Direitos Humanos

Entidades cobram Alckmin desde 2011 sobre tortura na Fundação Casa

Mecanismo de combate à violação de direitos humanos foi proposto por 34 organizações. Visitas independentes a centros de privação de liberdade seria uma das funções do órgão

Marcelo Camargo/Arquivo ABr

Para evitar cenas de abuso, inspeções seriam feitas sem aviso prévio e sem monitoramento

São Paulo – Casos de tortura como os que foram registrados em maio em uma unidade da Fundação Casa em São Paulo, denunciados na última semana pelo programa dominical Fantástico, da Rede Globo, poderiam ter sido evitados se o Estado tivesse um mecanismo para prevenir e evitar esse tipo de violência. Antes mesmo da divulgação das imagens das agressões de funcionários da unidade de Vila Maria a seis adolescentes, 34 entidades haviam encaminhado carta ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) pedindo a criação de um órgão de combate e prevenção à tortura.

A ideia é criar um órgão independente e com autonomia para fazer visitas sem aviso prévio. Dessa forma um colegiado do gênero poderia ter acesso a denúncias de maus tratos e tortura e desenvolver mecanismos de prevenção. Atualmente pessoas em unidades de privação de liberdade não têm acesso constante e facilitado a entidades isentas e interessadas em protegê-los da violação do direito básico de ter sua integridade física preservada.

“Esperamos que, com a repercussão da tortura na Fundação Casa, o governador não se resuma a anunciar a colocação de câmeras – porque, na verdade, o torturador, na hora da tortura, vai desligar as câmeras. Isso simplesmente não resolve todos os problemas. Já teve experiências nas unidades em Franco da Rocha um período, em 2001, 2002, e não foi propriamente a solução. Porque sempre na hora das agressões os equipamentos eram desligados. Até porque, em muitas das vezes, essas práticas contam com apoio dos diretores da unidade”, avalia o advogado especialista em direitos humanos e membro do Tortura Nunca Mais, Ariel de Castro Alves. “O que resolve é o combate contínuo.”

Desde 2011, entidades da sociedade civil, em conjunto com o Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, reclamam mais ação do governo de São Paulo para impedir novos casos de violência nas unidades de privação de liberdade. Em maio daquele ano, a minuta de um projeto de lei propondo a criação de um mecanismo estadual com essa função foi entregue à Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado.

Na época, porém, a implementação da proposta foi adiada. Segundo a coordenadora da Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura, Gorete Marques, isso se deu porque o governo estadual afirmou ser necessário aguardar a aprovação do Projeto de Lei Federal 12.847, que tratava sobre o mesmo assunto em âmbito nacional.

A lei federal foi sancionada em 2 de agosto deste ano, instituindo a criação desse mecanismo e atendendo ao protocolo da Organização das Nações Unidades (ONU), ratificado pelo Brasil em 2007. E então o grupo retomou a pressão. A carta foi entregue no dia 13 e até agora não houve nenhuma resposta.

A atuação do mecanismo federal independe da existência de um órgão equivalente em nível estadual, mas os ativistas consideram que ele é fundamental para aumentar o desempenho. “O mecanismo nacional vai ter 11 membros para fazer o monitoramento, a fiscalização. Mas a gente sabe que eles vão ter que dar conta de muitas unidades, não só as prisionais. Todas as de privação de liberdade: internação de adolescente, clínicas, manicômios. Então o ideal é que os estados criem mecanismos também e trabalhem articulados”, afirma Gorete.

Ao mesmo tempo, a criação de mecanismos estaduais também não dependiam da aprovação do projeto de lei nacional. Rio de Janeiro aprovou uma lei em 2010 e já tem um órgão instalado e funcionando, enquanto Alagoas, Espírito Santo, Paraíba e Pernambuco já tem legislação sobre o assunto.

“As ouvidorias hoje tanto da Fundação Casa e do sistema penitenciário são cargos de assessoria, indicados pela presidência da Fundação e pelo secretário de Administração Penitenciária ou seja, são totalmente subordinados”, explica Alves.

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