mistério

Políticos e analistas tentam decifrar primazia de Alckmin nas urnas paulistas

Blindagem midiática, oposição fraca, sintonia com eleitorado, domínio parlamentar e influência sobre prefeitos podem ter levado tucano ao terceiro mandato como governador

Reginaldo Castro/Folhapress

‘Falta d’água ainda não se transformou em problema para maioria dos paulistas’, diz analista

São Paulo – Blindagem midiática, domínio da Assembleia Legislativa, oposição fraca, sintonia com o eleitorado, influência sobre prefeitos do interior e imagem de homem ético e trabalhador podem ser algumas das razões que levaram os paulistas a concederem hoje (5) mais um mandato ao governador tucano Geraldo Alckmin, que acaba de vencer o terceiro pleito e agora assumirá o Palácio dos Bandeirantes pela quarta vez. Os motivos foram elencados por analistas e políticos de PT, PSDB e Psol ouvidos pela RBA.

O professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, Wagner Iglecias, avalia que o governador possui grande capacidade de diálogo com o eleitor paulista. “Embora berço do sindicalismo independente dos anos 1970 e da criação do PT, São Paulo é um estado de perfil político conservador”, pontua. “O estado criou e deu projeção nacional a figuras de direita, como Jânio Quadros, Paulo Maluf e Orestes Quércia. Alckmin é mais um nome na linhagem de políticos pautados por lemas como ordem, austeridade e segurança.”

Por isso, Aldo Fornazieri, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política (Fesp), lembra que o estilo do tucano costuma ser bem visto por aqui. “Alckmin enfrentou com dureza a greve dos metroviários, em junho, e saiu vitorioso. Percebeu que as manifestações vinham perdendo apoio popular, adotou linha dura contra os black blocs e caiu no gosto da população”, enumera, citando episódios recentes. “Quando percebe que há desordem, o eleitor tende a posições mais conservadoras. O governador se conecta com essa visão.”

Seguindo essa mesma lógica, Fornazieri considera que, ao menos por enquanto, Alckmin também tem manobrado com desenvoltura a crise de escassez de água no estado de São Paulo. “Embora as torneiras estejam secando em muitas residências, a falta d’água ainda não se transformou num grande problema para os paulistas”, reconhece. “Já houve protestos na capital e em algumas cidades do interior, mas a água ainda flui para a maioria. A crise é grave e o governo estadual tem responsabilidade, mas ele tem contornado o problema.”

“A crise hídrica é um fenômeno adverso que não ocorreu apenas nos últimos quatro anos: enfrentamos uma das piores secas do século”, acredita o deputado federal tucano Duarte Nogueira, presidente do diretório paulista do PSDB, repetindo o discurso oficial do governador. “Todas as ações de Alckmin foram no sentido garantir o abastecimento à população de São Paulo. Ele rapidamente começou a captar água do ‘volume morto’ do sistema Cantareira e deu descontos na conta para quem economizasse no consumo de água. Em breve, as chuvas vão voltar e os reservatórios irão encher. Alckmin se saiu bem porque é um bom gestor. Fala pouco e trabalha muito.”

Apesar de ter sido muito explorada nas campanhas de Alexandre Padilha (PT) e Paulo Skaf (PMDB), que tentaram, sem sucesso, arrebatar-lhe o poder a Alckmin, a crise de escassez acabou não criando dividendos eleitorais para a oposição. “O povo não é bobo: ao mesmo tempo em que olham para os candidatos falando que não haverá água e que o governo estadual é culpado, as pessoas olham para o céu e constatam que realmente não choveu”, afirma o ex-deputado estadual Orlando Morando (PSDB). “Padilha e Skaf se perderam com isso.”

Votação crescente

“Ele (Alckmin) foi eleito sempre com votações crescentes. Em 2002, ganhou no segundo turno. Em 2010, no primeiro. Agora, também no primeiro. É um político testado, aprovado e reconhecido por seus eleitores”, aponta o deputado tucano Duarte Nogueira. “Democracia não é rotatividade, ficar tirando um e colocando outro, mas eleger os melhores governantes. Alckmin é a síntese da boa política, feita com decência, transparência e honestidade. Isso lhe dá popularidade.”

Lideranças petistas, porém, não calculam o bom desempenho de Alckmin nas urnas apenas pela observação climática dos paulistas. “O governador é blindado”, atesta o deputado estadual João Paulo Rillo (PT). “A grande imprensa sonega informação ao povo sobre os problemas de São Paulo, como o desmonte da escola e da universidade pública, o crescimento do crime organizado e a falta de projetos de desenvolvimento para as regiões do estado. Alckmin mente descaradamente. E ninguém lhe desmente.”

Para Rillo, a “blindagem midiática” do tucano é a principal razão das sucessivas vitórias eleitorais – mas não a única. “A oposição também tem culpa. Não conseguimos criar alternativas para dialogar com o cidadão paulista.” Fornazieri, professor da Fesp, concorda. “A oposição está completamente falida em São Paulo e não conseguiu projetar novas lideranças”, aponta. “A bancada do PT na Assembleia Legislativa capitulou diante do governador. Assim, ele nada de braçada.”

O deputado estadual Adriano Diogo (PT) vê ainda problemas na campanha de Alexandre Padilha para governador. “Cometemos erros gravíssimos”, lamenta, enumerando as qualidades “extraordinárias” do ex-ministro da Saúde. “A campanha não refletiu a competência do candidato, não disputamos o imaginário de esquerda, não levamos para a TV toda a experiência da nossa bancada. Nossa agenda popular deu espaço à política de alianças com partidos conservadores. Mais uma vez, perdemos para nós mesmos.”

Certo sentimento antipetista que vicejaria entre os paulistas também teriam, segundo alguns políticos e analistas, peso na hora do voto. “O paulista parece raciocinar a partir de uma lógica de divisão de poderes: se o PT tem o governo federal, é importante que seu maior opositor comande o estado mais importante do país”, considera Iglecias, da USP. “O PT está muito desacreditado”, complementa Duarte Nogueira. “Como em São Paulo há mais acesso à informação, o eleitor é mais consciente e a repulsa é maior.”

O também deputado estadual Carlos Giannazi (Psol), membro da oposição ao governador na Assembleia Legislativa, destaca outro aspecto do sucesso do governador nas urnas. “Alckmin tem o apoio de muitos prefeitos porque libera emendas, verbas e obras com os R$ 204 bilhões de que dispõe no orçamento”, analisa. “Além de arrebanhar apoio dos prefeitos, o controle da máquina também lhe garante maioria no parlamento paulista”, conclui.