Para Ipea, apesar de redução, desigualdade permanece muito alta no Brasil

Nas primeiras análises dos dados da PNAD 2008, instituto vê crescimento de renda em todos os segmentos, e mais elevados entre os mais pobres, mas falta muito par alcançar 'patamares civilizados'

Novos estudos devem ser divulgados pelo Ipea a partir de dados da PNAD 2008 (Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil)

Apesar da redução da desigualdade no Brasil apontada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008, a diferença de renda entre os pobres e ricos mantém o país entre as nações com pior distribuição de renda do mundo. A constatação faz parte das primeiras análises do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) sobre a edição da pesquisa lançada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O Comunicado da presidência aponta a melhoria contínua do nível de renda desde 2001, com destaque ao último período analisado, de 2007 a 2008, quando houve crescimento na renda de todos os segmentos, revertendo a queda registrada na renda dos 5% mais pobres registrada no ano anterior.

A redução do Coeficiente de Gini, indicador que mede a desigualdade de renda domiciliar média entre ricos e pobres, é importante, mas mantém o país “na metade mais desigual da região mais desigual do mundo”, sustenta o documento. A diminuição de 2001 a 2008 foi, em média, de 0,007. “Falta muito até chegarmos a uma distribuição de renda civilizada, mas é, mais uma vez, meritório de comemoração que após décadas de más notícias sobre a desigualdade, continuamos no caminho certo”, prossegue o texto.

A renda nas mãos dos brasileiros situados entre o 1% mais rico é igual à soma dos 45% mais pobres. O aumento da renda dos mais pobres tem sido em ritmo maior do que dos mais ricos da população.

Sergei Soares, pesquisador do Ipea, explicou em entrevista coletiva que, mantendo essa tendência recente de redução da desigualdade registrada nos últimos anos, “o Brasil levará 20 anos para chegar a um patamar que pode ser considerado justo”. Segundo ele, isso corresponde a um índice de 0,40 no Coeficiente de Gini.

O Instituto afirma que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e, em função disso, a extrema pobreza ainda está muito acima do que se poderia esperar. Um brasileiro pertencente ao 1% mais rico, ou seja, que vive em uma família com renda per capita acima de R$ 4.400 por mês, pode gastar em três dias o equivalente ao que um brasileiro do grupo dos 10% mais pobres levaria um ano para gastar.

“Para acelerar esse processo é necessário que façamos mais do que apenas olhar as coisas positivas que têm sido feitas. O indicado é que o país atue de forma a melhorar o sistema educacional e a reduzir a informalidade”, afirmou. “E, claro, isso envolve também medidas que objetivem também a redução da desigualdade racial e regional do país”.

Em relação ao crescimento do nível de renda, registrado em todos os extratos sociais, o Ipea comemorou que os rendimentos dos mais pobres avançou mais. Segundo o relatório, trata-se do “melhor dos mundos: a renda sobe para todos, mas sobe mais para os que menos têm.

A renda do trabalho foi o maior determinante da queda na desigualdade. De 2007 para 2008, rendimentos maiores do que o salário mínimo responderam por 75% da queda na desigualdade. O reajuste do salário mínimo contribuiu com 16%.

Desemprego

O desemprego medido nas seis regiões metropolitanas analisadas pela PNAD 2008 alcançou, em julho, 23,1% entre pessoas cuja renda familiar per capita é inferior a meio salário mínimo por mês. O índice responde a 5,2 vezes mais do que entre o restante da população (4,4%).

Em julho de 2002, o índice de desocupação entre os pobres também era elevada, mas dois pontos percentuais abaixo, em 21%. Entre os não-pobres, a taxa era de 6,7% há sete anos, apresentando queda na comparação com os dados de 2008.

“Com isso, a desigualdade que separa o desemprego entre trabalhadores pobres e não pobres aumentou 70%, pois era 3,1 vezes em julho de 2002 e passou para 5,2 vezes em julho de 2009”, diz a nota divulgada pelo Ipea.

Entre os pobres com mais de 11 anos de escolaridade, há 34,5% de desemprego, contra 9,4% entre pobres analfabetos. O Ipea atribui o fenômeno a “barreiras do ponto de vista da inserção no mercado de trabalho”, entre elas o preconceito e a falta de rede social de contatos, que permite indicação para postos mais bem remunerados.

“Não estou querendo dizer, com isso, que não adiante estudar. É um absurdo dizer que não adianta o pobre estudar. Estou chamando a atenção para a dificuldade dos desempregados pobres em encontrar emprego”, disse Marcio Pochmann, presidente do Ipea, em entrevista ao portal G1

Além disso, há um funil perverso que dificulta que pessoas de renda mais baixa acessem vagas com salários mais elevados. Pochmann atribui o mercado de trabalho fechado a seleções subjetivas realizadas no setor privado. “Não perguntam se a pessoa sabe inglês, mas sim quem visitou Nova York ou Londres no último ano, ou onde a pessoa mora. É uma série de questões muito próxima do preconceito”, disse.

Para o presidente do Ipea, o fomento a empregos para pessoas com mais escolaridade significaria recuperar e fortalecer setores da indústria, comércio e serviços. Uma medida assim permitiria que o país reduzisse sua dependência da exportação de commodities, produtos primários de menor valor agregado.