Por justiça fiscal

Campanha alerta para ‘artimanhas’ em PL da taxação de offshores e super-ricos aprovado na Câmara

Em análise no Senado, projeto flexibilizou propostas do governo e reduziu alíquotas de tributação. As mais de 70 organizações sociais que compõem a campanha cobram mais leis e regulamentação

Lula Marques/Agência Brasil
Lula Marques/Agência Brasil
'O governo manda pro Congresso os projetos de um jeito e dá uma piorada nas alíquotas e no toma lá dá cá pesado!', contestam integrantes da campanha

São Paulo – Para a campanha Tributar os Super-Ricos, a taxação de investimentos de pessoas físicas no exterior (offshores) e a antecipação de imposto nos chamados fundos de investimento exclusivos, também conhecidos como fundos dos “super-ricos”, é apenas um começo para o Brasil reduzir a desigualdade e fazer justiça fiscal. A avaliação faz referência ao Projeto de Lei (PL) 4.173/2023, aprovado pela Câmara dos Deputados no final de outubro, prevendo mudanças na tributação do grupo.

A taxação era uma das reivindicações das mais de 70 organizações sociais, entidades e sindicatos que compõem a mobilização. Mas a avaliação é que o texto final ainda contém muitas “artimanhas” que premiam os chamados super-ricos.

De autoria do Executivo, o PL é uma das propostas do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que atinge grupos privilegiados. Desde a campanha eleitoral, Lula promete incluir “o pobre no orçamento e o rico no imposto de renda”. A taxação é considerada uma das prioridades da gestão, que promete déficit fiscal zero já no ano que vem e aumento da arrecadação. Se fosse aprovada como sugeriu a equipe econômica, as propostas proporcionariam arrecadação de R$ 20 bilhões em 2024.

Balanço das propostas

No entanto, o texto apoiado pelos deputados flexibilizou as propostas do governo e devem, na prática, reduzir a previsão inicial de arrecadação. A versão final do relator, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), equiparou, por exemplo, as alíquotas de tributação de offshores e de fundos exclusivos em 15% – o que reduziu a taxação prevista pelo Executivo sobre os investimentos no exterior. Na primeira versão, ela variava entre zero e 22,5%, em que a maior parte das tributações deveria ser na alíquota máxima por se tratar de rendimentos superiores a R$ 50 mil.

“A lei apenas fecha brechas da legislação e gera isonomia entre investimentos dos mais ricos com os demais tipos de investimentos”, pondera a campanha. As organizações também criticam a “barbada” do relator, que decidiu fixar em 8% a alíquota para quem optar, de forma voluntária, pela antecipação da incidência do tributo sobre rendimentos até este ano nos fundos fechados e na opção de atualizar bens no exterior pelo valor de mercado em 31 de dezembro. Com isso, as novas regras serão válidas apenas a partir do próximo ano.

“Barbada para quem quer antecipar os regastes ou de promover a distribuição ou a atualização do valor dos ativos no exterior, pagando o imposto devido com uma alíquota reduzida. Na proposta original do governo essa alíquota seria de 10%, mas a Câmara reduziu para 8%. O governo manda pro Congresso os projetos de um jeito e dá uma piorada nas alíquotas e no toma lá dá cá pesado!”, contesta a mobilização.

“Só o começo”

Por resistências da bancada ruralista, o PL também alterou a tributação que previa o governo federal sob os Fundos de Investimento do Agronegócio (Fiagro). Nesse tipo de fundo, ficam isentos de imposto de renda na fonte e na declaração os rendimentos que tenham, no mínimo, 50 cotas. Para isso, elas também devem ser negociadas exclusivamente na bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado. A gestão Lula queria elevar para 500 o número mínimo de cotas para isenção. Mas o montante final acabou sendo de 100 com uma trava de 30% do total do patrimônio líquido para parentes de segundo grau. As novas regras também valerão sobre os Fundos de Investimento Imobiliário (FII).

Enviado para análise no Senado, o projeto deve agora tramitar na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), segundo o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP). O objetivo do governo é que a matéria seja aprovada ainda antes do recesso de final de ano como parte de seu “esforço fiscal” de cumprir regras e metas fiscais.

A campanha adverte, contudo, que ainda há “muito mais manobras que privilegiam os super-ricos que precisam de leis e regulamentação”. “Deslocar a tributação pesada dos mais pobres para os mais ricos exige mais do que vontade do governo, mas intensa mobilização popular para modificar a correlação de forças na sociedade.”

Redação: Clara Assunção