Limites

‘Justiça deve fiscalizar a polícia’, cobra juiz, após violência da PM na Favela do Moinho

Policiais lançaram bombas nesta quarta (29) contra moradores da comunidade, no centro de São Paulo, que denunciavam rotina de agressões em meio a pandemia. “É trágico”, diz André Bezerra

Favela do Moinho
Favela do Moinho
Moradores da Favela do Moinho denunciam que policiais vêm invadido as casas, sem mandado, e estão agredindo e ameaçando a comunidade

São Paulo – Um protesto de moradores da Favela do Moinho, no Bom Retiro, região central de São Paulo, contra a ação de policiais militares na comunidade, terminou em repressão nesta quarta-feira (29). A PM do governador João Doria (PSDB) lançou bombas de gás lacrimogêneo e disparou spray de pimenta contra os moradores, que denunciam uma rotina de agressões e ameaças. 

De acordo com relatos da comunidade à imprensa, há pelo menos três dias, policiais do 7º Baep (Batalhão de Ações Especiais), , sem mandado judicial e liderados pelo sargento Roberto Alexandre Ferreira da Silva, vêm invadindo as casas do Moinho, aterrorizando os moradores e praticando “torturas e arbitrariedades”. 

A comunidade afirma ainda que, nesta quarta, a PM prendeu três rapazes sob suspeitas de tráfico de drogas e que, de longe, presenciaram os três homens sendo agredidos. Ao portal de notícias G1, um morador, que não quis se identificar, conta que a população subiu até a Avenida Rio Branco, onde a agressão ocorria, para protestar e impedir a ação. A polícia respondeu atirando bombas. 

“Se eles vieram para prender, era pra levar pra delegacia, não torturar. A gente não tá em guerra. A gente pisa em barro, mas é gente”, disse um outro morador à reportagem da Ponte Jornalismo.

Agência Pavio
Policiais cercaram entrada da Favela do Moinho e arremessavam bombas contra moradores

Mais violações

Ainda segundo os relatos, os agentes também lançaram bombas de cima de uma ponte próxima, sufocando crianças e mulheres que esperavam em uma fila para pegar marmita. Os moradores então reagiram arremessando pedras e pedaços de pau. Em nota, a corporação justificou a operação, alegando que os três suspeitos “portavam cocaína, crack, maconha e lança-perfume, além de R$32 mil” e que foi “necessária a utilização de técnicas de controle de multidões para desobstruir a via”.

Nas redes sociais, a Favela do Moinho pediu socorro, destacando que, além da repressão policial, estão passando pela pandemia do novo coronavírus sem qualquer suporte assistencial. Os dados do município destacam que, são nas comunidades mais pobres e as regiões periféricas, que o número de casos e mortes em decorrência doença é cada vez maior.

Polícia não tem poder ilimitado

Para o juiz de Direito André Bezerra, doutor pelo programa Humanidades e Direitos da Universidade de São Paulo (USP), membro e ex-presidente do conselho executivo da Associação Juízes para a Democracia, a situação “é trágica e, mais trágico ainda, é que não é uma novidade”. “(A violência policial) é um fato comum que é agravado em época de pandemia”, lamenta.

“As pessoas precisam ficar em casa e ainda têm que se deparar com policiais entrando em suas casas, fechando as ruas com tiros, bombas. É o momento de cobrar o sistema de justiça, que deveria fiscalizar a polícia. A polícia não tem poderes ilimitados, ninguém tem poder ilimitado”, observou. 

Em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, da Rádio Brasil Atual, o magistrado, que destaca em sua participação como a judicialização deveria assegurar direitos sem infantilizar a política, lembra que, assim como o sistema de justiça tem um poder limitado, a atuação da polícia também tem limites.

“Se a polícia está agindo como está agindo, a gente tem que se perguntar o que o Ministério Público está fazendo para evitar que isso continue ocorrendo”, cobrou. 

Ouça a entrevista na íntegra