Alarmismos

Invasão russa à Ucrânia é ‘improvável’, diz Reginaldo Nasser. Países sinalizam negociação

Para o professor da PUC-SP, apesar da tensão e da posição firme da Rússia para que a Ucrânia não ingresse na Otan, países e mídia ocidental “exageram”

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"Se a Ucrânia realmente não fizer parte da Otan o problema deixou de existir", garante o professor

São Paulo – Professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Reginaldo Nasser confirma as observações de analistas militares e afirma ser “improvável” uma invasão russa à Ucrânia. Em entrevista a Rodrigo Gomes, do Jornal Brasil Atual, o internacionalista destaca que a negociação para a paz está colocada desde sempre. E que a possibilidade de um conflito ser deflagrado é “quase impossível”. 

O governo da Rússia anunciou na manhã desta terça-feira (15) a retirada de parte de suas tropas na fronteira com a Ucrânia. A informação foi confirmada pelo Ministério da Defesa às agência de notícias russas, mas não especifica quantos soldados estão envolvidos na volta às suas bases. O recuo no cerco militar à Ucrânia marcou também às vésperas da data anunciada por serviços de inteligência dos Estados Unidos que davam como certa a invasão nesta quarta (16). 

Ainda ontem, a televisão russa também exigiu trechos de reuniões do presidente russo, Vladimir Putin, sinalizando uma negociação para a paz. Dois ministros do governo também divulgaram declarações no mesmo sentido. De acordo com Nasser, para a Rússia a resolução é muito simples. “Ela não quer que a Ucrânia faça parte da Otan, esse é o ponto”, destaca. Desde o fim da União Soviética, vários países do Leste Europeu, no entorno da Rússia, são incorporados como membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte, criado em 1949, no início da Guerra Fria, sob a liderança dos Estados Unidos. “O que traz problemas porque é como se a frente de ação militar norte-americana estivesse na porta da Rússia”, explica o professor.

O que buscam as partes

Essa aproximação já levou a conflitos como a guerra no leste da Ucrânia, na região de Donbass, desde 2014, onde já morreram 14 mil pessoas. O problema voltou novamente à tona em novembro, quando Putin concentrou cerca de 130 mil soldados em torno do país vizinho, buscando estabelecer os Acordos de Minsk, de 2015, para, entre vários pontos, conferir autonomia à região de Donbass, cuja maioria da população é etnicamente da Rússia e vinculada ao país. 

“E esse é o acordo que eles (russos) querem cumprir, nada mais além disso”, analisa Nasser. Segundo o internacionalista, o novo chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, vem tendo um papel crucial para diminuir as tensões. “Hoje a Rússia retirou uma parte das frotas da fronteira e o próprio chanceler alemão disse com todas as letras que não há a mínima cogitação da Ucrânia fazer parte da Otan. Ao mesmo advertiu que (a comunidade europeia) não admitirá uma invasão da Rússia. E aí é uma retórica porque se a Ucrânia realmente não fizer parte da Otan o problema deixou de existir”, garante ele. 

Bolsonaro passa despercebido

Apesar da possibilidade de trégua, Nasser aponta que alguns setores ainda insitem em um discuso alarmista. Para o professor, a Inglaterra, a mídia ocidental e, principalmente os Estados Unidos, exageram no clima beligerante. Enquanto em paralelo, bolsonaristas tentam atribuir o recuo russo à visita do presidente Jair Bolsonaro. Ainda hoje, o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, divulgou uma montagem que vinculava à CNN a informação de que o presidente Jair Bolsonaro evitou “a 3ª Guerra Mundial”. A montagem mentirosa foi desmentida pela emissora, mas vem sendo usada por bolsonaristas, embora a decisão de retirada das tropas tenha ocorrido antes do presidente brasileiro pousar em solo russo. 

Nasser mostra, contudo, que o Brasil, sob a liderança de Bolsonaro, “passar despercebido” no cenário internacional. “A mídia local mal menciona. Tanto na Rússia, como na Ucrânia, as pessoas mal sabem quem é Bolsonaro”. “A questão da Ucrânia é briga de gente grande, está entre as grandes questões internacionais, coisa de grande potência e o Brasil não conta nisso. Até houve um momento que o Brasil contou quando o presidente Lula e o presidente Erdogan (Túrquia) entraram para negociar com o Irã sobre a questão nuclear. Foi um dos vários momentos de apogeu”, conclui o professor. 

Confira a entrevista

Redação: Clara Assunção