Mobilização

Contra efeitos da PEC 55 à pesquisa científica, pós-graduandos vão às ruas nesta sexta

Associação Nacional dos Pós-Graduandos (Anpg) define calendário de mobilizações contra PEC, os cortes de investimentos na pesquisa e a MP que fragmenta e empobrece o ensino médio

Arquivo/Organização Mundial da Saúde

Liderança do Brasil nas pesquisas sobre o zika vírus, em 2015, não seria possível se a PEC 55 já estivesse em vigor

São Paulo – A Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG) divulgou hoje (9) convocação a todos os estudantes de cursos de pós-graduação do país a participar das mobilizações marcadas para o dia nacional de mobilização contra a retirada de direitos e contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 – marcado para esta sexta-feira (11).

A entidade defende ainda a participação na assembleia nacional das ocupações das entidades estudantis na Universidade de Brasília (UnB) no próximo dia 15 e a marcha a Brasília no dia 29. As duas manifestações são pela retirada da PEC que congela os investimentos, da Medida Provisória (MP) 746, que fragmenta o ensino médio e empobrece o currículo, desobrigando o ensino de filosofia, sociologia, artes e educação física, e contra a redução do papel do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – que foi órgão máximo da Ciência e Tecnologia.

O financiamento da pesquisa é um dos principais pontos da agenda, e inclui a luta pela devolução das bolsas de estudos da Capes e mais financiamento para o setor – o que inclui a revogação de cortes no orçamento público na educação, ciência e tecnologia.

A presidenta da ANPG, Tamara Naiz da Silva, aluna do doutorado em História da Economia na Universidade Federal de Goiás, diz que a PEC representa prejuízos para gerações. “Essa PEC vai congelar o pior cenário da ciência, tecnologia e inovação dos últimos sete anos, um orçamento muito ruim comparado ao dos outros anos.”

De acordo com ela, o orçamento para o setor no próximo ano é em média 30% menor que o de 2016 e representa metade do orçamento de 2010. “Algo como R$ 4,9 bilhões para a ciência, tecnologia e inovação, lembrando que agora está junto com as comunicações. Ou seja, além de menor, será para um ministério que abarca dois”, critica.

Tamara ressalta o papel estratégico da ciência, agora na mira do congelamento de investimento. “É estratégica inclusive para sustentar soluções para a crise econômica, podendo permitir a retomada do crescimento. Não é possível cortar investimento em uma área hoje e daqui a dois anos tentar retomar. Isso vai afetar pesquisas em andamento, impedir que o Brasil consiga reunir esforços de maneira rápida para combater problemas.”

Ela menciona o surto de infecção pelo vírus zika em 2015. “Rapidamente o MCTI e os ministérios da Saúde e da Educação, entre outros, se uniram para um esforço concentrado, que levou o país a grandes descobertas sobre o vírus e sua ligação com a microcefalia. Uma PEC desse tipo atrapalharia tudo; é desastrosa.”

Ao contrário de saúde e educação, por exemplo, que têm percentuais mínimos de investimento previsto na Constituição, a área da pesquisa fica à mercê de disputas e pressões durante a elaboração da lei orçamentária.

“Como o governo não é obrigado a investir no setor um percentual mínimo, o orçamento vai ficar espremido entre o que sobrar de outras áreas. O país investe cerca de 1,6% do PIB, quando a luta histórica dos pesquisadores é por um mínimo de 2%, já que pesquisar não é barato, precisa de laboratórios. Seria algo um pouco superior que o Judiciário gasta apenas com pessoal, que é algo em torno de 1,8% do PIB. Nos outros países não chega a 1%. Olha a discrepância.”

Segundo ela, com a fusão do antigo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) com o das Comunicações com a efetivação do governo de Michel Temer, no início de maio, a maioria das secretarias do atual ministério são da área de comunicações. É por essa razão que para estudantes, pesquisadores e a toda a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) houve a extinção do MCTI.

“A coisa é tão mal vista que, mesmo meses depois, ainda nem mudaram o site do MCTI. Eles acabaram com cinco secretarias, entre elas a da popularização da ciência. Agora são cinco no total de um ministério duplo, das quais só duas ligadas à ciência. O ministério foi descaracterizado num tempo em que o Brasil vem se consolidando como player importante na ciência mundial, ocupando o 13º lugar no ranking de pesquisas indexadas. Vivemos agora o pior cenário dos últimos anos e essa PEC vai congelar esse cenário. Um retrocesso indescritível, difícil até de medir. Vamos paralisar nossas pesquisas, que não param, não voltam ao mesmo estágio.”

Ela destacou prejuízos já efetivados com a política de ajuste de Michel Temer, como o desligamento do supercomputador, no meio do ano, para economia na conta de luz. “Imagine o dinheiro que foi gasto num supercomputador, muito útil. Antes tínhamos de enviar dados para análise em computadores de porte fora do país. Sem contar os cortes do orçamento das universidades federais, onde se produz mais de 80% da ciência brasileira. É o sucateamento.”