Sistema carcerário

Para advogado, programa de cidadania nos presídios ‘é louvável, mas pouco viável’

Presidente do STF e do CNJ, Ricardo Lewandowski, propõe projeto para melhorar situação dos presidiários, mas ideia esbarra em problemas estruturais e políticos, diz especialista em direitos humanos da OAB

Antonio Cruz/ABr

Realidade está muito longe de políticas carcerárias educativas que incentivem educação e trabalho

São Paulo – Segundo o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB-SP), Martim de Almeida Sampaio, o programa Cidadania nos Presídios, anunciado ontem (5) pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Ricardo Lewandowski, é teoricamente interessante, mas na prática, pouco viável.

O programa objetiva melhorar a situação carcerária no Brasil e é baseado em três “eixos”: agilização dos processos de progressão de regime, acompanhamento das condições físicas dos presídios, hoje precárias, e o monitoramento do preso para que, uma vez em liberdade, consiga acessar programas de assistência social e se reinserir no mercado de trabalho.

Para Almeida Sampaio, a iniciativa é louvável e demonstra que os tribunais estão sensíveis à questão da cidadania nos presídios. “Todavia, na execução desse tipo de iniciativa é que se encontram os gargalos.” A reinserção do preso na sociedade é o primeiro gargalo, já que, na opinião do advogado, isso só é possível por meio da renda, e portanto, do emprego. “Mas não existe dentro do presídio uma política carcerária e efetiva para que o preso aprenda um ofício, não existe uma estrutura para recuperar ou reeducar esses presos, e aí começam os problemas”, diz.

Em consequência disso, o ex-preso é uma pessoa despreparada. “Na maioria das vezes sem ofício nenhum, sem possibilidade de emprego e integração.”

Segundo o Ministério da Justiça, o Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo, com 600 mil presos. Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,7 milhão) e Rússia (676 mil) encabeçam a lista. Dos encarcerados no Brasil, 42% são presos provisórios, cuja culpa ainda não foi formada em definitivo.

E essa situação explosiva, lembra o advogado, pode se tornar ainda mais difícil se a PEC 171 (que reduz a maioridade de 18 para 16 anos) virar lei.

Em termos de políticas dos governos estaduais, qualquer novo espaço dentro dos presídios brasileiros, em vez de ser utilizado para atividades educativas, é reservado para abrir mais vagas para novos presos. “Assim, não há espaço para salas de aula, por exemplo. Vemos uma massa crescente de pessoas sendo presas, cada vez mais. Temos 600 mil presos e ainda cresce a exigência da sociedade e de parlamentares no sentido de criminalizar mais condutas.”

Vaidades e política

Almeida Sampaio observa também um aspecto que envolve a prevalência da vaidade sobre a continuidade de políticas públicas positivas e afirmativas, como a anunciada por Ricardo Lewandowski. “Com mudanças de presidência do CNJ e do Supremo, vem outro presidente com outros projetos, e os projetos anteriores são abandonados. As políticas públicas no Brasil muitas vezes são boas, mas são substituídas porque outro administrador quer implementar uma nova política para ter sua marca”, afirma. Isso, na opinião do advogado, não diz respeito apenas ao CNJ ou ao Judiciário,  mas “a todo o sistema brasileiro”, incluindo governos estaduais, municipais e federais.

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