Governo tenta frear alta do real sem mexer nos juros

Selic alta vai continuar a atrair dólares ao país e valorizar o real, aponta economista

Mantega quer diminuir vantagem da especulação com medidas adotadas (Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil)

São Paulo – O governo federal anunciou novas medidas para conter a valorização do real ante o dólar nesta quarta-feira (27). Operações chamadas de derivativos de câmbio passam a receber tributação mais elevada. Embora o Ministério da Fazenda acredite que há possibilidade de sucesso da medida, economistas apontam que a taxa de juros praticada no Brasil segue como principal motor de atração de investidores estrangeiros e de alta da moeda brasileira. Além disso, seriam necessárias posições mais duras para conter o mercado de derivativos.

Por ora, será cobrado 1% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre contratos que dão a investidores opções de compra e de venda de moeda após um período. A incidência deve ocorrer apenas no montante negociado que ultrapassar a posição comprada. Medida provisória publicada nesta quarta no Diário Oficial prevê a possibilidade de aumento da alíquota para até 25%.

O texto ainda autoriza o Conselho Monetário Nacional (CMN) – formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento mais o presidente do Banco Cental – a definir regras específicas para as negociações no mercado de derivativos. O órgão fica encarregado ainda de “calibrar” o percentual cobrado de IOF, além de adotar outras restrições, como exigência de depósitos sobre os valores dos contratos de compra e venda, criação de prazos e valores máximos para as operações.

“Estamos diminuindo a vantagem da especulação”, avisou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista coletiva. “Esperamos com isso que haja uma desvalorização ou não valorização do real”, anunciou. Na terça-feira (26), a cotação do dólar alcançou o patamar mais baixo em 12 anos, após meses em tendência de queda. Há seis dias úteis consecutivos a taxa de câmbio vem caindo.

Ao negociar moeda no futuro, são vendidos dólares sem necessariamente haver entrada de mais recursos. O efeito é de multiplicar o impacto do ingresso de dólares do país. Ofertas maiores tendem a derrubar os preços, valorizando o real. O IOF irá incidir sobre a posição vendida que ultrapassar a posição comprada.

Segundo o economista Amir Khair, consultor e mestre em finanças públicas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ouvido pela Rádio Brasil Atual, o principal problema brasileiro é a elevada taxa de juros. A Selic está atualmente em 12,5%, o que representa uma taxa real – descontada a inflação – de 6,77%. Ao pagar margens mais altas, o país passa a atrair mais investidores, o que força a cotação do real para baixo.

“A única proteção realmente segura para se começar a reverter ou deter o processo é botar a Selic no nível internacional”, avalia Khair. “Enquanto a presidenta Dilma Rousseff não tomar essa decisão – porque o Banco Central jamais tomará – o país vai sofrer com a invasão de dólares, e isso vai afetar muito mais a economia.”

Controle de capitais

Antes da cobrança de IOF sobre derivativos, o tributo teve alíquotas ampliadas para compras no exterior feitas com cartão de crédito, além de empréstimos em dólar coletados no mercado internacional. O governo ainda aumentou, no início de julho, o recolhimento compulsório para operações no mercado futuro de câmbio.

Na ocasião, o BC decidiu obrigar bancos que operam no mercado futuro de dólar em valores superiores a R$ 1 bilhão a recolher 60% do montante. Esses recursos ficam parados com a autoridade monetária sem qualquer forma de remuneração. Desde abril, apenas instituições que negociassem mais do que R$ 3 bilhões eram obrigadas a deixar dinheiro parado.

Para André Biancarelli, professor do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), dificilmente é possível se promover um controle efetivo do fluxo de capitais com medidas pontuais sobre o mercado de derivativos de câmbio. Os operadores são hábeis em encontrar formas de evitar a incidência de um tributo, driblando regras sem necessariamente descumpri-las.

Mas ele avalia que é necessário se avançar no controle de capitais. Em entrevista à Rede Brasil Atual, Biancarelli disse que uma medida complementar mais eficiente seria restringir a possibilidade de agentes financeiros atuarem ao mesmo tempo no mercado de dólares à vista e futuro, o que permite aumentar ganhos com apostas num real cada vez mais valorizado.

Em 2008, na eclosão da crise financeira internacional, empresas como a Sadia e a Aracruz Celulose tiveram grandes prejuízos por terem feito negociações de opções de compra e venda que apostavam na valorização do real. Os “derivativos tóxicos”, como o governo costumava denominar a modalidade, foram restritos por medidas adotadas à época, de modo a reduzir os riscos daquele tipo de operação.

Para Cristina Helena Pinto de Mello, professora de macroeconomia da ESPM, evitar a experiência da crise de três anos atrás, é outra intenção do governo. Segundo ela, muitos bancos brasileiros estão apostando em mais queda do dólar em relação ao real, principalmente nessas opções de compra futura.

Uma eventual reversão do cenário – possibilidade mais provável diante das incertezas na discussão sobre a elevação do teto da dívida pública dos Estados Unidos –, com valorização da moeda norte-americana, poderia colocar o sistema financeiro em situação complicada. “O governo não quis arriscar deixar os bancos tão expostos”, assinala.

Com informações da Agência Brasil e Sul21