golpe em marcha

Ciro Gomes diz que eleições gerais são ‘acinte’ que explora a angústia do povo

Em debate na PUC-SP, ex-ministro afirma que projeto para este ano é inviável e que o pais precisa de reforma tributária progressista para poder retomar o nível dos investimentos na economia

Reprodução

Gomes: nível de poupança doméstica para investimentos deve surgir de nova estrutura tributária

São Paulo – O ex-ministro Ciro Gomes disse ontem (28) à noite, em debate na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo sobre a crise política e econômica do país, que a proposta de eleições gerais para este ano, como tem defendido a ex-senadora Marina Silva, é inviável. Em tom irônico, Gomes chamou a ideia de “marinismo” e afirmou que “para ter uma eleição geral agora, se não houver um golpe, ou uma ruptura, só tem um jeito: propor uma emenda à Constituição”.

Ele lembrou que para ser aprovada, “a emenda tem de passar em três quintos da Câmara, que é propriedade privada do Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e depois de passar por três quintos em duas sessões, tem de passar por três quintos em duas sessões no Senado presidido pelo Renan Calheiros”. Segundo o ex-ministro, isso desconstituiria o mandato de 27 governadores, além dos deputados. “Isso não passa nunca no Brasil. É um acinte a gente pôr em discussão, explorando a angústia do nosso povo com a situação de golpe que nós estamos vivenciando”. Para o ex-ministro, jamais os parlamentares vão se dispor a mudar a institucionalidade que os elegeu.

O senador falou para os estudantes em debate organizado pelos alunos de Economia e Administração e foi acompanhado por cerca de 500 pessoas na transmissão on-line realizada pela TV da PUC. Gomes fez uma análise da situação do país, em que considerou aspectos conjunturais e estruturais da crise. “No Brasil nós temos dois tipos de problemas que acabam um agravando a percepção e tentativa de abordagem do outro. Uma coisa é a questão da conjuntura e outra da estrutura no Brasil”.

Sobre a primeira questão, ele afirmou que falta mais coordenação estratégica ao governo. “Essa coordenação no Brasil nós perdemos, mas já a tivemos no passado. Quando acabou a Segunda Guerra Mundial, o Brasil era um país rural, 82% da população moravam no campo. E nós não tínhamos indústria de nada. O rudimento de indústria que o país tinha era uma indústria têxtil de baixo valor agregado e a nossa economia era assentada na monocultura do café e do açúcar”, disse. “E é nesse cenário que o Brasil faz uma coesão e monta um projeto inspirado em um conjunto de ideias da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), que se convencionou chamar de nacional desenvolvimentismo.”

Segundo Gomes, hoje esse modelo não é mais viável, não é reprodutível, “mas uma determinada ferramentaria dele tem de ser limpa e trazida de volta para um arranjo inteligente de economia política e de um projeto para o país”. Ele lembrou que com esse projeto o Brasil “saiu do nada e virou a 15ª economia industrial do planeta em três décadas. Há o fenômeno chinês, os Tigres Asiáticos, mas o maior experimento de sofisticação, profundidade e velocidade em desenvolvimento industrial do mundo capitalista é o brasileiro”.

Já sob o ponto de vista da estrutura econômica do país, o ex-ministro afirmou que é preciso retomar investimentos por meio de mecanismos que fortaleçam a formação bruta de capital – um alto nível de poupança doméstica que permita a retomada dos investimentos. “A reforma estrutural que o país precisa celebrar de forma inadiável parece ser premissa do desenvolvimento. Parece ser inviável o êxito civilizatório se por trás dele não se encontre um alto nível de formação bruta de capital”.

Na China, esse indicador da poupança doméstica, que tem a ver com a diferença entre o que é produzido e o que é gasto, fica perto de 43% do Produto Interno Bruto (PIB). A Coreia do Sul também está na faixa de 40%. Mesmo a Europa, que tem uma estrutura consolidada, e onde não há muita margem para mais produtividade, esse indicador fica na faixa de 30% do PIB. “No Brasil, nós estamos ancorados em 14%, 15% do PIB historicamente. Não por acaso, com Lula vai a 17% e a gente sente um certo conforto, mas com a Dilma já caiu a 14% de novo e nós estamos sentindo o peso”.

Para ampliar os investimentos e crescer o potencial da economia do país, Gomes considera essencial uma reforma tributária, que combata o caráter regressivo dos impostos que oneram a base da sociedade por meio de tributos sobre o consumo. “No caso brasileiro, está flagrante na minha opinião o que precisamos fazer. Nós precisamos consertar a equação de financiamento do Estado brasileiro pelo ângulo da receita e da despesa”, disse. “Não é razoável que os lucros e dividendos do país não sejam tributados. Um dos tributos progressivos é sobre heranças e doações; o que existe de 4% não é nada, é preciso um imposto progressivo nessa área.”

Leia também

Últimas notícias