Luta antirracista

Lei João Alberto: deputado propõe cassar alvará de empresas reincidentes em casos de racismo

“Elas têm que ter a responsabilidade sobre aquilo que acontece em seu ambiente”, aponta Orlando Silva. Autor do projeto, parlamentar fará requerimento de urgência para levá-lo à votação na Câmara

Ezequiela Scapini/BdF
Ezequiela Scapini/BdF
"Tem que bater onde mais dói, que é no bolso das empresas porque elas têm que ter a responsabilidade daquilo que acontece em seu ambiente", afirma Orlando Silva

São Paulo – O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) quer avançar nos próximos dias com o Projeto de Lei (PL) 5.160/2020 que permite a cassação do alvará de empresas reincidentes em casos de racismo. A iniciativa já havia sido apresentada à Câmara no início de novembro, mas ganhou força e apoio nesta semana diante do assassinato de João Alberto Silveira Freitas, mais um homem negro, de 40 anos, espancado até a morte por seguranças do hipermercado Carrefour, em Porto Alegre. O crime, de acordo com o parlamentar, reforçou a urgência de combater o racismo e responsabilizar as empresas por atos discriminatórios de seus funcionários. 

Em conversa com o presidente da Casa, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), nesta segunda-feira (23), Orlando pediu que o projeto seja levado ao plenário para apreciação. Um requerimento de urgência também deve ser apresentado nos próximos dias. “Se der certo de votar essa lei, que eu chamo de João Alberto, provavelmente ela não vai acabar com o racismo no Brasil, mas dará instrumentos para combatê-lo. É nisso que acredito”, explicou o deputado em entrevista à Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, nesta quarta (24). 

A medida introduz uma mudança no Código de Defesa do Consumidor para que o ordenamento tenha também base jurídica para sancionar as empresas e até cancelar a licença de funcionamento do estabelecimento. Segundo Orlando, o projeto amplia o combate ao racismo para além do direito penal e da Constituição. “Temos que atravessar todas as políticas públicas e, no caso concreto, tem que bater onde mais dói, que é no bolso das empresas porque elas têm que ter a responsabilidade daquilo que acontece em seu ambiente”, afirma. 

Morte no Carrefour

“Não adianta dizer que a culpa é do segurança. Ou que os dois seguranças do Carrefour foram demitidos. E daí?. ‘A empresa (de segurança) é terceirizada, pode ter o contrato rompido’. E daí? Isso não repara nunca”, contesta o parlamentar, em referência à morte de João Alberto às vésperas do Dia da Consciência Negra. 

“Nenhum argumento fundamenta um ato daquele. Até se tenta agora uma narrativa de que ele teria agredido alguém, e que já teria agredido outra vez. Mas não existe isso de uma pessoa que estava neutralizada, imobilizada, ser espancada até a morte enquanto pedia socorro”, acrescenta. 

Após perder mais de R$ 2 bilhões em valor de mercado na Bolsa, o Carrefour anunciou, nesta terça, a criação de um fundo de R$ 25 milhões para promover a inclusão racial e o combate ao racismo. A rede internacional de hipermercados também prometeu que destinará todo o lucro do dia 20 de novembro para projetos antirracistas. Mas, na avaliação do deputado federal, ainda que “boas”, as iniciativas são insuficientes. 

Não há democracia com racismo

“O problema é que isso acontece no cotidiano”, aponta. O Carrefour, por exemplo, já protagonizou ao menos sete atos de descaso e violência envolvendo seus funcionários. “Nós não podemos continuar achando normal um jovem negro entrar no shopping center e passar a ser perseguido pelo segurança, isso não é normal. Fatos extremos, como foi esse (assassinato de João Alberto), chocam todo mundo. Só que antes desses fatos extremos há uma escalada de fatos que são violências, atos de racismo”, reflete Orlando Silva.

“Temos que romper com a tolerância relativa A esse tipo de atitude, que é barbárie. Nós temos que combater em toda a linha, envolver todo mundo. Como diz Angela Davis ‘não basta você não ser racista, você tem que ser antirracista’. E essa luta não é só dos negros, é necessário envolver todas as pessoas que compreendem que não pode haver democracia com racismo”, conclui o deputado federal.

Confira a entrevista da Rádio Brasil Atual  

Redação: Clara Assunção. Edição: Glauco Faria