Com fortalecimento do PMDB, PT tenta segurar a base para 2014

Estratégia agora, dizem deputados, é retomar equilíbrio de forças e estancar a disputa política que se abre entre aliados, principalmente no PSB e em setores do PDT

Para o petista Henrique Fontana, aliança com PMDB tem de ser vista “à luz da conjuntura política real” (Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr)

Brasília – Desde o início da “Era PT” no governo federal, há uma década, o PMDB nunca esteve tão forte. Com as vitórias de Renan Calheiros para a presidência do Senado e de Henrique Eduardo Alves para a Câmara, o partido comanda desde ontem (4) as duas casas do Congresso Nacional, posição que o consolida como o mais musculoso aliado de Dilma Rousseff e do PT no plano institucional, seja para garantir a governabilidade nos próximos dois anos ou para montar novamente um arco de apoios que permita a reeleição da presidenta em 2014.

Mas, a força atual do PMDB, que já tem em Michel Temer o vice-presidente da República, não seria injusta ou desproporcional em relação aos demais partidos da base? A presença de figuras com históricos tão distantes do ideário do PT no comando de Câmara e Senado não atrapalharia o governo petista mais do que ajudaria? A predominância do PMDB não poderia acabar jogando aliados históricos – como o PSB de Eduardo Campos – no colo da oposição?

Para o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), o pacto de governabilidade costurado com o PMDB independe dos nomes escolhidos para representar o partido nas presidências da Câmara e do Senado. Ele cita alguns temas caros ao governo, que somente avançarão no Congresso com o apoio do PMDB: “A reforma política vai se sustentar ou não? O novo Código Penal vai sair ou não? Enfim, são vários pontos de interesse do governo e da sociedade e é importante que o PT trabalhe em sintonia com os presidentes das duas casas”, diz.

Chinaglia, que presidiu a Câmara durante o governo Lula, acrescenta outros pontos à pauta que virá depois de desatados os nós do Orçamento da União e da análise dos vetos presidenciais, incluindo a divisão dos royalties do petróleo. 

“O governo vai continuar defendendo os temas sociais que têm caracterizado a gestão da presidenta Dilma. Há também os temas econômicos. Haverá, por exemplo, um grande esforço para a unificação do ICMS, e isso depende de uma grande articulação, não só com as Mesas Diretoras de Câmara e Senado, mas também com todos os partidos”.

Na opinião do vice-líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), a aliança com o PMDB “tem que ser sempre questionada e estudada à luz da conjuntura política real”. O deputado pede ainda “um justo equilíbrio” na base aliada: “No sistema político brasileiro de hoje, eu considero que é muito importante que tanto o PMDB quanto partidos como o PSB, o PDT e o PCdoB estejam apoiando a reeleição da presidenta Dilma. Não estou abrindo mão de outros aliados que o PT também considera importantes, mas cito esses três pela sua tradição e força na política brasileira”.

Campos na vice?

Henrique Fontana diz que é preciso evitar um fortalecimento excessivo do PMDB: “Nunca é fácil tomar a decisão sobre a resposta correta que o PT deva dar na condução dessa política de alianças. Mas o escopo estratégico demanda que o PMDB não se torne um partido com uma força desproporcional a este outro grupo de partidos. Precisamos ter equilíbrio, e este equilíbrio, em uma república federativa como o Brasil, pode ser dado, por exemplo, pela indicações para funções estratégicas, como é o caso de uma vice-presidência da República, ou na formação de palanques para os governos estaduais onde cada um desses partidos tenha candidatos com maior viabilidade e perspectiva de futuro”.

O deputado petista não descarta uma troca na chapa de Dilma em 2014: “Eu não penso jamais em um cenário eleitoral para 2014 com o governador Eduardo Campos sendo candidato a presidente da República. Entendo que precisamos, de maneira franca, direta e respeitosa, e reconhecendo a grande qualidade política que tem o Eduardo e a importância do PSB, apresentar propostas na mesa de negociação que garantam a nossa aliança”, diz.

Fontana questiona: “Será o Eduardo Campos o candidato a vice-presidente em 2014 ou será Michel Temer? Vai prosperar a ideia de ter o Eduardo como vice da Dilma e, em troca disso, o PMDB ter o fortalecimento de alguns projetos regionais? Tudo isso tem que ser falado com franqueza. Nós, que somos dirigentes do PT, não podemos pré-definir isso agora”, diz, antes de fazer um alerta: “Tem muita gente interessada tanto em uma ruptura do PT com o PSB e o grupo em torno do governador Eduardo Campos quanto em uma ruptura do PT com o PMDB. Para nós, não interessa essa ruptura. Se esses setores romperem hoje, amanhã o candidato do PSDB à Presidência estará de braços abertos para eles”.

Respeito ao acordo

O deputado e ex-ministro Nilmário Miranda (PT-MG) lembra que a boa política se faz também com o respeito a acordos claros e públicos, como, segundo ele, foi o acordo entre PT e PMDB sobre a alternância na presidência da Câmara. 

