Lawfare

Documentário investiga ‘operação siamesa’ da Lava Jato do Judiciário na Paraíba

“Justiça contaminada: o teatro do lavajatismo na Paraíba” sustenta que processo contra o então governador seguiu os mesmos passos errados

Wilson Dias/Agência Brasil
Wilson Dias/Agência Brasil
Governador por dois mandatos e principal alvo da operação, Ricardo Coutinho lamenta uso do processo judicial como forma de perseguição política

São Paulo – Documentário lançado ontem (4) à noite procura mostrar como a Operação Lava Jato pode ter “contaminado” o sistema judiciário brasileiro, a partir da investigação sobre caso ocorrido recentemente na Paraíba. O primeiro episódio sobre a chamada Operação Calvário foi lançado com transmissão pela TV Conjur, com a presença do próprio ex-governador Ricardo Coutinho, principal alvo da operação deflagrada pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Justiça. Candidato pelo PSB, ele governou a Paraíba por dois mandatos, eleito em 2010 (53,7% dos votos) e reeleito em 2014 (52,6%)

“Responsáveis pela Calvário na Paraíba, o promotor Octávio Paulo Neto, do Ministério Público, e o desembargador Ricardo Vital, do Tribunal de Justiça, eram chamados pela imprensa local como ‘Moro e Dallagnol da Paraíba’, em referência ao ex-juiz Sergio Moro e ao ex-procurador Deltan Dallagnol, que comandaram a Lava Jato”, afirmam os organizadores do lançamento. O enredo seria semelhante: divulgação de notícias sem checagem de dados e o uso de um motivo justo, o combate à corrupção, como justificativa para abusos.

Destruição da imagem

Na live, Ricardo Coutinho apontou como primeiro problema a “dificuldade enorme de acesso às supostas provas” e a busca constante de destruição da imagem. “Não é só a institucionalidade, a mídia não lhe dá um único minuto para você responder, esclarecer. Até hoje, três anos depois, eu nunca fui ouvido. Esse processo todo é uma violência do Estado”, afirma o ex-governador, citando a imprensa e seu “papel fundamental de destruidor” no processo.

Assim, depois de sofrer inclusive ameaça de morte, como informou, ele acredita que foi perseguido por ter se posicionado contra o impeachment e a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – ou, como ele diz, os “golpes” de 2016 e 2018. “Eu era governador e tive posição, e teria de novo”, acrescenta Coutinho, lembrando que sua crítica não é dirigida à instituição MP, mas a alguns promotores. “Os juízes sabem que não há materialidade, não há provas.” Ele propôs a realização de um debate sobre esse e outros casos para aprimoramento do Judiciário.

Delator com regalias

A operação foi desencadeada no final de 2019, quase um ano depois de Coutinho deixar o governo estadual. Ele chegou a ser preso, sob acusação de liderar uma organização criminosa que teria desviado dinheiro público especialmente na área da saúde, por meio de contratos com a Cruz Vermelha. “O principal delator da Calvário – Daniel Gomes da Silva – contou com regalias para acusar Ricardo Coutinho e seu grupo político”, afirmam os autores. “O delator usava um notebook na cela da Penitenciária da Papuda, em Brasília, para transcrever conversas que foram utilizadas para sustentar prisões, buscas e apreensões e as acusações feitas pelo Ministério Público na investida que perseguiu a família e pessoas ligadas politicamente ao ex-governador.” Daniel era representante da Cruz Vermelha.

Justiça Contaminada – O Teatro Lavajatista da Operação Calvário na Paraíba é o nome do documentário, que será exibido em nove episódios. O trabalho resulta de apuração feita pelos jornalistas Camilo Toscano e Eduardo Reina, que, a partir da leitura de 10 mil páginas do processo e várias entrevistas, identificaram similaridades entre as operações curitibana e paraibana. Dessa forma, além de apontar semelhanças e irregularidades, a investigação busca mostrar o fenômeno conhecido como lawfare, ou “o uso das investigações de corrupção como arma de destruição no campo político”.

Convidado para o debate de lançamento no primeiro episódio, o professor de Direito Constitucional Agassiz Almeida Filho, da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), apontou “problema metodológico” na forma de investigar. Crítico do “lavajatismo”, ele afirma que o método correto consiste em seguir o devido processo legal, mas a partir da Lava Jato houve certo “acirramento da tendência de subversão” do Estado de direito. O jurista sugeriu uma reforma legislativa “séria, que venha a colocar limites a esse tipo de atuação, mas que também tente tornar o processo penal mais objetivo”. Segundo ele, é preciso ainda “que haja uma cultura de democracia, de respeito aos direitos fundamentais”.

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