MPF vai recorrer da decisão de juiz que rejeitou ação contra militar

Procuradores afirmam querer cumprir determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Para eles, denúncia não questiona a Lei de Anistia

São Paulo – O Ministério Público Federal (MPF) anunciou que vai recorrer da decisão do juiz João César Otoni de Matos, de Marabá, para que o coronel da reserva Sebastião Rodrigues, o major Curió, seja processado por crimes de sequestro de militantes da Guerrilha do Araguaia. O juiz rejeitou hoje (16) a denúncia. “Os procuradores da República que atuam no caso – do Pará, Rio Grande do Sul e São Paulo – já estão trabalhando no recurso que será dirigido ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região”, diz o MPF. 

“Não estamos questionando a decisão do STF de manter a validade da Lei de Anistia”, reforçou o procurador Felício Pontes Jr. “Ao negar que o processo criminal continue, a Justiça sim contraria não só a Corte Interamericana, como o próprio STF, que permitiu extraditar militares para serem julgados pelos mesmos crimes imputados ao coronel Curió no Brasil.”

“Estamos efetivamente dispostos a cumprir a determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos que deixou clara a obrigação brasileira de trazer a verdade sobre os fatos que ocorreram naquele momento, de dar uma satisfação às famílias que até hoje não sabem o que ocorreu com seus parentes e também a cumprir o precedente do Supremo Tribunal Federal sobre vítimas de desaparecimento forçado”, afirma o procurador Ubiratan Cazetta.

Ele se referiu à decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre crimes cometidos pela ditadura no Araguaia e também à decisões do STF em pedidos de extradição feitos pelo governo da Argentina. “Não existe convicção de que as pessoas estão mortas, portanto, é fundamental que a Justiça analise os casos, permita a produção de provas, traga à luz a história dessas vítimas. Não se pode simplesmente presumir sua morte sem mais indagações e dispensando-se a instrução processual”, contesta o procurador Tiago Rabelo, de Marabá.

O MPF argumenta ainda que a denúncia contra Curió não questiona a Lei da Anistia – observa precedentes do Supremo em casos análogos, além de obedecer à decisão da Corte Interamericana, sob o argumento de que o Pacto Interamericano de Direitos Humanos foi assinado pelo Brasil e tem força de lei. “Se o Brasil não quer cumprir o pacto, o que seria uma decisão política absolutamente desastrosa na minha opinião, a adesão do Brasil tem de ser desfeita, isso tem de ser feito oficialmente. O país voluntariamente aderiu ao pacto e a partir disso precisa cumpri-lo, não pode se recusar toda vez que uma decisão lhe desagradar”, argumenta Cazetta.

Rabelo acrescenta que “o MPF considera insuficientes os fundamentos da decisão do juiz Otoni Matos, porque afirma que a Lei de Anistia é válida e alcança fatos passados, mas não considera que ela própria, expressamente, se refere a fatos ocorridos até 15 de agosto de 1979, não se aplicando, portanto, a condutas que se prolongam no tempo, como no caso do crime de seqüestro referido na denúncia, de caráter permanente, já que não se sabe o paradeiro das vítimas”.