Denúncia

Manifestante preso em São Paulo diz que sofreu ‘choques elétricos’ em delegacia

Irmão de Rafael Lusvargh oficiou Ouvidoria de que ativista detido em protesto contra a Copa teria levado 'diversos socos' e tido mão pisoteada por policiais civis. Ouvidor se diz muito preocupado

Fabio Braga/Folhapress

Lusvargh é detido por policiais civis durante manifestação contra a Copa na Avenida Paulista

São Paulo – A Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo encaminhou ontem (31) ao Ministério Público denúncia de que agentes do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) torturaram o manifestante Rafael Marques Lusvargh, 29 anos, detido por policiais civis na avenida Paulista em 23 de junho, durante protesto contra a Copa do Mundo. O jovem está preso desde então.

A denúncia chegou à Ouvidoria em 2 de julho por meio do irmão de Lusvargh e uma amiga da família. Eles ouviram o relato do manifestante numa das visitas que fizeram ao 8º Distrito Policial, no Brás, região central de São Paulo, onde o manifestante cumpre prisão preventiva. De acordo com a denúncia, Lusvargh teria sido “mantido algemado” e recebido “diversos socos e choques elétricos”.

O documento afirma ainda que um dos agentes “pisoteou” o braço do manifestante, ocasionando “falta de sensibilidade na mão”. O agressor é descrito na denúncia como “sem cabelos e acima do peso”, e possuiria uma tatuagem com a inscrição Mein Kampf – “minha luta”, em alemão, título da autobiografia de Adolf Hitler.

À RBA, o irmão de Lusvargh confirmou ter levado a denúncia do manifestante à Ouvidoria. Em 3 de julho, os relatos foram encaminhados à Corregedoria da Polícia Civil e agora se encontram de investigação na Divisão de Apurações Preliminares do órgão. Caso se encontrem indícios das alegações, a peça se transformará em inquérito.

“A denúncia nos preocupa muito”, revela Júlio César Fernandes Neves, ouvidor das polícias de São Paulo. “A notícia nos deixa surpresos e com temor de que seja realidade.” Neves garantiu que vai pessoalmente ao procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Elias Rosa, pedir “efetiva investigação” do caso. “Vamos correr atrás de todas as denúncias de tortura”, pontua. “Isso não pode ser aceito nem em guerras, quanto mais contra manifestantes.”

Oficialmente, a denúncia registrada pelos familiares de Lusvargh é a segunda suspeita de tortura recebida pela Ouvidoria das Polícias de São Paulo desde janeiro. Ambas teriam sido praticadas por policiais civis. No entanto, pelo menos outros dois manifestantes dizem ter sofrido torturas e maus tratos pelas forças de segurança pública após participarem de protestos na capital.

Um deles é o técnico de laboratório Fábio Hideki Harano, 27 anos, detido no mesmo dia que Lusvargh, e também mantido preso desde então – só que no presídio de segurança máxima de Tremembé, a 150 quilômetros da capital.

De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, Hideki afirmou ao Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana (Condepe) que teria sido agredido e humilhado por policiais civis, horas após ser detido pelo Deic na estação Consolação do Metrô. A publicação atesta ainda que o manifestante também alega ter sido chamado de “terrorista” e “comunista”.

O estudante de Direito Murilo Magalhães, 26 anos, denunciou que foi agredido e torturado em 10 de junho por policiais militares numa sala dentro do prédio da Secretaria estadual da Segurança Pública de São Paulo, no centro da capital. “Mandaram eu ficar com a cabeça abaixada, com o rosto virado para a parede. Tive que tirar a roupa, agachar várias vezes. Levei um soco no rosto e vários tapas na cabeça”, disse ao jornal O Globo.

A denúncia do irmão de Lusvargh foi juntada ao habeas corpus movido pela Defensoria Pública ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que o manifestante aguarde julgamento em liberdade. A ação dos defensores já foi derrubada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Como último recurso, chegou à máxima corte do país em 21 de julho, e ainda aguarda parecer do ministro relator, Ricardo Lewandowski.

Em 11 de julho, promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo apresentaram denúncia contra Lusvargh e Hideki pelos crimes de associação criminosa, resistência, desobediência, incitação ao crime e porte de explosivos – mesmo sem haver laudo pericial dos artefatos supostamente apreendidos com os jovens. A Justiça aceitou a denúncia em 21 de julho.

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