Reação

Entidades médicas apoiam servidores da Anvisa, atacados por Bolsonaro e seguidores

Diante das “ameaças gravíssimas”, Abrasco e Cofen destacaram a importância da estabilidade dos servidores, classificando como “fake news” os boatos sobre efeitos adversos da vacinação em crianças

Arquivo/Agência Brasil
Arquivo/Agência Brasil
Anvisa teme "ações covardes e criminosas". Senadores também repudiaram ameaças

São Paulo – Entidades médicas divulgaram notas em apoio a servidores e diretores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Desde a última sexta-feira (17), a entidade recebeu mais de 130 e-mails com ameaças. Esses ataques são proferidos por apoiadores de Jair Bolsonaro, estimulados pelo próprio presidente. O suposto “crime”, na visão de grupos antivacina, foi a Anvisa ter aprovado o uso da vacina da Pfizer contra a covid-19 para crianças de 5 a 11 anos. Na Europa, países como França, Portugal e Espanha, já começaram a vacinar os pequenos. Nos Estados Unidos, mais de 5 milhões tomaram o imunizante. Até o momento, nenhum efeito colateral grave foi registrado.

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) manifestou, nesta terça-feira (21), “total apoio e solidariedade” aos técnicos da agência. Destacou que a independência técnica da Anvisa”é um princípio inalienável” que deve ser defendido e preservado”. Classificou como “inaceitável” a “sanha aparelhista e negacionista” do atual governo. Diante das “ameaças gravíssimas”, a Abrasco ressaltou, ainda, a importância da estabilidade dos servidores públicos como forma de resistir a esse tipo de pressão.

Por sua vez, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) condenou a perseguição. Nesse sentido, cobrou a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Polícia Federal (PF) para que garantam a integridade física dos servidores e seus familiares. Além disso, classificou como fake news os boatos sobre efeitos adversos graves da vacinação em crianças. “Segundo dados divulgados pelo enfermeiro epidemiologista Wanderson Oliveira, as crianças vacinadas têm 40 vezes menos chances de desenvolver miocardite do que aquelas não imunizadas ao ter Covid-19”.

Reincidente

Enquanto isso, Bolsonaro voltou a atacar a Anvisa. No último domingo (19), de férias no litoral paulista, classificou como “inacreditável” a decisão. “Criança é coisa muita séria. Não se sabe os possíveis efeitos adversos”, desinformou. “Se depender de mim, é o pai que decide.”

A decisão da Anvisa, no entanto, não determina a obrigatoriedade da vacinação. Nem sequer é possível imaginar, assim, que crianças tomem sozinhas a decisão de ir até o posto de saúde, quando as vacinas estiverem disponíveis. Anteriormente, durante uma live, Bolsonaro prometeu divulgar os nomes dos servidores que autorizaram a vacinação.

Em resposta, diante dos ataques e ameaças, as sociedades brasileiras de Imunizações (SBIm), Pediatria (SBP) e Infectologia (SBI) decidiram tornar público o parecer enviado à Anvisa em que defendem a vacinação das crianças de 5 a 11 anos.

Senadores

O episódio também repercutiu no Senado. “Mais uma vez, o presidente Bolsonaro, na falta de fundamentos científicos para responder à decisão da Anvisa, recorre às fake news, ao ódio e à incitação à violência”, afirmaram, em nota, os senadores da Frente Parlamentar Observatório da Pandemia, que sucedeu a CPI da Covid.

Rogério Carvalho (PT-SE) também declarou que as ameaças a servidores são “fruto da ignorância, do desrespeito às instituições e de um trabalho orquestrado”. O senador afirmou que a decisão da Anvisa decorre de “estudos sérios”. Por outro lado, também condenou o posicionamento do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que pretende realizar audiências públicas para discutir a vacinação para crianças. E disse que vai acionar a pasta para que se inicie “imediatamente” a vacinação das crianças de cinco a 11 anos, de acordo com as orientações da Anvisa.

Investigação

Além disso, a PF-DF abriu investigação para apurar ameaças em redes sociais a diretores e servidores da agência. O inquérito foi aberto ainda em 15 de dezembro, véspera da decisão da Anvisa que autorizou a imunização infantil. No entanto, as investidas começaram em novembro, ainda durante as análise do processo. Os ataques se avolumaram após a sua aprovação.

A própria agência comunicou as agressões aos órgãos de segurança e justiça. Além da PF, a Anvisa oficiou o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; o ministro da Justiça, Anderson Torres; e o procurador-geral da República, Augusto Aras. Em nota, o órgão explicita sua preocupação em relação à segurança dos seus funcionários. Ou seja, “não é possível afastar neste momento que tais servidores sejam alvo de ações covardes e criminosas”.

Inquérito

Também hoje, investigação da Polícia Federal concluiu que houve crime de ameaça em e-mails enviados a diretores da Anvisa por um homem que se diz contrário à vacinação de crianças contra a covid. O inquérito apontou que o paranaense Douglas Bozza como autor das ameaças. Na mensagem, o homem diz que pretendia retirar o filho da escola para evitar que ele tenha que tomar uma “vacina experimental”, e que “quem ameaçar, quem atentar contra a segurança física do meu filho: será morto. Isso não é uma ameaça. É um estabelecimento”.

A Procuradoria da República no Distrito Federal denunciou Douglas à 15ª Vara de Federal de Brasília por crime de ameaça. No entanto, o delegado não pediu o indiciamento do homem investigado por considerar que a ameaça é um crime de menor potencial ofensivo .Agora, o caso está nas mãos da Justiça, que vai avaliar se há elementos que justifiquem torná-lo réu. Se processado e condenado, o autor poderá ser sentenciado com detenção de um a seis meses.


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