Dólar desvalorizado demanda novas regras para o comércio internacional

De acordo com estudo do Ipea, instrumentos previstos pela OMC são neutralizados diante da alta do real e não são suficientes para impedir a desindustrialização

Enquanto o dólar esta desvalorizando, o real se supervaloriza (Foto: ©Yuriko Nakao/ Reuters

São Paulo – Com o real supervalorizado, o Brasil vê anulados incentivos às exportações como instrumentos de tarifas, o que pode ter como consequência a desindustrialização. A constatação é parte de um estudo do Instituto de Economia Aplicada (Ipea), que defende a mudanças na regulação do comércio internacional de modo a permitir a proteção de economias de países emergentes como a do Brasil.

A possibilidade de impor tarifas alfandegárias para proteger setores como a indústria e assegurar acesso desse setor é permitida por resoluções da Organização Muncial do Comércio (OMC). A opção de países como Estados Unidos e China de desvalorizar suas moedas provoca efeitos sobre o comércio internacional, prejudicando nações como o Brasil

Intitulado de “Impactos do câmbio nos instrumentos de comércio internacional: o caso das tarifas”, o estudo divulgado na  quinta-feira (11), em São Paulo, coloca o desalinhamento cambial como vilão no cenário econômico atual (clique aqui para ler a íntegra). A avaliação é de que as regras para o comércio internacional não adotou formas de prevenir o uso da desvalorização artificial da moeda para proteger produtores de um país ou para ter efeitos semelhantes ao de subsídios ou de dumping – rebaixamento dos preços abaixo do valor de custo de produção.

Uma das autoras da pesquisa, Vera Thortensen, coordenadora do Centro do Comércio Global e Investimento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) , destaca que, diante da realidade da prática de desvalorizações cambiais, é fundamental que se negocie a criação de mecanismos para neutralizar os efeitos do câmbio nas tarifas ou medidas que “possibilitem a manutenção do acesso a mercados originalmente negociados”.

Segundo o estudo, a OMC precisa enfrentar as questões dos efeitos do câmbio sobre as regras comerciais desenvolvidas nos últimos 60 anos. “O grande avanço representado pela OMC sempre foi o de garantir que as relações entre Estados sejam orientadas pelas regras e não pela força. O fortalecimento do sistema regulatório é fundamental para que guerras comerciais não se transformem em conflitos internacionais”, escreve o estudo.

O Ipea aponta que a desvalorização cambial acaba também servindo como subsídio às exportações dos países desenvolvidos e como sobretaxas produtos adquiridos em outras nações. Na prática, isso funciona como ” barreiras ao comércio muito mais eficazes que as tarifas aplicadas”. Práticas protecionistas, como cobrar impostos elevados para proteger produtores nacionais, são limitadas por acordos firmados no âmbito da OMC.

“As magnitudes dos movimentos cambiais está anulando o poder dos instrumentos de regulação do comércio”, destaca a pesquisadora. Ela explica que esse efeito no Brasil resulta no incentivo à importação, pois, existe uma propensão em se comprar importados quando a moeda está muito forte o que causa o enfraquecimento da indústria brasileira.

Instabilidade americana e europeia

Vera destaca que no momento em que as economias americana e europeia estão enfraquecidas, a política dos governos é a de deixar o crédito mais fácil. “Em vez de chegar até as indústrias, o investimento acaba se acumulando nos bancos, a procura de rendimento em mercados onde a prática da taxa de juros seja alta, como no Brasil”, considera Vera. As taxas de juros brasileiras, estão em 12,5% ao ano, após cinco altas seguidas nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) realizadas em 2011.

Ao atrair tantos recursos para o país, os juros tornam-se vilões também do câmbio no Brasil. Os capitais estrangeiros que aportam nas bolsas de valores brasileiras precisam negociar a compra de real para negociar com outros operadores. Com uma procura maior pela moeda brasileira, ocorre a valorização.