Militantes cobram condenação de Ustra

Jovens e antigos militantes se reúnem em frente ao fórum onde teve início ação contra o coronel que comandou a tortura, até a morte, do jornalista Luiz Eduardo Merlino durante a ditadura

São Paulo – Não era uma multidão – uma turba, diriam os militares –, mas foi numeroso o protesto promovido em frente ao Fórum João Mendes, no centro de São Paulo, durante audiência para ouvir testemunhas da acusação contra o coronel reformado  Carlos Alberto Brilhante Ustra.

O movimento atraiu antigos e jovens militantes ansiosos por demonstrar que esperam a condenação do militar como responsável pela morte de Merlino em 1971 nas dependências do DOI-Codi, instrumento da repressão comandado por Ustra entre 1970 e 1974. Do lado de dentro, a juíza Claudia de Lima Menge ouvia de seis testemunhas que o coronel, à época major e sob o codinome Tibiriçá, ordenou e presenciou a tortura do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, integrante do Partido Operário Comunista (POC).

Do lado de fora, gritos de guerra condenavam a impunidade dos agentes da repressão e a necessidade de que se derrube a Lei de Anistia, que impede a condenação penal por violações de direitos humanos entre 1964 e 1979. Os militantes transformaram o ato em uma oportunidade para não deixar esquecer o histórico de violência do período autoritário. “Isso que queremos não é vingança. Defendemos um julgamento público e aberto, com todos os ritos de defesa”, afirmou o escritor Alípio Freire. Ele ponderou que revanchismo seria tentar submeter os militares às mesmas práticas de prisão ilegal, tortura, incomunicabilidade e ocultação de cadáver.

Passo à frente

Este é o segundo processo movido pelo família Merlino contra Ustra. O primeiro, em 2008, tentava obter a declaração de que o coronel foi torturador e responsável pela morte do militante. A nova ação é por danos morais e tenta exatamente o mesmo, mas por outro caminho – a família pretende encaminhar a eventual indenização a organismos que militem na defesa dos direitos humanos. A ação não tem como resultar em sentença de prisão contra o militar.

A condenação não seria inédita, mas, para militantes, um passo à frente. A família Telles obteve do Judiciário paulista vitória em ação civil declaratória que visava ao reconhecimento do papel de Ustra no comando da máquina de tortura. “Acho que abriu o caminho. Até então, o Brasil estava imutável, com total impunidade. O país fazia de conta que a ditadura não era com ele”, constata Amelinha Telles, uma das responsáveis pelo processo exitoso. A integrante da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos pensa que conseguir uma reparação financeira do coronel seria um avanço.

Clima tranquilo

Embora o tema seja sério, os militantes reunidos em frente ao Fórum João Mendes não deixaram o clima pesar. Para as vítimas de Ustra ou da ditadura como um todo, foi importante notar que boa parte dos manifestantes eram jovens. “Essa demonstração tanto da Justiça quanto das pessoas que aqui vieram é fundamental para dizer que o golpe, a ditadura, aquele servilismo aos Estados Unidos, censura, nada disso é aceito”, afirmou Ivan Seixas, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e testemunha das torturas promovidas contra Merlino.

José Luiz del Roio, pesquisador e ex-exilado, lamentou apenas que se leve tanto tempo para começar a pensar em uma condenação para torturadores. Ele pondera que, embora seja importante obter a condenação de Ustra, não se deve ver as violações como uma prática isolada. “A tortura foi uma política de Estado. É importante que se entenda isso para não achar que se deve descarregar tudo nas costas de algumas pessoas.”

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