“A eleição do PMDB no Senado é indiscutível, pois tem lá a maior bancada e o direito de indicar o presidente. Já aqui na Câmara houve um acordo, pois na verdade a maior bancada é a do PT, agora com 89 deputados, enquanto o PMDB tem 76. Mas, quando da eleição do Marco Maia (PT-RS) para presidência da casa em 2011, que foi muito importante para o PT, houve esse acordo, e agora ele tem que ser honrado. Temos que confiar também nas negociações feitas com o PMDB e o Henrique Eduardo Alves como, por exemplo, o compromisso de votar a reforma política”, diz.

Sobre a formação da chapa de Dilma para 2014, Nilmário avalia que ainda há tempo para definições ao longo deste ano: “Creio que o debate político, com a produção e o confronto de ideias em 2013, será fundamental para a definição das eleições de 2014. Eleição é legado, somado à esperança. Se a sociedade vai querer a reeleição da presidenta Dilma, se vê em sua reeleição um avanço para o país como um todo, isso terá de ser construído em 2013”, diz. 

Para o deputado João Paulo Lima e Silva (PT-PE), também é hora de dar um crédito de confiança ao PMDB e reconhecer a ajuda do partido para a governabilidade do país: “Posso até discordar de muitas coisas, mas considero que o PMDB hoje é um partido muito importante para garantir a governabilidade de Dilma. Foi por essa razão que votamos fechados com a chapa do acordo feito pelo PT, entendendo que o PMDB tem um importante papel a cumprir ainda na história do Brasil”, diz.

João Paulo, que é ex-prefeito de Recife, diz que o governo não deverá encontrar maiores dificuldades com Alves e Renan, apesar dos históricos dos dois novos presidentes da Câmara e do Senado: “O acordo com o PMDB foi feito em 2011 para garantir a sustentação do governo Dilma. Pode até ser que o governo venha a encontrar dificuldades, mas, antes de tudo, foi uma opção política e o PT confia naqueles que fizeram o acordo”.

Construir a relação

A harmonia entre o governo e os partidos de esquerda que compõem a base de Dilma no Congresso, entretanto, terá de ser construída a cada dia desta segunda etapa da legislatura. Embora não tivesse contado com o apoio de Eduardo Campos, a candidatura do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) à presidência da Câmara se construiu sobre um discurso fortemente crítico ao governo.

Ao citar pela única vez a presidenta em seu discurso logo antes da votação, Delgado fez cobranças relativas ao Orçamento: “As emendas ao Orçamento são um direito nosso e um dever do Executivo pagar. Se não fosse para legitimá-las aqui no parlamento, não precisaria que a peça orçamentária fosse aqui votada. Precisamos fazer com que as emendas orçamentárias sejam, acima de tudo, aquilo que chega aos municípios. Um pouco mais do que os municípios têm hoje, além dos parcos recursos do Fundo de Participação. Nossa presidenta tem dito que não quer fazer o ‘toma lá dá cá’ com o Congresso, e nem nós aqui queremos o ‘toma lá dá cá’”, disse.

No conflagrado PDT, as opiniões estão dividas. O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), presidente da Força Sindical, critica a relação de Dilma com o partido no Congresso: “Estamos preocupados com várias questões. Temos o Orçamento com o aumento dos aposentados que a Dilma não aceitou. Temos a Medida Provisória 595, na qual o governo praticamente privatiza todos os portos e os entrega à iniciativa privada, o que vai gerar certamente muitos problemas para os trabalhadores”, enumera.

Paulinho é da opinião de que o PDT não deveria apoiar Dilma em 2014. Na avaliação dele, a aliança só se manterá o candidato for o ex-presidente Lula. “Se o Lula voltar, contará com nosso apoio. Se não voltar, a Dilma não contará”, decreta.

Já o deputado e ex-ministro Miro Teixeira (PDT-RJ) prega o apoio à Dilma e lembra que o partido faz parte do ministério escolhido pela presidenta, onde ocupa a importante pasta do Trabalho: “O PDT passa por um processo de reconstrução de sua identidade e certamente terá candidato próprio à Presidência da República em um futuro próximo. Mas, agora fazermos parte do projeto de governo popular da presidente Dilma e estaremos ao seu lado em 2014”, diz Miro, que, ao lado do atual ministro do Trabalho, Brizola Neto, lidera uma tentativa de tomar o controle do PDT de seu atual presidente, o ex-ministro Carlos Lupi.

Após sua vitória na Câmara, Henrique Alves, fez diversos elogios à gestão de Marco Maia e disse “sentir muito orgulho do apoio do PT”. O deputado prometeu diálogo com o governo e respeito aos demais partidos que compõem a base aliada: “Olhem que imensa responsabilidade, que orgulho, que honra, que emoção representar aqui de maneira clara esses partidos num debate democrático. Suas bancadas e seus líderes são testemunhas. Eu fui às bancadas, discuti com elas e recebi apoio e a solidariedade. O mesmo acontecerá durante os próximos dois anos”, disse.