Alckmin impede limite a propaganda de alimento não saudável na TV
Projeto que tentava proteger consumidor infantil, aprovado na Assembleia Legislativa, foi vetado pelo governador, que teria cedido ao lobby da indústria
Publicado 30/01/2013 - 12h15
Indústria de alimentos não saudáveis continuará podendo usar personagens e celebridades do mundo infantil nas propagandas (Foto: stock.xchng)
São Paulo – O governador Geraldo Alckmin (PSDB) vetou na noite de ontem (29) o Projeto de Lei 193/2008, do deputado estadual Rui Falcão (PT), que proibia a veiculação na TV e no rádio, entre 6h e 21h, de publicidade dirigida a crianças sobre alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com alto teor de açúcar, gorduras saturadas ou sódio. O projeto, aprovado em dezembro na Assembleia Legislativa, impedia a utilização de personagens e celebridades infantis na propaganda e brindes associados à compra.
Segundo o governo paulista, o texto foi vetado “por ser inconstitucional”. A justificativa é de que o artigo 22 da Constituição Federal, em seu inciso XXIX, determina ser de competência da União legislar sobre propaganda comercial. Os Estados, portanto, estariam impedidos de atuar nessa área.
Mas advogados e entidades ligadas à defesa dos direitos do consumidor discordam. De acordo com eles, a Lei 8.078/1990, que é federal, já permitiria a regulação do tema.
“Existem muitas teses jurídicas. Nesse caso, o governo optou por essa visão, que aponta para a inconstitucionalidade. Mas temos outra tese. Achamos que, a partir do Código de Defesa do Consumidor, uma lei federal, que já veda publicidade enganosa, especificamente dirigida a crianças, outras leis infrafederais poderiam ser aplicadas”, diz Mariana Ferraz, advogada do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).
O Código determina expressamente, em seu artigo 37, que “é proibida toda publicidade enganosa ou abusiva” e, no parágrafo 2°, especifica: “É abusiva, dentre outras, a publicidade que se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança”, e também que “seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde”.
Mariana Ferraz diz que, em meados de janeiro, o Idec fez um pedido de audiência ao governador para mostrar a ele alguns dados considerados relevantes, no sentido de convencê-lo a sancionar a proposta. “Nossa intenção era subsidiar uma possível sanção, mas não houve resposta ao pedido feito pelo Idec, pelo instituto Alana e outras entidades que também se manifestaram”.
A advogada diz que o instituto Alana propôs um abaixo-assinado que teve mais de 14 mil adesões pedindo a sanção a Alckmin. Segundo ela, diversas entidades de repercussão internacional se manifestaram, como a Organização Panamericana de Saúde. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, órgão consultivo da Presidência da República, também recomendou a sanção.
Lobbies poderosos
Segundo a advogada do Idec, qualquer iniciativa de se regulamentar a publicidade prejudicial esbarra nos lobbies dos setores da indústria e da propaganda. “Existem outras iniciativas em âmbito federal que estão sendo debatidas”, diz. “Mas há uma estrutura muito grande por parte da indústria e do setor publicitário para impedir a aprovação de regras nesse sentido, que se valem do fato de a criança não ter a maturidade para perceber o intuito mercadológico.”
Ela cita a Resolução 24 da Anvisa como exemplo de situação em que o lobby industrial-publicitário acaba se saindo vencedor. A resolução dispunha que todo anúncio de alimentos com altos teores de gordura, sal e açúcar deveria vir acompanhado de mensagens de alerta ao público, deixando-o ciente de que o consumo exagerado desses produtos poderia acarretar problemas de saúde.
“Houve um verdadeiro bombardeio no Judiciário e, infelizmente, por conta de liminares na Justiça, essa resolução está com a eficácia suspensa”, conta Mariana Ferraz. “O teor da resolução teve grande participação da sociedade civil, foi colocada em consulta pública, foi discutida por anos. A gente vê tudo isso como um retrocesso a um movimento democrático, que ouviu sociedades médicas, de defesa do consumidor, de proteção à criança.”