Para procurador, pensamento único mantém política energética do país no atraso

Ubiratan Cazetta ressaltou a importância de estudos que detalhem impactos cumulativos causados pelas usinas em todo um bioma ou uma comunidade

São Paulo – Em um momento no qual corre na Justiça o futuro das construções de usinas hidrelétricas e o futuro do modelo da matriz energética brasileira, o procurador da República no Pará, Ubiratan Cazetta, afirma que o Brasil não pode depender de um modelo centralizador, vindo de um pensamento que enxerga exclusivamente a hidrelétrica como alternativa para a produção de energia.

“Não precisamos de um pensamento centralizador que vê na função hidrelétrica a única alternativa e que despreza os impactos ambientais e os impactos cumulativos de um modelo de mudanças climáticas”, ressaltou Cazetta, durante congresso que discutiu direito ambiental, em São Paulo. Ele lembra que os Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE) do Mato Grosso do Sul entraram na Justiça pedindo a suspensão das hidrelétricas da Bacia Alto Paraguai, no Pantanal, pela falta de estudos que detalhem os efeitos cumulativos que as usinas podem fazer no bioma.

Na última quinta-feira (23), a Justiça Federal determinou que não sejam mais emitidas licenças ambientais para usinas hidrelétricas na Bacia do Alto Paraguai, que abrange os estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. A decisão liminar atende a um pedido dos Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE) de Mato Grosso do Sul suspende a instalação de 126 empreendimentos hidrelétricos no entorno do Pantanal.

Segundo a decisão judicial, existe “prova inequívoca” de que os empreendimentos estão sendo instalados sem a observância das normas protetivas básicas, que inclui o prévio estudo de impacto ambiental em toda a Bacia do Alto Paraguai.

O procurador afirma que o mesmo será feito, também em conjunto com os Ministérios Públicos de dois estados, para que sejam solicitados estudos que detalhem o impacto dos complexos do Rio Tapajós e Teles Pires, também na região Amazônica, que juntos compreendem sete usinas hidrelétricas.

Para Ubiratan Cazzetta, a discussão de que não é possível “fatiar” os estudos de impactos ambientais de obras desse porte numa mesma bacia –  como se as hidrelétricas construídas lado a lado não produzissem efeitos sinérgicos – data dos anos 90.

“Quando vi a construção de um novo texto constitucional, no anos 80, pensei que ele nos conduziria a um outro patamar. Mas ressalto que hoje se não está frustrada totalmente, uma parte daquela expectativa está bastante abalada. Abalada por uma capacidade de fazer debates sem uma agenda de participação popular”, lamenta Cazzeta.

Sobre a usina de Belo Monte, no Pará, região onde  atua, o procurador afirma que o custo da obra, cerca de R$ 30 bilhões, ainda não pode ser considerado um investimento seguro, por conta da instabilidade da vazão do rio Xingu: por uma parte do ano, quando as chuvas da região ficam escassas, a intensidade da vazão da água pode não ser suficiente para produzir a quantidade de energia prevista no projeto inicial,  (11,2 mW). Cazzeta também alertou quanto aos impactos socioambientais que a região enfrentará por conta da dimensão das obras.
 
No dia 14 de agosto, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) votou pela suspensão imediata das obras de Belo Monte por descumprimento à determinação da Constituição Federal que obriga audiências públicas com as comunidades afetadas antes da autorização das obras pelo Congresso Nacional. Ontem (27) a Procuradoria-Geral da República (PGR) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer pedindo que se mantenha a suspensão das obras da usina.

O STF, no entanto atendeu a um pedido Advocacia-Geral da União (AGU) e liberou as obras, em decisão do ministro Ayres Britto tomada na noite da segunda-feira (27).