Luta constante

‘Temos que ser uma voz crítica para ajudar o governo a avançar’, afirma João Pedro Stedile

Stedile, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), concedeu entrevista à mídia alternativa sobre os rumos do país e a CPI do MST

Reprodução/Barão de Itararé
Reprodução/Barão de Itararé
"Sofremos muito", lembrou Stedile sobre o governo Bolsonaro. "Estimularam todo tipo de ódio e violência contra nós"

São Paulo – O Centro de Estudos da Mídia Anternativa Barão de Itararé realizou hoje (28) uma entrevista da imprensa independente com o líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) João Pedro Stedile. A parceria com o MST visa trazer clareza aos atos do movimento, bem como desnudar a CPI do MST, que tenta criminalizar a luta pela terra no Brasil. Também em pauta, os caminhos da política e de como avançar na reforma agrária. Além do Barão e do MST, a TVT também realizou a transmissão da conversa.

O presidente do Barão, jornalista Altamiro Borges, o Miro, começou a conversa lembrando depoimento de Stedile na CPI há duas semanas. O líder ativista teve uma performance que chamou a atenção dos espectadores mais atentos. Com clareza e tranquilidade na apresentação dos fatos, Stedile derrubou preconceitos e ajudou a afundar a CPI, que dá seus passos finais. “Stedile deu uma aula, passou um trator sobre os deputados ruralistas, os ‘agrotrogloditas’. A mídia tentou esconder”, lembrou Miro.

“Stedile tem grande conhecimento intelectual orgânico. Muito respeitado no Brasil por suas ideias, sua luta. Respeitado no mundo em vários fóruns (…). Temos consciência de que essa CPI visava criminalizar os movimentos sociais, satanizar o MST e desgastar o governo Lula. Temos o Stedile para comentar esse fim melancólico da CPI. Só vai ficar faltando uma cachacinha para comemorar os ‘agrotrogloditas’ da bancada bolsonarista”, completou o jornalista.

Além de Miro, entrevistaram Stedile Cristina Serra, do ICL Notícias; Adriana Delorenzo, da Revista Fórum; César Xavier, do Portal Vermelho; Lourdes Nassif, do GGN; André Barrocal, da Carta Capital; e Conceição Lemes, do Viomundo.

Reconstrução

Stedile começou sua entrevista saudando os repórteres e brincou: “Espero que vocês sejam mais simpáticos do que os deputados fascistas da comissão. Pena que vai ser uma hora, estava treinado para sete”, disse, em relação irônica à duração de seu depoimento à CPI. O ativista também comentou sobre a necessidade de avançar com a reforma agrária no país.

Contudo, Stedile lembrou que o momento do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é de reconstrução. Então, retomar o processo de reformas de base carece de tempo e dedicação da equipe governamental. “O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) foi fechado no governo do fascista (Bolsonaro). Pegaram um ministério sem gente, sem orçamento, sem eira, nem beira. O MDA está se recompondo assim como o Instituto Nacional da Reforma Agrária (Incra) que virou um balcão de negócios que impediu o avanço da reforma. Há um passivo e os novos gestores vão pagar a conta”, disse.

Papel do movimento social

De acordo com Stedile, cabe aos movimentos sociais cobrar o empenho necessário do governo, agora que há diálogo e disposição para avançar. “É da nossa responsabilidade como movimento popular, como também a Contag, temos que ser uma voz crítica para ajudar o governo a avançar. Nossa vocação não é de ser bajuladores, só porque ajudamos o governo Lula. É preciso que haja ações mais contundentes. O problema da fome ainda é sério, mudou pouco”, salientou.

Contudo, ele pondera a boa vontade. “O governo reativou programas, passou novamente no Congresso, mas o orçamento é pequeno (…); estive com Lula e é uma das coisas que comentei. Então, não foi audiência e sim uma conversa. Ele disse que é preciso de dinheiro para combater a fome. Isso é urgente, é para ontem. Assim como áreas quilombolas e indígenas. A turma do Incra não tem nem diária para acelerar o processo de legalização. Então, é preciso acelerar várias iniciativas”, disse.

Stedile e a CPI do MST

Já sobre a CPI criada para alimentar narrativas da extrema direita e criminalizar o movimento social, Stedile já pensa no fim. “Termina dia 14 de setembro. Eles têm duas ou três semanas para provocar factoides (…). Não cometi crime, não há desvio de recurso público, nunca manuseei recurso algum. Não há motivo algum (…). Agora, o governo tem maioria na CPI. Iniciativas não vão passar. O relatório está pronto desde a segunda semana. Ricardo Salles tentará incriminar. Não tem nada a ver com pesquisa, contraditório. Espero que a nova maioria derrube o relatório e aprovem um outro condizente com a realidade agrária no Brasil”.

Ainda no tema, a jornalista Lourdes Nassif lembrou que o MST é um dos alvos preferidos da extrema direita e do bolsonarismo. “Indígenas, quilombolas. O MST, dos movimentos sociais, foi o que mais levou lambada”, disse. Então, ela perguntou se essa perseguição continua com o bolsonarismo enfraquecido por escândalos de corrupção de toda sorte ao redor do ex-presidente inelegível. “Sofremos muito”, lembrou Stedile. “Estimularam todo tipo de ódio e violência contra nós, quilombolas, indígenas e todos das periferias”, lembrou.

Papel da burguesia, por Stedile

O líder, então, continuou a elaborar a questão: “não gosto de usar bolsonarismo. No Brasil, sempre houve uma parcela de 10%, aproximadamente, da população que adere às ideias de extrema direita, fascistas, antipovo, antipobre, intolerante. No capitalismo ocidental existe isso. Aqui também, desde os integralistas na década de 1930. Depois Getúlio (Vargas), depois a ditadura. Agora, com a crise de 2014 pra cá, a crise do capitalismo, a burguesia botou toda a culpa na Dilma, a Globo falando todo dia. Diante da crise, para se proteger, a burguesia também impôs reformas e Teto de Gastos. Então, jogaram o peso da crise aos trabalhadores: o resultado foi que 70 milhões de trabalhadores perderam sua renda fixa. Não contentes, a burguesia apostou no capitão fascista, bancou o poder econômico do Bolsonaro”.

Assista à entrevista na íntegra: