Desigualdade

No ritmo atual, paridade de gênero nas prefeituras levará mais de um século

Segundo relatório, mulheres brancas são 25% da população e 8% dos prefeitos. Já as negras são 25% e 4%

Eu voto em negra
Eu voto em negra

São Paulo – Mesmo com número recorde de mulheres, negros, indígenas e pessoas LGBT+ eleitos em 2020 para as Câmaras Municipais, a questão da paridade ainda é um desafio. E no caso das mulheres, por exemplo, levará 144 anos para ser atingida, mantido o ritmo atual. No caso racial, 20 anos. As conclusões constam de estudo elaborado pela Oxfam Brasil e pelo Instituto Alziras. O documento foi divulgado ontem (24), durante o Festival Latinidades, em Brasília.

Intitulado Desigualdade de Gênero e Raça na Política Brasileira, o estudo mostra que de 2016 para 2020 as mulheres eleitas prefeitas passaram de 11,5% para 12,1% do municípios. Já negros e negras passaram de 29,1% para 32,1% do total. Mulheres brancas são 25% da população e 8,1% dos prefeitos. Já as negras são 25,4% e 3,9%, respectivamente.

Legado histórico

“Em um país em que mais de 50% da população é negra e 28% da população é composta por mulheres negras – e, dessas, apenas 6,3% são vereadoras – fica evidente o impacto do legado histórico de patriarcalismo, racismo e violência que ainda não foi superado, algo crucial em se tratando de defesa da democracia”, afirmam a Oxfam Brasil e o Instituto Alziras. Além disso, segundo o relatório, 57% dos municípios não têm vereadoras negra e 18% não têm mulheres nas Câmaras. “Cabe adicionar que, do ponto de vista da participação política, a população indígena e LGBT+ também enfrenta o problema da sub-representação no poder executivo e legislativo municipal”, lembram as entidades.

Assim, os homens ainda comandam 88% das cidades. Algo que o relatório aponta como, em parte, “fruto de distorções no processo de recrutamento e seleção de candidaturas pelos partidos”. Mesmo sendo maioria e tendo mais anos de estudo, elas não chegam a representar 14% das candidaturas às prefeituras e 35% das inscrições para disputar um cargo de vereador. E isso ainda melhorou, no caso das Câmaras, pela política de cotas que determina que ao menos 30% de mulheres.

Financiamento de campanha

No recorte racial, pela primeira vez as candidaturas negras representaram maioria na disputa para as Câmaras (51,5%), com 45,1% entre os eleitos. Mais de 50% da população brasileira é negra, e 25,4% são mulheres negras. No entanto, há no país apenas 6,3% vereadoras negras”, lembram as organizações no estudo. .

Para Oxfam Brasil e Instituto Alziras, a sub-representação de mulheres negras na política “tem relação direta” com o financiamento de campanhas. “Enquanto a maioria das candidatas negras não tem bens a declarar, os candidatos mais ricos (e brancos) contam com melhores condições patrimoniais para financiar as próprias campanhas, obtendo assim vantagens na corrida eleitoral. Em 2016, a arrecadação das campanhas políticas por meio de recursos próprios das candidaturas foi quase o dobro dos recursos partidários. Já em 2020, o advento do fundo público exclusivo para o financiamento das campanhas eleitorais combinado com cotas de gênero e raça abriu oportunidades para reduzir privilégios e garantir condições um pouco mais equilibradas para as candidaturas femininas.”

Candidaturas coletivas

Dessa forma, em 2020 houve maior equivalência entre a proporção de candidatas a prefeitas (14%) e a parcela de recursos arrecadados nas respectivas campanhas (18%). Quatro anos antes, elas eram 13%, mas arrecadaram apenas 12%.

No Legislativo, o subfinanciamento diminuiu “significativamente” na última eleição. “As mulheres eram 32,5% das candidatas a vereança com acesso a 21% da receita total em 2016 e passaram a ser 35% dos postulantes ao cargo de vereador em posse de 32% da receita total, uma diferença de 11 pontos percentuais no período.”

Além disso, cresceu a modalidade de financiamento coletivo de campanhas, que somou R$ 6,3 milhões dois anos atrás. “Isso demonstra o potencial das candidaturas coletivas e um modo de ação política pautado na coletividade, algo presente no ativismo de mulheres negras.”

Os dado coletados mostram que as vereadoras eleitas têm mais escolaridade que os homens. Enquanto 54% das mulheres com vaga no Legislativo municipal possuem ensino superior completo, no caso dos homens o percentual cai para menos da metade (26%). Em 2016, essas proporções eram de 48% e 23%, respectivamente.