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Em SP, secretário de Segurança Pública recebe abaixo-assinado contra balas de borracha

Documento com mais de 45 mil assinaturas foi entregue por fotógrafo que perdeu a visão em junho, durante cobertura de protesto. Grella se diz contrário ao uso dos projéteis, mas não pretende bani-los

Sérgio Silva/Facebook

‘Grella não apoia o uso das armas, mas disse que a polícia precisa agir com força em determinadas situações’

São Paulo – O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella Vieira, recebeu na tarde de hoje (22) um abaixo-assinado pedindo a proibição do uso de armas menos letais durante manifestações, tais como balas de borracha, bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo. O documento, com mais de 45 mil adesões, foi entregue pessoalmente pelo fotógrafo Sérgio Silva, 33 anos, que perdeu o olho esquerdo após ser atingido por um dos 506 projéteis disparados pela Polícia Militar no último 13 de junho.

“A audiência foi positiva”, avalia Sérgio, que no dia 2 de janeiro, quase sete meses depois do tiro, finalmente recebeu uma prótese ocular que imita um olho verdadeiro. “Pelo menos agora ele me atendeu e mostrou um mínimo de atenção para a causa.” O fotógrafo vinha tentando agendar uma audiência com o secretário de Segurança Pública há pelo menos cinco meses. A intenção era fazer-lhe chegar o abaixo-assinado e mostrar-lhe cara a cara os efeitos nefastos das balas de borracha sobre a integridade física dos cidadãos.

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Sérgio não foi a única vítima das armas menos letais feridas com gravidade em São Paulo no ano passado. Também atingida no olho por uma bala de borracha, a repórter da TV Folha, Giuliana Vallone, teve sua visão salva pela lente acrílica dos óculos. Mesma sorte não teve o cinegrafista Vitor Araújo, de 17 anos, que perdeu as funções do olho direito após ser atingido por um estilhaço de bomba de efeito moral no centro da cidade, durante os protestos de 7 de setembro.

De acordo com o fotógrafo, Fernando Grella afirmou que é pessoalmente contrário ao emprego de balas de borracha contra manifestantes. “Ele disse que não apoia o emprego dessas armas em manifestações. Ouvi isso da boca dele”, comemora. “Mas, quanto à utilização, disse que não depende dele. Ele tem a visão de que a polícia precisa agir com certa força em determinadas situações, quando há princípio de violência e confusão.”

Minutos mais tarde, em entrevista à RBA, o secretário ratificaria essa opinião. “Temos uma recomendação que, em relação aos manifestantes, não é para haver emprego disso. Mas é evidente que é uma arma prevista pelas técnicas policiais. Ela não pode ser banida.” Questionado sobre a possibilidade de que outro 13 de junho aconteça em 2014, Grella respondeu que a polícia não pode ser a única culpada pelo episódio.

“Vimos grupos de pessoas violentas investindo contra a PM, queimando coisas”, rebate. “Houve notícias de abusos por parte de policiais. Estas notícias foram objeto de inquéritos que estão em andamento, e nós pedimos inclusive que esses inquéritos fossem acompanhados por promotores. Não temos nenhuma dificuldade em apurar a ocorrência de abusos. Mas queria enfatizar que o 13 de junho não pode ser atribuído à polícia com exclusividade.”

Sobre as investigações, Sérgio pediu celeridade ao secretário. “Cobrei dele resultados”, relata. “Depois de junho, a violência continuou e, até agora, sete meses depois, a sociedade ainda não viu nenhum resultado. O governo parece não ter tirado nenhuma lição do que aconteceu comigo e com outras pessoas nas manifestações.” Para o fotógrafo, seria ideal que as apurações tivessem mais agilidade. “Ele concorda, mas explicou que existe toda uma burocracia.”

Sérgio explicou ainda que as armas menos letais, em vez de dissuadirem os manifestantes, acabam provocando o efeito contrário. “Estou contando como experiência de quem foi vítima da arma. Quando o cidadão é atingido, ele fica mais revoltado. E a reação dele é cometer atos de violência. As pessoas em volta também, porque estão vendo um companheiro ferido”, explica. “Grella meio que concordou com esse pensamento. Disse que é solidário com minha situação, que minha campanha é positiva.”

Finalmente, o secretário se comprometeu com Sérgio Silva a levar seu abaixo-assinado para que seja tema de discussão de um grupo instalado pela pasta de Segurança Pública com objetivo de estudar a utilização de armas menos letais durante manifestações. “Não é o que a gente quer, o que eu pretendo, mas já foi um primeiro passo”, avaliou o fotógrafo. “Meu objetivo é a extinção dessas armas.”