingência e oferecesse garantias de volume armazenado para o período seco deste ano. A ação foi julgada procedente, mas somente em fevereiro deste ano.

A Sabesp só realizou reduções de retirada de água após determinação do Daee e da Agência Nacional de Águas (ANA). No entanto, só aplicou reduções drásticas a partir de outubro, quando o sistema já estava próximo de ter a segunda cota do volume morto explorada pela companhia.

Por meio do ofício, a Sabesp solicitou a manutenção do direito de retirar até 31 mil litros de água por segundo (l/s) do Cantareira pelos próximos dez anos mantendo a vazão definida na outorga de 2004. A região da Bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (Bacia PCJ) teriam vazão de até 5 mil l/s. A decisão sobre a renovação deve ser tomada até outubro deste ano.

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