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Acordo entre PM e moradores adia reintegração de posse no centro de São Paulo

Moradores dizem que, antes de negociação, chegaram a ser agredidos por policiais e por locatário do imóvel. Juíza tomou decisão sem visitar o local, supondo que não havia nem crianças, nem idosos

J. Duran Machfee/Futura Press/Folhapress

Prédio estava em reforma. Moradores vieram da zona leste e não são ligados a movimentos sem-teto

São Paulo – Um acordo entre os proprietários de um prédio de dez andares na avenida Rio Branco, 611, e representantes das famílias que ocupam o edifício há três semanas evitou hoje (19) que a Polícia Militar realizasse uma reintegração de posse autorizada pela juíza Maria Carolina de Mattos Bertoldo, da 21ª Vara Cível da capital. As famílias devem sair amanhã ao meio-dia e acampar na calçada.

O acordo se deu após tensão em meio à chegada de policiais militares. Um grupo pequeno, com cerca de dez agentes, chegou por volta das 11 horas e impediu que moradores entrassem na edificação. Bombas de gás lacrimogêneo foram usadas contra os que tentaram subir nos apartamentos. Um garoto de 12 anos apresentava marcas de ferimentos pelo corpo – ele e outras testemunhas afirmam que o locatário do imóvel, o libânes Khalid Ouldizza, o agrediu.

“Eu cheguei da escola e não me deixaram entrar. Eu disse que ia porque moro aí, aí ele me segurou e jogou para a rua.” Os pais do menino permaneceram dentro do prédio, já que, se saíssem, não poderiam retornar. Segundo Patrícia Nascimento, uma das coordenadoras da ocupação, Khalid levou homens que dizia ser de uma facção criminosa para ameaçar os ocupantes do prédio. “Esse homem está atormentando a gente desde o primeiro dia.”

Khalid nega. Ele afirma que o prédio estava sendo reformado há quase um ano e que havia pedreiros trabalhando na obra quando a propriedade foi ocupada. “Eu jamais faria isso. Se tivesse que agredir alguém, não seria depois de ter entrado na justiça”, afirmou.

O processo, no entanto, foi movido pelo proprietário do imóvel, que acompanhou a ação dos PMs e fechou o acordo com os moradores. A sentença da juíza foi dada ontem. Ela levou em consideração a afirmação da oficial de justiça de que o prédio estava “praticamente desocupado” e de que não havia menores, idosos ou pessoas com necessidades especiais, “não havendo assim nenhuma situação de risco”. Funcionários de lojas próximas à ocupação confirmaram não notar muito movimento no prédio. Hoje, no entanto, havia várias crianças e alguns bebês no local.

Para a advogada dos moradores, Juliana Avanci, havia erros no procedimento da reintegração, que teve uma agilidade “incomum”. A sentença nem sequer teria sido publicada no Diário Oficial, o que impede que ela entre com recurso.

Além disso, os moradores não teriam sido informados. Segundo a oficial de justiça que cumpria a determinação, os moradores foram procurados no sábado, mas não foram localizados.

Patrícia afirma que cerca de 80 famílias provenientes da zona leste ocupam o prédio. Ela garante que são ex-beneficiários do Bolsa Família que não estariam conseguindo pagar seus aluguéis e que não são ligados a nenhum movimento sem-teto. “São famílias que ganham R$ 600, 800, que é o preço de um aluguel hoje em dia.” O grupo não tem nenhuma informação sobre atraso em impostos, mas acreditava que o imóvel havia sido decretado de interesse social (DIS) pela prefeitura, o que é o primeiro passo para a inclusão em programas habitacionais. O prédio, porém, não consta da relação.