Vacina salva

Baixa adesão à vacinação preocupa Europa, que endurece restrições

Europa vive ‘pandemia dos não vacinados’. Países com menor taxa de vacinação sofrem com aumento de mortes. Já os casos explodem em todo o continente

Paulo Vitor
Paulo Vitor
Até o momento, seis ministros votaram para liberar o pagamento do piso

São Paulo – A covid-19 segue em trajetória de crescimento na Europa. Depois de seis semanas de ascensão nos números de casos e de mortes, países do continente voltam ampliar restrições. Holanda e Áustria, por exemplo, retomaram medidas severas de lockdown. Portuga vê o aumento de casos, mas sem impacto nas mortes, já que é o país mais vacinado da Europa. Mas o governo retomou a obrigatoriedade do uso de máscaras, além da política de rastreio ativo de contágios. A “quarta onda” de impacto da covid-19 na Europa, apesar de severa, tem reafirmado a importância da vacinação.

Isso porque nos países mais vacinados as internações e mortes seguem sob relativo controle. Autoridades locais estão chamando essa nova onda de “pandemia dos não vacinados”. Em razão disso, a chanceler alemã Angela Merkel vem repetindo apelos para que a população se vacine. Depois de chamar a situação de “dramática” ela alertou, no fim de semana, que a situação pode ser “pior do que tudo que vimos até agora“. Por isso, o país agora estuda adotar regime de vacinação obrigatória.

Caso alemão

A Alemanha vem registrando mais de 250 mortes diárias pelo novo coronavírus, e os casos superam a marca dos 50 mil por período. Trata-se do pior momento do surto no país até então. Além de uma taxa de vacinação insuficiente, pesa o fim do distanciamento social e de medidas não farmacológicas. Mesmo com ampla oferta de vacinas, menos de 70% dos alemães tomaram as duas doses das vacinas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) fala na necessidade de a imunização completa atingir mais de 80% da população. Já as autoridades alemães passaram a falar em 85%.

A jornalista alemã Sabine Kinkartz, do DW, explica que a adesão insuficiente aos imunizantes tem relação com grupos negacionistas. Pessoas ligadas à extrema direita, tal como observado no Brasil entre apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, adeptos a teorias conspiratórias e contrários à ciência. “O número de pessoas vacinadas é especialmente baixo nos estados da Saxônia e da Baviera. Mas por que há tanta gente indisposta a se vacinar? Muitas pertencem ao movimento Querdenken (“pensamento lateral”, em tradução livre para o português), que é profundamente cético em relação ao Estado alemão, à política, à mídia e à sociedade em geral”, explica.

Diante deste cenário, a profissional alemã cobra imunização compulsória. “Quando os deputados finalmente entenderão que apelar aos não vacinados e estimular todos a agirem de forma responsável não é o bastante? Há apenas uma solução para essa bagunça: tornar a vacinação obrigatória para todos. É inacreditável que as vacinas ainda não sejam obrigatórias para qualquer pessoa que trabalhe no setor de saúde da Alemanha, em casas de repouso, escolas e jardins de infância”.

Pandemia dos não vacinados

Conforme dito, nos países mais vacinados, os imunizantes estão funcionando bem como um escudo protetor. Levantamento da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), de Lisboa, indica que, no país, a imunização evitou 2.300 mortes, 200 mil infecções, 135 mil dias de tratamentos em enfermarias e 55 mil dias de cuidados em UTIs. Isso, desde maio deste ano. Hoje, a taxa de vacinação no país é de quase 87%. A rejeição às vacinas é uma das menores do mundo, abaixo de 2%.

O fato é que existe uma relação inversamente proporcional. Quanto mais vacinados em um país, menos mortes. Os gráficos e estatísticas comprovam este movimento. Países europeus em que o negacionismo e a rejeição às vacinas é alto, como Rússia, Bulgária e Romênia, assistem ao pior momento de mortes desde o início da pandemia, em março de 2020. Enquanto isso, além de Portugal, outras nações estão com a situação mais confortável, como Espanha, Malta, Islândia, Itália, Dinamarca e Noruega. A Itália, primeiro país da Europa a ver o sistema de saúde colapsar diante da covid-19, ainda em abril de 2020, agora está perto de 80% da população totalmente alcançada pela vacinação. Hospitais italianos estão recebendo pacientes da Alemanha, que enfrenta falta de leitos em algumas regiões.


Vacinação na Europa x Mortes diárias

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Pandemia dos não vacinados. Gráfico revela que países da Europa com menor percentual de alcançados pela vacinação têm mais mortes. Fonte: OurWorldInData/Via Público

Prevenção

Contudo, especialistas cravam que para superar a pandemia, além da imunização robusta, são necessárias medidas para frear a disseminação do vírus. Isso porque mesmo que as vacinas reduzam drasticamente as mortes, não existe imunizante 100% eficaz contra nenhuma doença. Logo, menos mortes, em um cenário de descontrole, continuarão a ser muitas. O fim da obrigatoriedade de máscaras em Portugal pode ser avaliado como um erro, já que os casos por 100 mil habitantes agora chegam na casa de 173,7. Na Espanha, com menos vacinados, 79,2%, o uso de máscaras não foi descartado e agora, em meio à quarta onda, o país tem 92 casos por 100 mil habitantes.

Balanço

Apesar do negacionismo no Brasil ter como representante o presidente da República (ele mesmo se recusou a tomar vacina), a população tem boa adesão ao programa de imunização. Quase 90% dos brasileiros afirmaram ter a intenção de se vacinar, de acordo com levantamento Trend, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Este movimento fica comprovado nos números do país. Mesmo com o atraso e a gestão desastrosa do governo na compra de vacinas, mais de 80% da população tomou ao menos a primeira dose, e 64% está totalmente imunizada. O país também avança na aplicação da terceira dose de reforço, autorizada para todos os adultos, cinco meses após administrada a segunda.

Com isso, o surto segue em situação de estabilidade após uma grande melhora observada no segundo semestre. Em abril, a média diária de mortes superou a marca de 3 mil. Hoje (22), este indicador está em 205. Nas últimas 24 horas, o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) notificou 123 vítimas. Desde o início da pandemia, morreram 612.782 pessoas no país. Também foram registrados 2.594 novos casos, totalizando 22.019.870 infectados, sem contar com ampla subnotificação.

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Números da covid-19 no Brasil. Fonte: Conass