Entidades pedem apoio da sociedade na tentativa de barrar Belo Monte

Professor da Universidade Federal do Pará entende que Ibama não teve tempo para fazer avaliação concreta e que população de Altamira tenta entender dimensão do projeto

Organizações socioambientais iniciaram movimento de pressão institucional para tentar barrar a construção da hidrelétrica de Belo Monte, na Bacia do Rio Xingu, tida como prejudicial ao meio ambiente por diversas ONGs.

Depois das manifestações da semana passada no Pará, uma carta disponibilizada pela Rede Brasileira de Justiça Ambiental pede ao presidente Lula, aos ministros Carlos Minc (Meio Ambiente) e Édison Lobão (Energia) e ao presidente do Ibama, Roberto Messias, que reavaliem a concessão da licença ambiental para a hidrelétrica.

A intenção é que cada interessado em manifestar reprovação ao projeto, considerado pelo governo o mais importante do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), copie o texto e envie às autoridades (há uma lista de emails que, além dos integrantes do Poder Executivo, inclui o Ministério Público Federal).

O texto manifesta preocupação com o ritmo acelerado de concessão da licença. A avaliação tem como base um documento feito por técnicos do Ibama, datado de novembro e divulgado recentemente, no qual se aponta que, devido ao curto prazo dado pelo Planalto, “algumas questões não puderam ser analisadas na profundidade apropriada, dentre elas as questões indígenas e as contribuições das audiências públicas.”

As únicas conclusões apresentadas pelo Ibama na ocasião são de que não houve tempo para prognósticos: há incerteza quanto à manutenção da biodiversidade, do nível de estresse hídrico gerado pela construção de novas represas e do impacto gerado pela chegada à região de dezenas de milhares de pessoas.

Rodolfo Salm, PhD em Ciências Ambientais pela Universidade East Anglia e professor da Universidade Federal do Pará, aponta que a população na cidade de Altamira, onde ele mora e que será afetada pela hidrelétrica, ainda tentam entender a dimensão de Belo Monte. “É a terceira maior hidrelétrica do mundo numa cidade que é tranquila. A gente não tem estrada asfaltada, o trânsito é simples, as pessoas dormem de porta aberta. E de uma hora para outra isso vai mudar radicalmente”, lamenta.

Ele, em parceria com colegas do meio acadêmico, tenta divulgar aqueles que acredita que serão os impactos da hidrelétrica, com edital previsto para depois do carnaval e leilão pré-agendado para 12 de abril. Mas o professor entende que a sociedade como um todo não está ciente da questão e culpa parte da imprensa por passar aos brasileiros informações equivocadas, privilegiando o desenvolvimentismo em detrimento da preservação ambiental.

É o mesmo teor da crítica da carta divulgada pela Rede Brasileira de Justiça Ambiental, que pede uma posição “ambiental e socialmente responsável” dos órgãos de planejamento. “Apoiamos a demanda dos povos da Volta Grande do Xingu para que, no lugar da construção dessa grande represa, seja priorizada a consolidação do projeto de agricultura familiar nessa região, iniciado nos anos 1970, através do ordenamento fundiário e ambiental, da infra-estrutura para os assentamentos, da recomposição do passivo ambiental, da melhoria da qualidade de vida dos moradores das áreas rurais e urbanas, assim como a implementação das Reservas Extrativistas”, aponta o documento.

O ministro Carlos Minc tem dito que as mais de 40 condicionantes impostas pelo Ibama na concessão da licença ambiental são suficientes para garantir a mitigação dos impactos ambientais. As medidas, como construção de centros de saúde, saneamento e melhoria das condições de vida da população local, devem ser cumpridas pelo consórcio que vencer a licitação e estão orçadas em R$ 1,5 bilhão (o investimento total está estimado entre R$ 20 bilhões e 30 bilhões).

Rodolfo Salm acredita que as condições estão longe de serem suficientes e reclama que a concessão da licença ambiental já estava decidida, ignorando-se a possibilidade de que o Ibama vetasse o projeto, nascido na época da ditadura militar e retomado no início desta década. O professor da UFPA entende que haverá impactos como o alagamento de parte da cidade de Altamira, o aumento na mortalidade de peixes e mais tensões nos territórios indígenas. “O impacto mais importante vai ser a explosão na taxa de desmatamento na Amazônia Oriental. Isso levaria à destruição de quase toda a bacia do Rio Xingu, tudo o que resta no Pará, e geraria uma contribuição absurda do Brasil para o efeito-estufa”, afirma.

Na sexta-feira (12), movimentos socioambientais devem se reunir em São Paulo para definir as próximas ações a serem tomadas. Algumas organizações que já trabalhavam com a hipótese de ingressar no Sistema Interamericano de Direitos Humanos contra o Estado brasileiro pela obra devem reforçar a intenção durante o encontro.