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Hardt de volta ao cargo: ‘Lavajatismo tem raízes profundas no judiciário’, diz desembargador

Para o desembargador do TJSP, Marcelo Semer, voto do ministro Luís Roberto Barroso contra o afastamento da juíza Gabriela Hardt, acusada de conduta irregular na Lava Jato, criou uma “disputa de poder” e reforça o apoio à operação

Luiz Silveira/Agência CNJ
Luiz Silveira/Agência CNJ
Sessão do CNJ mostra que o lavajatismo ainda tem raízes muito profundas no judiciário, apesar de tudo que foi descoberto e dos revezes na Justiça

São Paulo – O voto do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que nesta terça-feira (16) anulou a decisão do corregedor do CNJ, Luis Felipe Salomão, e reconduziu ao cargo a juíza Gabriela Hardt, expõe as raízes muito profundas do lavajatismo no Judiciário. A afirmação é do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Marcelo Semer.

“Ele (o lavajatismo) permanece forte. Haja vista que várias associações de juízes se manifestaram contra os afastamento. Você pode até imaginar ‘juiz tem que ser contra afastamento de juiz’. Mas é raro acontecer isso. Vários juízes são afastados de forma arbitrária e política. E voce não vê as associações se manifestando, juízes federais chegaram a insinuar uma paralisação. Então acho que isso (lavajatismo) está mantido. Já sabemos que o ministro Barroso tem essa posição. Ele nunca alterou e foi suporte jurídico e político da Lava Jato”, disse o desembargador em entrevista ao ICL Notícias transmitido pela TVT nesta quarta (17)

Nesta segunda-feira (15), o corregedor nacional de Justiça Luís Felipe Salomão determinou o afastamento da juíza Gabriela Hardt, além dos desembargadores Thompson Flores, Danilo Pereira Júnior e do juiz federal Loraci Flores de Lima, que atuam no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). No caso de Hardt, Salomão destacou, entre outras coisas, que a juíza endossou a criação de uma fundação da Lava Jato, financiada com recursos da Petrobras. E ainda admitiu ter discutido, previamente, por mensagens de WhatsApp, decisões com integrantes da extinta força-tarefa, entre eles, Deltan Dellagnol, antes de homologar o acordo entre Ministério Público Federal no Paraná e a Petrobras para criar uma fundação privada, que seria gerida pelos procuradores da Lava Jato.

Para o desembargador paulista, o ministro Luís Roberto Barroso criou uma “disputa de poder” ao votar contra o afastamento da magistrada e os desembargadores. Enquanto que o corregedor considerou violações “ao dever funcional de prudência, de separação dos poderes, e ao código de ética da magistratura” a conduta da juíza, Barroso a defendeu. E classificou o afastamento dos juízes como uma decisão “ilegítima, arbitrária e desnecessária” e votou contra a decisão do corregedor. Com isso, a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra a juíza e o senador Sergio Moro (União-PR), que também é investigado por sua atuação como juiz, fica adiada.

Disputa de poder

Semer chamou atenção para um detalhe que passou despercebido na sessão: o presidente do CNJ, Barroso, ter se antecipado e ser o primeiro a votar após a manifestação do corregedor. Algo inusitado, de acordo com o desembargador do TJSP. O que mostra que Barroso, segundo ele, “levou a questão para uma disputa de poder que, ao meu ver, é equivocada. E foi inusitada porque o presidente sempre vota no final, seja no Supremo (Tribunal Federal) ou no CNJ, até para que não exerça pressão sobre os demais (ministros)”, observou Semer.

“Mas ele não só tomou a palavra, como a tomou para espinafrar o voto, a decisão, do corregedor pelo afastamento. Ou seja, me pareceu uma especie de líder de bancada: ‘estou dizendo como a gente deve agir’. (…) Eu me surpreendi muito com isso porque não é praxe. Na verdade, o que aconteceu, digamos assim, foi uma luta de poder entre o corregedor e o presidente. Foi isso que vimos. E eu diria que o presidente Barroso não saiu muito vencedor da luta, pelo contrário”, acrescentou o desembargador.

Esse revés ao presidente do CNJ, segundo o desembargador, se deve ao fato da maioria formada para condenar os desembargadores Carlos Eduardo Thompson Lenz e Loraci Flores de Lima. O afastamento de Hardt e de Danilo acabou sendo derrubado por 8 votos a 7, em que a posição de Barroso foi fundamental para o veredito final. Mas, no caso de Lenz e Lima, a maioria dos conselheiros concordou com as denúncias apresentadas.

Lavajatismo permanece entranhado

Os desembargadores são acusados por suposto descumprimento de ordens do STF. Em maio do ano passado, quando estavam na 8ª Turma do TRF-4, os magistrados afastaram o juiz Eduardo Appio dos processos da Lava Jato. Appio foi considerado suspeito após ter feito uma ligação intimidatória para o filho do desembargador Marcelo Malucelli. Para Salomão, Lenz e Lima demonstraram “desrespeito obstinado” às ordens do STF.

O desembargador do TJSP avalia que a manutenção do afastamento dos membros do TRF-4 só foi possível por conta de uma “relação temporal mais próxima”. Enquanto que, no caso da juíza, os conselheiros do CNJ alegaram, uma falta de contemporaneidade em suas decisões. “Eles (Lenz e Lima) tomaram muito recentemente decisões tangenciando o Supremo. Acho que isso convenceu os conselheiros. A relacao deles era mais evidente e a participação de Gabriela Hardt talvez seja mais grave, mas um pouco mais distante no tempo. Eu penso que essa pode ser uma questão que diferenciou a conduta dos dois grupos”, explicou.

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Confira a entrevista: