Histórias e lutas

Documentário conta a vida de padre Reginaldo, expulso da igreja por sua luta pelos pobres

Antigo administrador paroquial no Morro da Conceição, religioso foi expulso das funções sacerdotais por sua adesão à Teologia da Libertação

Josiane Holz
Josiane Holz
Reginaldo revela que, ao voltar para o Brasil, tinha uma nova visão sobre a sociedade e contestava posições conservadoras da Igreja

São Paulo – A história e as lutas do padre Reginaldo, que era administrador paroquial no Morro da Conceição, em Recife, nas décadas de 1970 e 1980, quando foi expulso das funções sacerdotais por ligações com a Teologia da Libertação virou filme. O documentário em curta-metragem Reginaldo Veloso: O Amor Mais Profundo – celebra os 83 anos de vida do religioso e teve pré-estreia na última segunda-feira (3).

Em entrevista a Marilu Cabañas, no Jornal Brasil Atual, a diretora Daniela Kyrillos conta que foram três anos para a realização da obra, entre pré-produção, filmagens e pós-produção. A ideia de fazer o documentário nasceu de uma visita ao Morro da Conceição, em busca de locação para outro curta-metragem com o qual colaborou. Foi quando percebeu o quanto padre Reginaldo está no coração dos moradores daquela comunidade.

Nascido em São José da Lage, no estado de Alagoas, Reginaldo Veloso foi para Roma em 1958, onde estudou Teologia e História da Igreja. Em 1961, foi ordenado padre, dois dias antes da conclamação do Concílio Vaticano II, retornando ao Brasil em 1968. 

Prisão política

Reginaldo revela que voltou ao Brasil com uma nova visão sobre a sociedade e passou a contestar as posições conservadoras da Igreja. Em 1973, elaborou junto com outros bispos o documento “Eu Ouvi os Clamores do Meu Povo”, que clamava por uma libertação das opressões históricas sobre o povo, especialmente o mais pobre.

O texto assumia abertamente um tom revolucionário e, entre outras bandeiras, reivindicava do poder público o acesso irrestrito à água, habitação, transporte e outros direitos fundamentais, o que provocou a ira do governo civil-militar. “Isso provocou uma irritação grande nos militares. Num sábado, agentes foram à igreja, vasculharam o local atrás do documento e me levaram para ser interrogado”, conta ele.

“Me despiram e colocaram numa jaula que tinha um metro e meio quadrado. Era um cubículo. Fui interrogado por três militares que queriam saber quem havia escrito o documento. Na época, coloquei nomes de figurões da extrema-direita como autores do texto.”

Expulsão da igreja

No documentário sobre Reginaldo Veloso, Daniela conta como o padre foi afastado de suas funções no Morro da Conceição. Segundo ela, o papado de João Paulo II mudou a visão da igreja, que resolveu se voltar aos dogmas religiosos e manter-se alienada das necessidades básicas do povo. “Com um novo arcebispo em Recife, após a renúncia de Don Helder Câmara, em 1985, foram fechados institutos de teologia na capital, expulsando alguns padres progressistas, como Reginaldo.”

O documentário conta um episódio curioso na região. “Queriam ocupar a igreja para substituir o padre Reginaldo, mas não achavam a chave, porque os moradores haviam escondido. Quando os policiais chegaram lá, o pessoal do morro fez um cordão em volta. Acenderam um balão, colocaram a chave e se desfizeram dela”, conta Kyrillos.