Família caiçara de Paraty ganha o direito de permanecer em reserva ambiental

Seu Maneco e parte da família: seis gerações em Martins de Sá (Divulgação) São Paulo – Os desembargadores da 15ª Câmara Cível do Rio de Janeiro decidiram ontem (12), por […]

Seu Maneco e parte da família: seis gerações em Martins de Sá (Divulgação)

São Paulo – Os desembargadores da 15ª Câmara Cível do Rio de Janeiro decidiram ontem (12), por três votos a zero, manter a família de Manoel dos Remédios, o Seu Maneco, na praia Martins de Sá, em Paraty, litoral sul fluminense. A decisão judicial é resultado da batalha territorial que durou mais de 14 anos.

No local, a família de Seu Maneco, de 69 anos, mora em uma comunidade tradicional de caiçaras. A praia fica na Reserva Ecológica de Juatinga e é uma das mais bem conservadas do país. Entretanto, uma ação de reintegração de posse foi impetrada, em 1998, por uma família que alegava ter a titulação de cerca de 300 alqueires na região e que havia permitido a permanência dos caiçaras em regime de comodato.

O caso foi julgado pela primeira vez em maio de 2010, pela juíza Admara Falante Schneider, que negou a reintegração de posse. Os advogados da família recorreram e o caso só voltou a ser julgado ontem, em segunda instância pelos desembargadores Celso Ferreira Filho, Ricardo Rodrigues Cardozo e Horácio dos Santos Ribeiro Neto, que votaram pela permanência de Seu Maneco e dos caiçaras no local. 

Em entrevista à Rede Brasil Atual, o advogado do Seu Maneco, Anderson Felipe Moraes, explicou que desta vez o espólio da família Antônio Rocha Pacheco (autores da ação) não tem como recorrer da decisão judicial. “O Supremo Tribunal Federal não analisa provas documentais. E mesmo se o fizesse, eles utilizaram apenas testemunhas para tentar comprovar o contrato de comodato com o senhor Manoel. Não tinham documento algum.”

Para Moraes, o valor da causa, apesar de não resultar em ganho financeiro é “imensurável”. “Estou muito satisfeito, primeiro pelo Seu Maneco, que é o guardião daquela região. Mas a maior satisfação é profissional, porque mesmo sem agregar financeiramente, esse caso é um verdadeiro legado.”

O caso movimentou jovens de Paraty e turistas que iniciaram manifestações para impedir a retirada da comunidade. Os ativistas criaram uma petição online que alcançou mais de 10 mil assinaturas em todo o país, além disso foi criada uma página no Facebook que explica e atualiza dados sobre o caso e um minidocumentário disponível no YouTube.

Ajuda ao Seu Maneco

O Seu Maneco sobrevive da pesca e das tradições caiçaras. Ele e sua família são responsáveis pela limpeza e preservação da praia Martins de Sá – a mais conservada da reserva ambiental de Juatinga. O agora advogado Anderson Moraes e seus amigos costumavam frequentar o local, antes mesmo de concluírem o ensino superior. “Nós íamos em Martins de Sá para surfar e acabamos conhecendo o Seu Maneco.”

Segundo Moraes, quando o Seu Maneco recebeu a ordem judicial para deixar o local, em 1998, ele os procurou para pedir ajuda. “Alguns de nós eram recém-formados e outros ainda estudavam. Ficamos meio receosos de assumir o caso, mas aceitamos devido à amizade que tínhamos com Seu Maneco”. Moraes conta que junto com os também advogados Leonardo Campos, Flávia Teixeira e Tatiane Duarte, começou a cuidar do caso.

“A luta foi muito grande, o Seu Maneco não tinha condições de pagar pelos serviços. Então nos reunimos e dividimos todos os gastos. Os custos financeiros no decorrer desses 14 anos foram pagos com a união do nosso grupo”, contou. 

O caso de Seu Maneco motivou Moraes e os colegas a formar a ONG Verde Cidadania, que atua em Paraty. Além de ajudar em casos similares de reintegração de posse, a entidade funciona como uma espécie de defensora da população local e tem projetos como o Casa Escola, que ensina as crianças e a população caiçara a ler e a escrever.