Gaúcho vai mostrar à Comissão da Verdade que Operação Condor foi criada pelo Brasil

Aos 74 anos, Jair Krischke falará à CNV na próxima segunda-feira em posse de documentos que atestariam a existência da cooperação repressiva internacional no Cone Sul e suas atividades no país, inclusive depois da Anistia

Krischke garante que seu depoimento na próxima será de extrema importância para a Comissão da Verdade (Foto: Antonio Augusto. Arquivo Agência Câmara)

São Paulo – “Vou mostrar com documentos que quem criou a Operação Condor foi o Brasil”, disse à RBA o ativista gaúcho Jair Krischke, fundador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH) de Porto Alegre (RS), que na próxima segunda-feira (26) irá fazer uma série de revelações à Comissão Nacional da Verdade (CNV). Krischke promete “provar” a ocorrência de uma série de ações realizadas em conjunto pelos aparelhos repressores das ditaduras sul-americanas para sequestrar e eliminar membros da resistência.

“Vou documentalmente exibir a primeira Operação Condor, levada a cabo em dezembro de 1970, em Buenos Aires, e a segunda, ocorrida em junho de 1971”, revelou, sem dar mais detalhes “em respeito à CNV”. O ativista exibirá pedidos feitos ao Brasil pelas ditaduras vizinhas com o objetivo de capturar militantes da oposição caçados pela repressão da Argentina, Uruguai e Paraguai, muitos deles até hoje desaparecidos. “Um desses documentos informa com singeleza: ‘preso pelo Exército brasileiro e entregue a polícia do Uruguai contra recibo'”, antecipa. A audiência está marcada para as 14h e será aberta ao público.

A Operação Condor foi “oficialmente” inaugurada em 1975 durante uma reunião das polícias políticas brasileira, paraguaia, chilena, argentina, uruguaia e boliviana, em Santiago do Chile. “Os representantes do Brasil não assinaram a ata de fundação”, lembra o ativista gaúcho. Por isso, costuma-se debitar sua criação à Dina, órgão repressor do chileno Augusto Pinochet. Para Krischke, porém, o grande articulador da cooperação repressiva regional foi Serviço Nacional de Informações (SNI) do Brasil.

“O embaixador brasileiro no Chile à época, Antonio Câmara Canto, era considerado o quinto homem da Junta militar que conduzia a ditadura no país vizinho”, pontua. “No Estádio Nacional, um dos centros da tortura chilena, havia interrogadores que falavam português com sotaque carioca.” Krischke acredita que a aparência de que o Brasil teve papel secundário na Operação Condor se deve à que considera a grande “qualidade” do regime ditatorial imposto por aqui em 1964: a dissimulação. “Costumamos colocar tudo nas costas dos Estados Unidos, onde cabe tudo, mas o Brasil deu todo o suporte para a criação dos órgãos repressores na América do Sul.”

O ativista gaúcho anuncia que mostrará documentos que comprovam ainda atividades da Operação Condor protagonizadas pelos brasileiros inclusive depois da aprovação da Lei de Anistia, em 1979. “Houve ações realizadas no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, em março de 1980, e outra em 1984”, adianta. “As operações continuaram mesmo depois do regime ter anistiado os militantes.”

Respeitado internacionalmente, o MJDH de Krischke salvou da tortura, da morte ou do desaparecimento cerca de 2 mil pessoas perseguidas durante os anos de chumbo das décadas de 1960 a 1980, quando regimes militares sufocaram a democracia nos países do Cone Sul. Krischke vai contestar ainda a versão oficial das autoridades militares brasileiras sobre a queima de arquivos, informando sobre o atual paradeiro de documentos supostamente destruídos sem autorização legal.

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