MP vai investigar livros distribuídos na Polícia Rodoviária Federal que recomendam leituras da Bíblia
Sob justificativa de “atenção integral à saúde dos policiais”, governo Bolsonaro produz material intitulado “Pão Diário – Segurança Pública”. Ministério Público aponta afronta à Constituição
Publicado 30/08/2022 - 14h51
São Paulo – O Ministério Público Federal (MPF) decidiu apurar a entrega de livros na Polícia Rodoviária Federal (PRF) com a recomendação de que os servidores leiam diariamente versículos da Bíblia. Na última sexta-feira (26), reportagem do canal Globonews mostrou que o governo de Jair Bolsonaro, sob a justificativa de atenção integral à saúde dos policiais, passou a distribuir o material religioso, intitulado “Pão Diário – Segurança Pública”.
A entrega dos livros. segundo a PRF e o Ministério da Justiça, faz parte de um “projeto da fé” do governo federal, que recomenda orações diárias. A orientação é que o material seja distribuído em todas as superintendências estaduais da corporação.
Porém, para parcela significativa dos policiais, a presença da religiosidade no ambiente de trabalho “se dá de forma injustificada” e pode ser entendida como uma “violação de liberdade religiosa”, uma vez que não são contempladas todas as religiões e exclui aqueles que não professam nenhuma fé.
Pedido de investigação
O entendimento de que a medida afronta à Constituição também é compartilhado pelo procurador Enrico Rodrigues de Freitas, da Procuradoria da República do Rio Grande do Sul, que decidiu apurar o caso. A decisão do MPF é baseada no artigo 19 que veda “à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; recusar fé aos documentos públicos; criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si”.
A investigação destaca que o Estado é laico. O que garante ao indivíduo a escolha de sua crença e o direito de não optar por algum credo ou religião. A abertura da investigação também veio acompanhada de série de pedidos de informações. Entre eles, Freitas solicitou uma manifestação oficial do diretor-geral da PRF. O procurador também questionou se há realização do disponibilização de espaços para realização de encontros religiosos nos espaços públicos da Polícia Rodoviária Federal e quais são as normas.
O MPF também quer detalhes do projeto, bem como informações sobre o procedimento administrativo para que outras religiões ou ordens religiosas possam apresentar e formalizar trabalho semelhante, no âmbito do Departamento da PRF. Segundo informações do portal g1, embora o caso tenha sido aberto no Rio Grande do Sul, eventuais decisões tomadas terão repercussão nacional.
Cruzada de Bolsonaro
A distribuição do material seria também mais uma estratégia de Bolsonaro, que é candidato à reeleição, de atrair votos do eleitorado evangélico. Em segundo nas pesquisas eleitorais, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o mandatário tem provocado uma “guerra santa” como estratégia eleitoral.
A Polícia Rodoviária Federal argumenta também que não registrou queixas na Ouvidoria sobre a distribuição dos livros. A corporação alega que servidores interessados em atividades de outras religiões devem apresentar um pedido para inclusão.