Câmara dos Deputados

Deputados denunciam ‘golpe’ de Cunha para votar financiamento privado, já derrotado

Presidente da Casa recua em acordo, ratificado ao microfone na sessão de ontem, que rejeitou dinheiro de empresas em campanhas. E diz que texto do relator, ontem 'prejudicado', agora será apreciado

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Jean Wyllys (Psol-RJ), Júlio Delgado (PSB-MG) e Paulo Teixeira (PT-SP) disparam contra manobras de Cunha

Brasília e São Paulo – Inconformado com a derrota do financiamento privado a campanhas e candidatos na votação da noite de ontem, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), articula hoje um “golpe” para tentar fazer passar de qualquer maneira o dinheiro das empresas nas eleições. O termo golpe é abertamente utilizado pela bancada do PT.  “Achamos que (a intenção de Cunha de colocar o tema em votação novamente) caracteriza um golpe”, diz o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

Nas discussões que culminaram com a derrota do financiamento privado, em resposta a uma questão do deputado Domingos Neto (Pros-CE) sobre o texto do relator da reforma política (Rodrigo Maia, DEM-RJ), Eduardo Cunha respondeu: “O texto do Relator, foi destacada essa emenda (que foi votada) em preferência à do relator, com o apoio do relator. Não haverá mais a votação do texto do relator. Este é o que está sendo votado”, disse o presidente da Câmara, acrescentando: “Não haverá (a votação do texto do relator)… Eu sei que, regimentalmente, vossa excelência pode dizer que, ao fim, restaria o texto do relator. Mas nós temos acordo político. Vai ser considerado prejudicado”.

Hoje mudou. Cunha disse que o texto rejeitado ontem previa o financiamento privado a partidos e candidatos, e que o texto que agora irá à votação é “mais restritivo” e só prevê financiamento empresarial só por pessoa física. Diz Eduardo Cunha em resposta a uma jornalista: “Veja bem. O que acontece? Nós votamos ontem um destaque de preferência em substituição ao financiamento de pessoa física e jurídica que estava extensivo, além de partidos, a candidatos. Vamos seguir a ordem de votação. Nosso acordo foi votar primeiro esse financiamento público e privado para pessoa jurídica; segundo, financiamento privado por pessoa física; terceiro, financiamento público. Só que nesse caso, como houve um destaque, resta o texto original que é mais restritivo e só ao partido. Ele terá que ser votado”, afirmou.

O deputado Jean Wyllys (Psol-RJ) alertou em seu perfil numa rede social: “Cunha e seus asseclas, derrotados na sua intenção de inscrever na Constituição a prática do financiamento de empresas às campanhas políticas, ainda não se deram por vencidos. Os rumores que correm pela Casa são de que provavelmente irão quebrar o acordo de líderes e colocar uma nova matéria em votação, ainda hoje, com uma sutil diferença: permitir a doação destas empresas aos partidos – e não mais diretamente às campanhas –, o que, na prática, é basicamente a mesma coisa”.

Críticas duras vieram também de Júlio Delgado (PSB-MG): “Um líder se impõe quando se coloca pelo respeito mesmo às posições divergentes. Quando essa liderança é transformada na coação, na chantagem e na ameaça, esse líder deixa de ser um líder para ser um déspota, que tenta impor aos seus vassalos sob medidas de coação”, afirmou Delgado, em referência à forma autoritária e impositiva com que o presidente da Câmara conduz as votações.

Reuniões

Durante esta tarde, o presidente da Câmara está articulando uma possível reversão de votos contrários ao financiamento privado. Se Cunha conseguir sucesso em sua estratégia, o imbróglio tem potencial para ir parar no Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo Paulo Teixeira, “não dá para voltar atrás de uma decisão tomada. Não tem como recuar. Vai ter um embate hoje à noite. Não se pode prever se Cunha vai conseguir concretizar esse golpe”.  Para o petista, “o problema não é ele reverter os votos ou não, é que já está votado. É um fato consumado. Não tem volta”.

“Está havendo quebra de acordo e não podemos votar uma matéria vencida. Temos que seguir com a apreciação dos próximos pontos”, afirmou o líder do PT na Casa, Sibá Machado (AC).

Muitas reuniões aconteceram durante o dia entre Bruno Araújo (líder das minorias, PSDB-PE), juntamente com o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), e o próprio Cunha. Segundo Araújo, acordos feitos com várias bancadas são revistos e há mobilização – no caso, os blocos do PMDB e dos partidos das minorias – para aprovar a emenda do financiamento privado. “Muitos deputados disseram que votaram contra porque a emenda autorizava a doação de pessoa física. Hoje o ambiente é outro”, afirmou.

Já Eduardo Cunha deixou claro que a reunião teve o intuito de fazer com que ele e os dois líderes “tomassem pulso do que está acontecendo para ver o curso das bancadas e fazer esforço para alguma coisa ser salva”.

A votação programada para esta noite “será muito demorada”, como prevê Cunha. “Então teremos que votar esses dois, o original, e ressalvado o destaque. Então terá no mínimo mais quatro votações de financiamento. Isso se não tiver nenhuma outra emenda aglutinativa que tenha textos diferenciados que possam aparecer.”