PL do autocontrole dos frigoríficos terá de passar pelo plenário do Senado
Aprovado em comissão, PL de autoria do governo iria para sanção. Mas a sociedade reagiu e conseguiu assinaturas necessárias de senadores para levar a decisão ao Plenário
Publicado 04/07/2022 - 19h19
São Paulo – Aprovado em comissão do Senado em 23 de junho, o Projeto de Lei (PL) 1.293/2021, que dispensa a fiscalização de frigoríficos pelo Ministério da Agricultura, estava pronto para sanção presidencial. Mas diversos setores da sociedade pressionaram senadores, numa articulação que conseguiu a adesão de 16 deles a um requerimento, conforme previsto no regimento da Casa, para que a decisão passe obrigatoriamente pelo plenário, com os parlamentares tendo de avaliar o teor do PL e votar.
A expectativa agora, mais otimista, é que o Senado barre definitivamente a proposta que ficou conhecida como “PL do Autocontrole”. “Consideramos imoral aprovar um projeto que visa transferir do poder público a responsabilidade de supervisionar a saúde pública e a dignidade animal”, destacam as organizações em carta aberta.
De autoria do governo de Jair Bolsonaro, o projeto estabelece que os agentes privados farão o autocontrole da organização e dos procedimentos hoje aplicados pela defesa agropecuária. Ou seja, em vez do Ministério da Agricultura, os próprios donos do frigoríficos farão como bem entender em termos de fiscalização sanitária.
É por isso que organizações de proteção animal, ambiental, de defesa do consumidor, direitos dos trabalhadores de frigoríficos, da indústria de alimentos, direito dos pequenos produtores rurais, organizações de saúde humana e os próprios fiscais agropecuários se uniram contra o PL. Estão todos preocupados com os riscos que essa proposta pode trazer para a sociedade.
Como o PL é nocivo
A questão é tão importante que é estabelecida constitucionalmente. Segundo a Constituição, essa prerrogativa é do Estado – e não das empresas. Conforme alertam as organizações, os prejuízos por trás do PL bolsonarista são muitos e ameaçadores.
Entre eles estão a dificuldade de identificar e punir fraudadores em caso de adulteração e contaminação de produtos como leite, carne, azeite, bebidas em geral e outros alimentos. É o caso de resíduos de antibióticos na carne e no leite. Ou de doenças e infecções por causa da ingestão de produtos impróprios para consumo humano, que deve aumentar. Há ainda os custos da fiscalização privada, que pode encarecer os alimentos e deverão prejudicar severamente pequenos produtores e a agricultura familiar, que terão dificuldade para pagar às empresas de fiscalização.
O PL é também um grave risco de aprofundar a crueldade contra os animais. Sem a fiscalização do poder público, os animais serão ainda mais expostos ao extremo sofrimento nos abatedouros, como documentado por organizações de defesa dos direitos dos animais. É o caso da Animal Equality e a Mercy For Animals, que mostram as péssimas condições que os animais são submetidos na ausência dos fiscais agropecuários (atenção: imagens fortes).
Para o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais (Anffa Sindical), Janus Pablo, além de desastroso, o projeto possui lacunas e ambiguidades que podem favorecer as grandes empresas agropecuárias em detrimento da sociedade. “Os auditores agropecuários atuam em todas as áreas de produção de alimentos, incluindo a supervisão dos agrotóxicos utilizados na produção agrícola. Sem a fiscalização agropecuária governamental, na prática, as empresas ficarão livres para reportar se elas estão cumprindo as normas sanitárias, sem que seja necessário o auditor conferir as informações in loco“, disse.
Clique aqui para ler a carta
Organizações que fazem parte dessa articulação:
- ACT Promoção da Saúde, Alianima
- Animal Equality
- Associação dos Fiscais Agropecuários do Rio Grande do Sul (Afagro)
- Associação dos Municípios da Microrregião do Vale do Paranaíba (AMVAP)
- Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável
- Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins (CNTA)
- Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal
- Greenpeace
- Instituto Akatu
- Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec)
- Instituto Protecionista S.O.S. Animais e Plantas
- Instituto Sociedade População e Natureza (ISPN)
- Instituto Socioambiental (ISA)
- Mercy for Animals
- Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
- Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
- Núcleo de Justiça Animal da Universidade Federal da Paraíba
- Observatório do Clima
- Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN)
- Proteção Animal Mundial (World Animal Protection)
- Slow Food Brasil
- Sinergia Animal
- Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais (Anffa Sindical)
- TJCC – Movimento Todos Juntos Contra o Câncer.
Várias outras organizações têm apoiado diretamente os Auditores Fiscais Federais, como pode ser visto neste comunicado recém lançado. É importante destacar que se os próprios auditores fiscais, que são quem mais entende de fiscalização, são contra o PL do Autocontrole, obviamente o PL representa uma ameaça se for aprovado da forma que está redigido.
Senadores que assinaram requerimento para votação plenária
- Paulo Rocha (PT-PA)
- Jean Paul Prates (PT-RN)
- Fabiano Contarato (PT-ES)
- Paulo Paim (PT-RS)
- Jaques Wagner (PT-BA)
- Eliziane Gama (Cidadania-MA)
- Rogério Carvalho (PT-SE)
- Mara Gabrilli (PSDB-SP)
- Leila Barros (PDT-DF)
- Zenaide Maia (Pros-RN)
- Alessandro Vieira (PSDB-SE)
- Randolfe Rodrigues (Rede-AP)
- Reguffe (União-DF)
- Telmário Mota (PROS/RR)
- Jorge Kajuru (PODEMOS/GO)
- Humberto Costa (PT/PE)