Em São Paulo

Mais de 40 famílias de ocupação no Butantã estão sob risco de despejo

Ocupação Nova Conquista deve sofrer despejo em 45 dias. Famílias não possuem assistência. Antes disso, elas foram expulsas em ação ilegal

Benedito Barbosa/Divulgação
Benedito Barbosa/Divulgação
A subprefeitura do Butantã avisou que uma operação de despejo está marcada para amanhã (2)

São Paulo – Dezenas de famílias estão na iminência de despejo no Butantã, zona oeste de São Paulo. São moradores despejados da ocupação Nova Conquista em uma ação ilegal do poder público, em dezembro de 2021. Na ocasião, a Justiça expulsou 240 famílias de uma área na Vila Sônia, zona Sul da capital, em meio à pandemia de covid-19. Destas, 40 não conseguiram lugar para morar, e passaram a ocupar um terreno da Prefeitura de São Paulo naquele bairro.

Agora, a subprefeitura do Butantã avisou que uma operação de despejo estava marcada para hoje (2). Contudo, após rodada de negociações ontem, o Ministério Público, em junto com a Defensoria Pública do Estado (DPE), conseguiram mais 45 dias de permanência da ocupação. Mesmo assim, os moradores argumentam que a decisão contraria entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), de que as famílias devem contar com apoio institucional para a realocação.

Os moradores afirmam que muitas famílias não têm para onde ir e que a Prefeitura não garante uma opção. “Tivemos uma reunião com a subprefeitura. Mas agora, 42 famílias terão que sair daqui. Essa é a resposta: nenhuma. Como vai ser o Natal das crianças daqui? Qual o conforto? Acha que a polícia vai dar algum conforto? A prefeitura? Está na hora de se sensibilizar. Precisamos de programa habitacional, de remédio, de cesta básica. Moradia é dignidade”, disse o morador Evandro Julião da Luz, à RBA.

“É isso que nós temos. Não temos para onde ir. Contamos com o apoio de todos para reverter essa situação. O máximo que temos aqui é isso. Todos temos nossa importância. Panelas vazias, sem emprego, sem gás. Crianças pedindo ajuda”, completa Evandro.

Falta ajuda

A resposta do Poder Público não passa por um programa consistente de moradia. Outra moradora, Deise Deka, conta que a única proposta que receberam foi o insuficiente Auxílio Brasil. “A desculpa é que com o Auxílio temos como pagar aluguel. Mas, uma mãe com quatro filhos e 600 reais não consegue pagar aluguel e comer. Fizemos esse acordo forçado para sairmos em 45 dias. Estamos fazendo de tudo para ficar. Temos muitas crianças”, disse à reportagem.

Tarciana Tarci, também moradora, disse que a Prefeitura colocou uma placa já de reforma no espaço. “Colocaram esse aviso até com valores. E agora temos que sair sem rumo. Um monte não tem um real no bolso”, relata.

“Todos temos nossa importância. Panelas vazias, sem ter o que fazer, sem gás. Crianças pedindo ajuda. Precisamos de ajuda.” Foto: Divulgação

Histórico

Em 2021, ano do primeiro despejo, vigorava decisão do STF que impedia as ações em virtude da pandemia de covid-19. Contudo, a proibição caiu no dia 31 de outubro deste ano. O ministro Luis Roberto Barroso negou pedido do PT e do Psol para prorrogar o prazo. Ele concedeu a extensão por outras três vezes desde 2020. De acordo com Barroso, “a significativa melhora do cenário epidemiológico” sustenta o retorno dos despejos.

Entretanto, Barroso determinou uma “transição, já que é grave o quadro de insegurança habitacional”. O país tem, de acordo com o ministro, 188.621 famílias na iminência do despejo. “A retomada das reintegrações de posse deve se dar de forma responsável, cautelosa e com respeito aos direitos fundamentais em jogo”, disse. Então, Barroso determinou a criação imediata de Comissões de Conflitos Fundiários para garantir moradia aos desabrigados. Mas as famílias da ocupação Nova Conquista não percebem o auxílio previsto por Barroso.

Representantes dos moradores realizaram hoje uma reunião com representantes da Prefeitura e da Defensoria Pública do Estado. De acordo com Tarciana, que esteve na reunião, ela foi de pouca serventia. “Eles não querem nos ajudar em nada”, disse à RBA. A informação é de que a subprefeita do Butantã, Joseane Possidonio, disse que nada pode ser feito e que o despejo prosseguirá no dia de amanhã.

Despejo zero

A situação de vulnerabilidade de milhares de famílias no Brasil é um problema que o futuro governo Lula deve enfrentar. Ontem (30), 175 entidades e movimentos sociais enviaram uma carta ao governo de transição sobre o tema. A Campanha Despejo Zero pede medidas urgentes e duradouras para garantir o direito fundamental à moradia. Primeiramente, o documento propõe a criação de um fundo emergencial para auxiliar famílias vulneráveis. Em especial, o documento alerta para a necessidade de auxílio às famílias vítimas de enchentes, deslizamentos e outros eventos climáticos.

“Espera-se que o Governo Federal cumpra seu papel de articulador de uma política nacional de prevenção e mediação de conflitos fundiários articulando as diversas instâncias de governo, o que deve ser feito com a participação da
sociedade civil e a partir do acúmulo das experiências da sociedade e das diversas instâncias de governo envolvidas no processo”, afirmam as entidades.

Além da criação do fundo, os movimentos exigem outras medidas. Em primeiro lugar, “suspensão imediata de despejo por inadimplência para famílias de baixa renda moradoras de imóveis com financiamento operado pela Caixa. Suspensão imediata das reintegrações de posse e despejos de áreas públicas federais ocupadas. Criar no âmbito da política habitacional e urbana, políticas de urbanização, melhoria habitacional. Criação de uma equipe especializada dentro do Ministério das Cidades, para atuar no apoio à prevenção de conflitos fundiários urbanos”, entre outros.

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