Mais do mesmo

Teto de gastos e reforma trabalhista criaram ‘armadilha’ a favor da reforma da Previdência

Nesta terça, ministro da Economia, Paulo Guedes, volta à Câmara para defender PEC 06/2019, argumentando que o sistema público está quebrado

José Cruz /abr
José Cruz /abr
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, reiterou que o país está entrando em colapso fiscal e previdenciário

São Paulo – Nesta terça-feira (4), o ministro da Economia, Paulo Guedes, deve comparecer à Comissão de Finanças e Tributação para falar mais uma vez sobre a Reforma da Previdência. Ele foi convocado a partir de requerimento do deputado Enio Verri (PT-PR). Sua fala deve girar em torno do argumento de que a aprovação da PEC 06/2019 é essencial ao país porque o sistema público está condenado, segundo ele e o governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), neste domingo (3), voltou a falar em “colapso”, ao comentar a conjuntura e a reforma em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. “Já estamos num colapso fiscal, num colapso previdenciário”, disse . Ele defende a reforma e prevê que ela será aprovada “com certeza”. Em 14 de maio, a investidores em Nova York, Maia já havia usado o termo ao comentar que a estagnação econômica, junto com o teto de gastos, poderia levar o Brasil ao “colapso social”.

Para Maia, a PEC 06/2019 será aprovada até o final do primeiro semestre. Já o analista do Departamento Intersindical  de Assessoria Parlamentar (Diap) Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho, considera esse prazo impraticável. No entanto, ele acredita que as políticas desenvolvidas a partir do governo Michel Temer se transformaram em “uma armadilha para forçar a reforma”.

A armadilha consiste no seguinte: com a reforma trabalhista, que desestimula o emprego formal, cria a terceirização, a “pejotização” e a precarização do sistema no mercado de trabalho, as receitas que sustentam as despesas da Previdência e da Seguridade são drasticamente reduzidas.  Por outro lado, o congelamento dos gastos públicos por meio de Emenda Constitucional 95 (que estabelece o teto de gastos) faz com que o orçamento não seja suficiente, a longo prazo, para bancar as obrigações que o Estado tinha antes das novas regras.

Além dessas enormes limitações, as novas aposentadorias e novos benefícios continuam se somando aos antigos. “Como não tem dinheiro suficiente alocado nessa rubrica específica, então o governo corta de outras: da mobilidade, do esporte, do Minha Casa Minha Vida, do PAC e de investimentos de modo geral, e, eventualmente, quando chegar o momento, da educação e da saúde. A população não entende que a responsabilidade é da reforma trabalhista e do congelamento de gastos, porque vende-se a ideia de que a Previdência é responsável pelos problemas do orçamento”, diz Queiroz.

Segundo esse raciocínio, os setores que perdem dinheiro e investimento vão pressionar pela aprovação da reforma, seguindo o discurso – que vem sendo construído pelo mercado e pelo governo – de que a Previdência é a culpada pelo “colapso”.

Com a pressão do mercado, a tendência é a reforma ser aprovada, mas com modificações (em relação ao projeto do governo) que vão depender basicamente da pressão popular, avalia Queiroz. “O que vai variar é o escopo da reforma. Não acredito que vai ser tão abrangente como a enviada ao Legislativo. Também não tem a menor chance de aprovar a PEC conclusivamente no primeiro semestre.”

Em reuniões de comissões, no plenário e nos corredores da Câmara dos Deputados, parlamentares do Centrão têm dito que não têm como justificar às suas bases o apoio à PEC. Além disso, a desarticulação política de Jair Bolsonaro no parlamento continua notória.

É nessa conjuntura que a previsão, segundo Queiroz, é de que a reforma passe com ressalvas. O Benefício de Prestação Continuada, a capitalização, a aposentadoria rural e das mulheres serão temas de negociações e serão modificados ouy retirados do texto.

Para Toninho, parcela importante dos deputados teme um ônus grande do ponto de vista de sua imagem junto aos eleitores. Eles tentarão reduzir esse impacto. “Muitos deles são a favor, mas com alterações nesses pontos. Eles votariam a favor do projeto global, ressalvados esses aspectos.”

O governo continua fragilizado, porque não tem articulação política, mas o Congresso é liberal e fiscalista, e está de acordo com a reforma, embora não com a abrangência do texto original. “E, a pedido do mercado, esses deputados vão tentar não ser responsabilizados pela rejeição ao projeto.”