Despejo

Após reintegração, moradores de ocupação em São Paulo não têm onde deixar móveis

Empresa proprietária de edifício retira mobiliário, mas não ajuda moradores a descarregar. Prédio na rua Florêncio de Abreu estava ocupado desde 2006

Paloma Borges/Techimage/Folhapress

Moradores tentaram impedir a entrada da PM com barricadas.Estado precário das instalações impede reforma

São Paulo – “Eu só vou levar uma mesa que eu gosto muito, o resto vou deixar aí. Não tem para onde levar mesmo”, afirmava Terezinha Ramos, de 64 anos, moradora do quarto andar de um prédio ocupado na rua Florêncio de Abreu, no centro de São Paulo, cuja reintegração de posse foi executada hoje (20) pela Polícia Militar. Ela morava no local com a família desde o início da ocupação, em 2006. Em dois apartamentos improvisados e separados com folhas de madeirite moravam 15 pessoas de sua família, entre elas seis menores de idade, todos seus netos. O mais jovem tem apenas 18 dias de vida.

Apesar da precariedade das instalações, o cômodo é grande e bem-equipado, com eletrodomésticos e eletroeletrônicos. Mas apenas as roupas foram empacotadas. Fábio Dênis, o marido, diz que será o último a sair. “Como pode um negócio desse? Uma ocupação com seis anos, os caras virem do nada e tirar a gente. Aqui já teve vários pedidos de reintegração e eles nunca conseguiram. E pra quê? Para deixarem o imóvel vazio? Fazer igual o (edifício) Prestes Maia (também no centro da capital), que tiraram 400 famílias, deixaram um ano lá vazio até outras ocuparem de novo?”, questiona.

Em maio deste ano, o secretário municipal de Habitação, José Floriano de Azevedo Marques Neto, pediu para que a reintegração, então marcada para aquele mês, fosse adiada para que a prefeitura terminasse o cadastramento das famílias e providenciasse algum tipo de atendimento. A administração Fernando Haddad (PT) descarta a desapropriação do imóvel para a transformação de habitação de interesse social porque o prédio não teria condições de ser reformado. Em maio, parte dos moradores recebeu R$ 900 da prefeitura para deixar o imóvel e todas as famílias foram cadastradas na fila de espera de programas habitacionais. Na época eram 258 famílias, sendo “242 crianças, 38 idosos, 17 pessoas portadoras de deficiência física e 16 pessoas com doenças graves”, segundo a decisão de adiamento.

Algumas delas deixaram o prédio e depois retornaram. Outras nunca saíram. “Eu mesmo disse para todo mundo: recebe o dinheiro e fica aí. Eu recebi e não saí”, diz Ivanildo Rocha, um dos coordenadores da ocupação da Frente Comunitária e Cidadania (FCC). Ele afirma que a informação de que a reintegração ocorreria hoje foi passada ontem à tarde por um policial, o que pegou a todos de surpresa.

A maioria dos agora ex-moradores da ocupação trabalha informalmente na região da rua 25 de Março, próxima ao local, e afirma pagar por mês R$ 160 para bancar custos com água, luz, limpeza e portaria do prédio.

A maioria das pessoas vivia no local há anos e tinha muitos objetos. Apesar de o proprietário ter providenciado a retirada dos bens dos ocupantes, os ex-moradores reclamavam. “Para tirar tem um monte de gente, para colocar no lugar que a gente arranjou não vai ninguém”, queixava-se uma das pessoas, que preferiu não se identificar. Ele queria levar os móveis da mãe para sua casa, no bairro da Casa Verde, zona norte da capital. Quem não sabia para onde encaminhar os móveis tinha a opção de deixá-los em um depósito ou na rua. “A gente vai acampar aqui na frente. Aí eu quero ver.”

Alex Amaral morava sozinho, por isso, afirma, não tinha muitas coisas. Ia levar de trem suas roupas para a cidade de Itapevi, região metropolitana de São Paulo, para a casa do irmão. Mas não ter o que fazer com o seu botijão de gás o deixou nervoso durante a maior parte da tarde. “Uma mulher disse que iria guardar para mim, mas ela sumiu. Não sei o que eu vou fazer. Um botijão já é alguma coisa para recomeçar”, explicou.