Mudanças pra pior

Mudanças na EBC são uma ‘inversão de sentido’, define ex-presidente da Radiobrás

Eugênio Bucci critica decisão do governo Temer e aponta que alterações não irão aperfeiçoar o modelo de comunicação pública da empresa, pelo contrário, são 'um recuo'

Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Para Eugênio Bucci, a alteração da estrutura da EBC é um ‘detalhe’, mas um detalhe significativo

São Paulo – As mudanças anunciadas hoje (2) na estrutura da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) revelam a “incompreensão do governo federal sobre a matéria”, segundo o jornalista, professor e ex-presidente da Radiobrás Eugênio Bucci. Indicam um retrocesso na política de comunicação pública: “Até aqui nós vínhamos caminhando numa direção muito insuficiente, mas uma direção promissora e agora tivemos uma inversão de sentido”.

Conhecido por seus estudos e análises críticas sobre o desenvolvimento da comunicação pública no Brasil, Bucci disse que a EBC foi criada sob a natureza jurídica de uma empresa estatal e que isso limita a atuação de uma instituição que pretende trabalhar a comunicação pública. “Ela nunca teve uma forma adequada para emissoras que se pretendiam plurais e críticas no debate público nacional. Era um formato ruim, mas um pouco melhor do que existia antes na Radiobrás. A solução que esta situação pedia não era um recuo ao que existia antes, mas era um avanço. Deveria se transformar a EBC numa instituição menos estatal e mais pública, ou seja, menos sujeita à ingerência do governo federal e mais aberta a controles públicos da sociedade”, explicou.

Para ele, as mudanças em nada ajudarão no aperfeiçoamento deste cenário, pelo contrário. “Essa medida não enfrenta o problema central, que é abrir mais a instituição para o debate público, com mais participação da sociedade e menos do governo, e recua no tempo. É um padrão que existia antes, vindo de marcos da ditadura militar, vindo de algumas adaptações, mas uma estrutura muito precária e voltada para o governismo. É isto que nós vamos ter”, disse.

Sobre as críticas que são dirigidas à EBC, entre elas a de que a empresa é um “cabide de emprego”, o professor da Universidade de São Paulo (USP) destaca que nada vai mudar neste aspecto com as medidas anunciadas. “É uma empresa que poderia ter sido administrada com mais competência, mais agilidade, provavelmente há centros de custos que poderiam ser melhores dimensionados. Há problemas de administração, como existem em outros lugares, mas também para isso ser resolvido, o caminho não é subordinar ainda mais a Presidência da República. Antes era Secom, agora é a Casa Civil, o que é praticamente a mesma coisa. A presidência não tem competência para fazer comunicação, para editar o debate público, para dirigir equipes que informem a sociedade. Então, nesse sentido, o problema do cabide de emprego não será resolvido. É remar na direção oposta. É uma pena, lamentei muito”, disse Bucci.

Com relação à extinção do Conselho Curador, o ex-presidente da Radiobrás definiu como “triste”. Ainda assim, destacou que o poder real na EBC está restrito ao Conselho de Administração, composto por representantes dos ministérios e que, portanto, “expressa a vontade do governo federal de turno”. Para ele, o Conselho Curador significava a presença da sociedade dentro da empresa, mas com poder muito reduzido. “Ele podia fazer barulho, lançar protesto e isto era positivo, mas efetivamente não tinha poder. Se me perguntar se prefiro com ou sem Conselho Curador, eu prefiro com, mas não era esta a forma ideal. A EBC era uma estatal com conselho curador. Ela precisava ser uma instituição pública com um conselho de representantes da sociedade que efetivamente fosse independente e elegesse o principal executivo da instituição, que não era o que acontecia.”

Eugênio Bucci acredita que há na sociedade brasileira certa incompreensão com o papel e a importância da comunicação pública. “Em outras sociedades, em que instituições de comunicação pública não-governamental e não-comercial são mais fortes, a compreensão geral, talvez, seja um pouco mais densa do que no Brasil. Agora é fundamental entender que existe esta incompreensão no governo Temer, mas já existia nos governos Dilma e Lula também. Não é que nós tínhamos uma coisa ideal antes… o que mudou-se agora é um detalhe, mas é um detalhe que aponta na direção oposta.”

Criada em 2007, a EBC nasceu da união da Radiobrás com a Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), que coordenava a TVE Brasil. Desde então, a empresa é responsável pela TV Brasil, TV Brasil Internacional, Rádios EBC (Rádios Nacional do Rio de Janeiro, AM e FM de Brasília, da Amazônia e do Alto Solimões, Rádios MEC AM e FM do Rio de Janeiro e Rádio MEC AM de Brasília), Agência Brasil, Radioagência Nacional e Portal EBC.