Operação Zelotes

Advogado denuncia constrangimento e interesse em atingir Lula

Defensor de lobista diz que seu cliente passou por constrangimento e foi chantageado para fazer delação premiada. E vê por trás dessa estratégia uma ação dirigida para chegar ao ex-presidente

Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Segundo advogado, Oliveira disse a lobista que não prenderia sua mulher se ele fizesse delação premiada

Brasília – O advogado Roberto Podval, que atua na defesa do lobista Mauro Marcondes Machado e de sua mulher, Regina Machado, esta última conduzida ontem (18) ao presídio da Papuda pela Operação Zelotes, afirmou não ter dúvida de que existe um interesse dirigido e político, na apuração do caso, de “atingir diretamente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”. Na tarde de hoje (19), Podval entrará com uma petição para incluir o pedido de liberação de Regina na peça jurídica já existente sobre o caso e ajuizada no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF 1). Caso não seja possível a inclusão, ele apresentará um pedido de habeas-corpus com o mesmo intuito.

O advogado denunciou que o seu cliente foi chantageado pelo delegado da Polícia Federal (PF) Marlon Oliveira Cajado, coordenador da Zelotes, a fazer delação premiada para que sua esposa, que já estava em regime de prisão domiciliar e, em função de operação, se locomove numa cadeira de rodas, não fosse encaminhada a um presídio. Ele estranha ainda o fato de o caso ser tratado como procedimento comum. “Nunca tínhamos visto isso, pois em geral são as pessoas presas que pedem para fazer delação premiada. Desta vez ocorreu o contrário. Meu cliente foi claramente constrangido”, enfatizou.

Há semanas, parlamentares como o vice-líder do governo no Congresso, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), e a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) reclamam que a Zelotes tem poupado grandes conglomerados envolvidos no caso, como forma de mudar o foco das apurações. A operação teve origem em investigações contra grandes empresas acusadas de sonegação fiscal e de pagar a integrantes de Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para conseguir alívio ou supressão de débitos. Mas passou a tomar caráter mais seletivo depois de debruçar sobre uma prática de lobby supostamente dirigido a obter, no Congresso, a aprovação de medidas provisórias, dentre as quais, uma que assegurou incentivos fiscais a empresas do setor automobilístico.

Tratamento desigual

A apuração investiga se agentes públicos receberam propinas de lobistas a serviços de empresas para conseguir as aprovações. E demonstrou mais empenho no caso ao constatar que uma das firmas tinha em sua lista de fornecedores uma empresa de Luís Cláudio Lula da Silva, LFT Marketing Esportivo. Em diversos depoimentos, o filho de Lula disse ter comprovado serviços prestados em sua área de atuação e que nada tem a ver com outros cliente e fornecedores de Mauro Marcondes.

“É estranho que a referida acusação diga respeito a um grupo empresarial que teria pago a um lobista para atuar junto ao governo e ao Congresso para mudar uma medida provisória. E, numa história dessas, em vez de todos serem presos, só quem é e passa por este tipo de situação é o meu cliente. Vejo aí um tratamento totalmente desigual na condução desta operação”, acentuou o advogado de Marcondes.

Em dezembro, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou a operação no Senado, a chamada CPI do Carf, foi concluída sem alarde, com recomendações para a elaboração de propostas legislativas que venham a coibir fraudes e sonegações. “Não vamos abandonar o caso nem deixar que as empresas fraudadoras saiam impunes”, afirmou a relatora da comissão, Vanessa Grazziotin, que fez um relatório de caráter técnico, com o intuito de aprimorar a lei.

A intenção de Vanessa, ao agir dessa forma, foi acentuar o objetivo de contribuir com a formulação de novas leis, respeitar as apurações em curso por parte da Polícia Federal e, sobretudo, evitar desvirtuamento das atividades da CPI – já que um grupo de integrantes da comissão queria tratar especificamente da investigação da medida provisória, deixando de lado os outros investigados. “Acho correto querer investigar isso, mas teremos de abrir uma CPI sobre MPs no Senado e não mudar o foco das apurações da CPI do Carf, que tem outro objetivo”, chegou a reclamar o senador Humberto Costa (PT-PE).

Fraudes no Carf

A Operação Zelotes foi deflagrada em março do ano passado pela Polícia Federal para investigar esquema de fraudes que teriam sido cometidas pelo Carf, órgão ligado ao Ministério da Fazenda e responsável pela aplicação de multas e autuações a empresas por questões fiscais. Estimativas iniciais são de que as fraudes possam ter contribuído para a sonegação de recursos da ordem de R$ 20 bilhões.

Fazem parte da relação de investigados conglomerados empresariais como o grupo RBS (maior afiliada da Rede Globo), Gerdau, Votorantim, Ford, Mitsubishi, BRF (antiga Brasil Foods), Camargo Corrêa, os bancos Santander, Bradesco, Safra, BankBoston, Pactual, Brascan e Opportunity.

Durante as investigações, foi encontrado um e-mail mencionando um suposto acordo para aprovação da MP – que na verdade dizia respeito a medidas fiscais postas em prática desde a década de 1990, sempre aprovada por parlamentares de todos os partidos no Congresso. A partir daí, parte das investigações passou a caminhar no sentido de apurar um suposto envolvimento do filho do ex-presidente.

A medida provisória em questão oferece benefícios fiscais para a implementação de montadoras de automóveis nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste, e seu teor original teve como relator o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), ligado ao senador Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), o ACM, morto em 2007. A MP, com o número 471, foi aprovada em 2009 com objetivo de ampliar a vigência de incentivo fiscal a montadoras e fabricantes de veículos instalados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O incentivo, que seria extinto em 31 de dezembro de 2010, foi prorrogado até 31 de dezembro de 2015. Novas MPs destinadas a atender a demandas fiscais do setor foram editadas e aprovadas em 2010 e 2013.

Mesmo assim, a LFT, por ter contratos com escritório de Mauro Marcondes de consultoria na área de marketing esportivo, foi uma das poucas empresas a ter decretada ordem judicial de busca e apreensão de documentos. Em decisão adotada em novembro passado, a vice-presidente do TRF 1, desembargadora Neuza Alves, criticou a juíza de primeira instância que deu a ordem e disse que houve exagero na medida.

Ilação como base

Na ocasião, a desembargadora afirmou em seu voto que a busca e apreensão foram feitas, “não quanto à sua razoabilidade, mas apenas pelo fato de ter sido a ‘ilação’ o único fundamento apresentado para requerer a efetivação de uma devassa em empresas que, até então, não eram objeto de investigação”.

Informações reservadas de gabinetes do tribunal são de que três desembargadores do TRF 1 ficaram de se reunir até amanhã para avaliar os últimos atos do atual juiz da 10ª Vara, Vallisney de Souza, sobre a Zelotes.

Mauro Marcondes foi preso preventivamente na penitenciária da Papuda, em Brasília, por suspeita de envolvimento em fraudes. Ele e sua mulher são investigados por práticas de crimes de corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

De acordo o advogado Roberto Podval, a delação premiada foi proposta como forma de o lobista evitar que a esposa fosse transferida para uma unidade prisional. “É uma injustiça em todos os sentidos: pelo gesto, pelo caráter político e seletivo, pelo fato de a defesa de ambos não ter sido comunicada sobre a proposta de delação antecipadamente e, sobretudo, pelo fato de o casal ter uma filha de 14 anos que não tem com quem ficar”, ressaltou.

Nem o delegado Marlon Cajado nem a Procuradoria Regional da República da 1ª Região quiseram se posicionar sobre o assunto.

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